A crise econômica tem posto as contas do governo em discussão desde meados do ano passado, quando a disputa com servidores pela aplicação da RGA (Revisão Geral Anual) nos salários abriu a primeira grande crise do governo Pedro Taques, com greve geral por mais de um mês. De um lado, os servidores reclamam de perda de poder de aquisição por crescimento da inflação e alteração na data de pagamento; do outro, o governo apresenta o volume das despesas da folha de pagamento como a maior pressão no orçamento, equivalendo a 50% do total. O Circuito Mato Grosso tenta mostrar as linhas dessa disputa, com base em relatório do Tribunal de Contas do Estado (TCE) e em apontamentos feitos pela Controladoria Geral (CGE), a Secretaria de Gestão (Seges) e sindicatos.
Média de ganho subiu para ativos e inativos
A média salarial dos servidores públicos do Estado cresceu acima de 100% nos últimos seis anos. Relatório das contas do governo de 2016, feito pelo TCE (Tribunal de Contas do Estado), mostra aumento no ganho em folha tanto para ativos quanto para inativos.
O salário dos servidores em atividade passou de R$ 2.261, em 2010, para R$ 5.239, no ano passado, alta de 131%. Para aqueles fora da função, o ganho passou de R$ 2.646 para R$ 5.920 no mesmo período, com aumento um pouco abaixo ao dos ativos (123%).
Nesses seis anos, o salário médio para servidores ativos temporários teve a maior variação, passando de R$ 670 para R$ 2.555, alta de 281%. Esse tipo de contratação teve leve alta. Em 2010, havia 31.598 servidores temporários prestando serviços pelo Estado, e em 2016, a quantidade estava em 32.659, acréscimo de 3,3%.
Os servidores ativos e efetivos tiveram 100,3% de reajuste. Conforme relatório do TCE, o valor da folha passou de R$ 3.602 para R$ 7.216. O número de servidores com status teve alta gradual, depois de um salto acima de 6 mil efetivações entre 2010, ano em que houve concurso para várias áreas no Executivo, e 2011; passaram de 37.221 para 43.484. Nos cinco anos seguintes (2012-2016) houve crescimento de 2,9% na contratação, elevando a quantidade de 44.286 para 45.602.
Os servidores exclusivamente comissionados tiveram aumento salarial de 51% desde 2010. O ganho médio em folha saiu de R$ 2.427 no começo do período para R$ 3.683 ao fim. O número de servidores com esse status reduziu 24,9%, de 2.146 para 1.611.
O Relatório de Contas mostra que o valor mensal da folha de pagamento de servidores ativos e inativos passou de R$ 224 milhões para R$ 606 milhões entre 2010 e 2016.
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Servidor tem que ser menos números e mais serviços, diz Seges
O secretário-adjunto de gestão de pessoas da Seges, Carlos Campelo, diz que, apesar de Mato Grosso não ter orçamento deteriorado por causa da crise, como Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul, há “desequilíbrio no pêndulo” entre prestação de serviços e número de servidores.
“A entrega de serviços é menos do que a sociedade espera ou mais do que a sociedade espera. O esforço do Estado hoje é de profissionalizar os servidores para aperfeiçoarmos o atendimento”.
Ele diz haver grande carência de formação técnica dos servidores, que leve tanto à contenção de gastos como ao aprimoramento no atendimento. Para identificar as fragilidades, a Seges montou sete grupos de trabalho para vistoriar quesitos como desempenho do servidor, fluxo de ações executadas e auditoria da folha de pagamento, com conjunto com a Controladoria Geral do Estado (CGE).
“Nós buscamos montar estratégias para saber o que cada servidor pode fazer e melhorar seu desempenho. É mudança para enfocar menos os números e mais a prestação de serviços. Não que haja mais servidores que o necessário, mas percebemos que o número de servidores que existem hoje é capaz de melhorar o atendimento”.
Auditoria que atacar ‘anomalias’ da folha, afirma controlador
O secretário-controlador do Estado, Ciro Rodolpho Gonçalves, diz que auditoria lançada no começo do mês pela CGE e Seges busca a extinção de “anomalias” com reflexo na folha de pagamento de servidores.
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Ele cita como exemplo a cessão de servidores do Executivo para outros poderes em Mato Grosso ou outros Estados. O secretário afirma que o Estado não sabe hoje quantos servidores estão lotados em outros órgãos, mas com a folha de pagamento vinculada ao Executivo.
“Se algum servidor do Executivo é cedido para outros poderes, o Executivo continua a pagar o salário desse servidor. Mas o órgão para qual o servidor foi cedido deve restituir essa despesa, porque o serviço não está sendo prestado para o Executivo, e hoje não sabemos quantos servidores estão nessa condição e nem se os outros poderes estão nos restituindo”, explica.
A indenização de férias a servidores com cinco diretos de trabalho é outro fator que, diz o secretário, tem reflexo na folha de pagamento. “Nós pagamos indenização, e a quantidade de pagamento tem sido considerável, mas o servidor não tem o tempo de gozo para a saúde e o psicológico; isso pode afetar os serviços. Imagine um policial trabalhando cinco anos sem férias. Precisamos criar medidas para esses”.
A auditoria na folha de pagamento foi dividida em cinco grupos compostos por 22 subgrupos programados para apresentação de relatórios mensais até fevereiro de 2018. O primeiro deve ser entregue ao governo no fim deste mês, com resultado de avaliação de controles existentes hoje no Estado, com foco na segregação de funções e níveis de aprovação. A estimativa é que haja redução de despesas entre 2% e 3,5%.
Questionado sobre a influência da auditoria no salário de servidores, Ciro Rodolpho diz que o foco não é atacar acordos e direitos, mas corrigir distorções. “Isso pode dar margem para a própria discussão de ganhos dos servidores. Se o governo diz que não consegue pagar a RGA porque os gastos estão pressionando a LRF (Lei de Responsabilidade Fiscal), a redução dos custos a mais pode contribuir para a aplicação de revisões”.
Sisma diz que governo quer “vilanizar” folha de servidores
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O presidente do Sisma (Sindicato dos Servidores Públicos da Saúde de Mato Grosso), Oscarlino Alves, diz que o governo tenta “vilanizar” a folha de pagamento dos servidores na contenção de despesas por estar “no lado fraco da corda” na comparação de destinação de recursos para outros poderes por duodécimo.
“O governo quer fazer a folha de pagamento de vilão da história, enquanto os outros poderes estão com dinheiro sobrando em caixa; ou não pagamento fiscal de alguns setores, com perda de R$ 5 bilhões ao ano, no caso das exportações do agronegócio”.
Segundo o sindicalista, os duodécimos repassados pelo Executivo correspondem hoje a 17,2% do orçamento de Mato Grosso, cuja estimativa para este ano está em R$ 18,4 bilhões. No entanto, a Constituição Federal estabelece uma equivalência de 11% para pagamento de salário dos servidores.
“Tanto é que os poderes têm dinheiro sobrando em caixa que no ano passado a Assembleia Legislativa destinou R$ 100 milhões para os municípios. É muito dinheiro para pouca gente”.
Oscarlino Alves afirma que a mudança de data no depósito de salários para o décimo dia de cada mês, desde meados de 2016, vai gerar perda salarial acima de 240% para os servidores até o fim da gestão do governador Pedro Taques, em 2018.
“Os servidores tinham programação de pagamento de suas contas para o fim do mês, e com a mudança de data de pagamento pelo governo eles têm que bancar juros e outras incidências sobre o atraso no pagamento, por exemplo, financiamento, empréstimo”.
Falta postura de gestor ao governo, diz Fórum Sindical
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O membro do Fórum Sindical James Jaudy afirma que falta gestão, “postura de gestor” ao governo para o gerenciamento do orçamento público. Ele diz que são necessárias medidas para desonerar, por exemplo, a retirada do Imposto de Renda da soma da corrente líquida do Estado.
“Falta postura de gestor, força de vontade do governo para lidar com os outros poderes. O Executivo bancava toda folha de inativos, aposentados da Assembleia Legislativa e só agora começou a repassar isso para a Assembleia. Eram milhões de despesas que deveriam ser bancados pela própria Assembleia”.
Segundo ele, o Executivo deve reorganizar gastos, repassando despesas dos poderes para contas próprias, de modo a aliviar o volume do índice que pressiona a margem de responsabilidade fiscal.
No fim do ano passado, o TCE retirou o Imposto de Renda Retido na Fonte (IRRF) das despesas do Estado, para aliviar a margem de 50,3% para 45,83%, de modo que Mato Grosso se conformasse à determinação da LRF. Mas a manobra foi rejeitada pela Secretaria Nacional do Tesouro.
“Os poderes precisam andar com as próprias pernas e têm condições para isso. Há dez anos governo repassava um valor x para os outros poderes e o valor triplicou desde então, mas o tamanho da Assembleia e do Ministério Público não mudou”.