Números da Superintendência de Planejamento Operacional e Estatística (SPOE) da Polícia Militar apontam que o índice de mulheres presas em todo o Estado de Mato Grosso cresceu no primeiro semestre de 2019. De acordo com o levantamento, 3020 pessoas do sexo feminino foram detidas por crimes como roubo, furto, lesão corporal, homicídio e, principalmente, tráfico de drogas, de janeiro a julho.
A tendência é que este ano feche com a maior alta no número de detenções desde 2017. Para a delegada Elaine Fernandes da Silva, da Delegacia Especializada de Roubos e Furtos de Várzea Grande (Derf-VG), a estatística tem a ver não somente com a entrada da mulher na criminalidade, mas também com os avanços das ações das forças de segurança na repressão aos delitos.
“As operações policiais se tornaram mais efetivas com o aprimoramento dos setores de inteligência, como mecanismo de prevenção, e também com as investigações realizadas. Essas melhorias representaram um grande apoio no combate a diversos crimes, pois facilitam a identificação e prisão dos criminosos de ambos os sexos”, analisou a delegada.
O estudo da SPOE também indica que a maioria das mulheres presas pode ter sido influenciada pelos companheiros, com os quais têm ou tiveram algum relacionamento afetivo e que já cumpriram pena no sistema penitenciário. No entanto, a titular da Derf-VG, enfatiza que o ingresso no mundo da marginalidade é uma escolha totalmente exclusiva de cada uma que se vê inserida nesse cenário.
“Claro que a influência dos maridos pode afetar, mas essa é uma decisão que cabe, unicamente, às mulheres envolvidas. Algumas delas vislumbram uma oportunidade de vida nesse mundo ilegal, principalmente por meio do tráfico de drogas. Muitas chegam a assumir o comando de bocas de fumo ou pontos de venda de entorpecentes, antes chefiados pelos esposos, e acabam conquistando status, poder e protagonismo”.
A professora da Faculdade de História da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT) e especialista em mulheres no sistema prisional, Ana Maria Marques, também ressalta que as condições sociais e financeiras são fundamentais para levar uma dona de casa a atuar nos negócios irregulares.
“Muitas dessas mulheres criam os filhos sozinhas e dependem de outras pessoas para ajudá-la enquanto passam o dia inteiro no trabalho para receber salários exíguos. Nesse contexto, o crime surge como uma saída de emergência. Uma forma de ganhar dinheiro fácil para ajudar na manutenção da casa. E isso se transforma em um círculo vicioso, que quase sempre tem a ver com o empobrecimento econômico da população e o avanço da miséria”.
A pesquisadora destaca que a prisão de uma mulher, além do dano pessoal e emocional, gera uma série de prejuízos irreparáveis no âmbito familiar, como a ausência no processo de formação dos filhos.
“Quando uma mulher é presa, famílias são abandonadas e destruídas. Laços entre mãe e filhos são rompidos e ninguém nunca poderá indenizar isso. Sem falar na dupla pena que pagam na cadeia, onde são esquecidas, traídas e malvistas pelos seus companheiros. É muito difícil de recuperar a autoestima de uma mulher que passa pelo cárcere, devido à humilhação pela qual são submetidas”.
A solução para o problema, segundo a professora e a delegada, passa por uma ampla reforma na legislação do Código Penal e no Código Processual Penal. Ana Maria criticou o Poder Público pela forma como conduz a temática e frisou que o quadro da criminalidade não vai apresentar melhoras se as leis não forem alteradas.
“As ações policiais estão direcionadas ao cumprimento da lei e da ordem, logo, o problema é mais acima. Tem a ver com a governança, com as políticas públicas e interesses econômicos. E não há perspectivas de mudança, porque o governo que está aí quer prender mais, criminalizar mais, matar mais. Então, se não mudarem as leis penais mais gente inocente morrerá ou pagará penas injustas”, disse a pesquisadora.
“Não é prendendo que vamos diminuir o crime. Pelo contrário. Mas as pessoas em geral ainda não entendem isso, infelizmente. É um problema social. Acredito que cerca de 60% das mulheres que estão presas no Brasil inteiro não estão pagando por crime que cometeram, mas por um erro do Estado em culpabilizá-las, sozinhas, por um crime social”, completa.
Elaine Fernandes analisa de forma diferente. Para a delegada, as mudanças na legislação penal devem se tornar mais rígidas para coibir a ação dos infratores. “As penas para quem comete crimes são muito brandas. Os criminosos passam pouco tempo na cadeia e logo são colocados em liberdade. Isso gera na sociedade a sensação de desalento, de impunidade e de que o crime compensa”.