A mudança de discurso da presidente Dilma Rousseff da campanha de 2014 para o primeiro ano de mandato foi apontada na última quinta-feira (28) pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva como um dos principais fatores da atual crise política.
"Nós ganhamos as eleições com um discurso e, depois das eleições, nós tivemos que mudar o nosso discurso e fazer aquilo que a gente dizia que não ia fazer. Esse é um fato, esse é um fato conhecido de 204 milhões de habitantes e é um fato conhecido da nossa querida presidenta Dilma Rousseff", afirmou Lula em discurso a dirigentes do PT durante reunião do diretório nacional do partido, em Brasília.
Enquanto disputava a reeleição, Dilma negou que seria preciso um ajuste fiscal para equilibrar as contas, rejeitou mudanças nas leis trabalhistas, previu que o país iria “bombar” em 2015, garantiu que manteria os níveis de emprego e atribuiu a expectativa de um cenário difícil ao “pessimismo” de alguns setores.
Mas diante da possibilidade de rombo no Orçamento – de cerca de R$ 110 bilhões neste ano e de mais de R$ 30,5 bilhões no ano que vem –, o governo anunciou um pacote de medidas de ajuste que inclui alta e criação de impostos, corte de gastos e suspensão de concursos públicos.
O governo argumenta que, em 2014, não era possível prever a deterioração da economia no nível que ocorreu neste ano, atribui as dificuldades à crise internacional, à seca prolongada no país, e à redução do preço das commodities.
O G1 enviou e-mail nesta sexta-feira (30) para a Secretaria de Comunicação da Presidência perguntando se o Planalto se manifestaria sobre o assunto, mas não recebeu resposta até a publicação desta reportagem.
Confira abaixo o que Dilma disse no ano passado e o que aconteceu em 2015.
Em 2014
Em entrevista concedida em setembro de 2014, Dilma disse que medidas de austeridade, como corte de gastos e investimentos, não resolvem crise econômica. "Eu sei o tamanho da crise. Vivenciei em todos os fóruns internacionais a absoluta falta de solução com as políticas de austeridade, que levaram a uma geração de jovens sem emprego na União Europeia. Nós reagimos garantindo elevação salarial. Reagimos garantindo investimentos em infraestrutura no país. No passado, quando havia crise, se cortava salário, cortava emprego, diminuía o ritmo de investimento”.
Em 2015
Para conter o rombo de R$ 30,5 bilhões no Orçamento de 2016, o governo anunciou um pacote de ajuste fiscal que inclui a recriação da CPMF, aumento de impostos, suspensão de concursos, corte de ministérios e de investimentos em programas sociais e de infraestrutura, entre os quais o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).
Em 2014
Em setembro do ano passado, Dilma disse que, para equilibrar as contas públicas, não era preciso cortar programas sociais nem fazer “choque fiscal”. “Nós não acreditamos em choque fiscal. Isso é uma forma incorreta de tratar a questão fiscal no Brasil. Vai fazer choque fiscal, vai cortar o quê? Vai cortar programa social? Vai cortar Bolsa Família? Vai cortar subsídio do Minha Casa, Minha Vida como estão dizendo? Vão fazer o quê? Choque fiscal é o quê? É um baita ajuste que se corta para pagar juros para os bancos? Não é necessário”.
Em 2015
Entre as medidas de ajuste fiscal anunciadas pela equipe econômica, em setembro de 2015, está um corte de R$ 4,8 bilhões do Minha Casa, Minha Vida, de outros R$ 3,8 bilhões no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), voltado à infraestrutura, e de mais R$ 3,8 bilhões em gastos na área da saúde. O governo também reduziu quase pela metade as vagas prometidas para o Pronatec, programa que oferece cursos técnicos gratuitos. A promessa era criar 12 milhões de vagas até 2019, mas a oferta foi recalculada para 6,3 milhões.
Em 2014
Dilma afirmou, em setembro de 2014, que não “mexeria” em direitos trabalhistas “nem que a vaca tussa”. "Outro dia, perguntaram para mim: 'A senhora vai mexer no direito dos trabalhadores? Porque tem candidato por aí dizendo que vai mexer'. Ai, eu respondi: Nem que a vaca tussa. Da mesma forma, é para os portuários de Santos”.
Em 2015
Para reduzir gastos públicos, a presidente editou duas medidas provisórias que restringiram o acesso de trabalhadores a direitos trabalhistas e previdenciários, como seguro-desemprego, abono salarial e pensão por morte. Dilma também enviou ao Congresso MP que permite às empresas reduzir a jornada de trabalho dos funcionários, com a respectiva redução dos salários. As propostas foram aprovadas pelo Legislativo.
Em 2014
Durante a campanha, Dilma criticou proposta dos adversários de reduzir o número de ministérios e disse que as secretarias de defesa de direitos de minorias tinham papel essencial. “Eu discuto os ministérios do meu governo atual. Eles existem pelo seguinte motivo: se eu não tivesse a Secretaria da Micro e Pequena Empresa, não teria conseguido reforma com micro e pequena empresa como foi no caso dessa lei de simplificação do Simples Nacional. Qual é o ministério que querem acabar? Me digam qual é que eu discuto concretamente”.
Em 2015
Como parte do ajuste fiscal, a presidente anunciou corte de 8 dos 39 ministérios, por meio de fusão e eliminação de pastas. A Secretária da Micro e Pequena Empresa, por exemplo, foi extinta e suas atribuições foram incorporadas a um ministério intitulado Secretaria de Governo. As secretarias das Mulheres, Igualdade Racial e Direitos Humanos se fundiram em um único ministério.
Em 2014
Em 31 de julho do ano passado, Dilma negou que haveria um “tarifaço”, em referência à expectativa de elevações dos preços da energia e gasolina. “Há hoje, de forma deliberada, há um processo de criação de expectativas negativas extremamente nocivas para o país, como fizeram na Copa […] Agora inventaram que vai ter tarifaço. Falam que vai ter um tarifaço porque as térmicas foram acionadas. Não vai ter, não. É outra coisa que não vai ter”.
Em 2015
Na ata do Comitê de Política Monetária (Copom) divulgada na última quinta (27), o Banco Central estimou que o preço da energia elétrica no país vai subir 51,7% em 2015. Em setembro, a Petrobras anunciou aumento de 6% na gasolina e 4%, no diesel. Em agosto, houve aumento do preço do gás de cozinha.
Em 2014
Em setembro de 2014, Dilma disse que tentaria alcançar o centro da meta de inflação nos próximos anos, que é de 4,5%: "A meta é 4,5%, mas dois para cima e menos dois para baixo. O centro da meta é 4,5%. Eu, a minha preocupação é sempre mirar no centro da meta e caminhar para que cada vez mais prossigamos para colocar a inflação o mais baixo possível".
Em 2015
Neste ano, a prévia da inflação oficial acumula alta de 8,49%. De acordo com a série histórica da pesquisa, é o pior resultado, considerando o período de janeiro a outubro, desde 2003. Para 2015, a expectativa é de que o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) feche o ano em 9,75%. Se confirmada a estimativa, representará o maior índice em 13 anos, ou seja, desde 2002 – quando somou 12,53%.
Em 2014
Em outubro de 2014, Dilma disse que havia um "uso eleitoral" de dados negativos envolvendo o governo federal e atribuiu a queda na geração de emprego registrada em julho do ano passado a um “processo de flutuação”. "Claro que não vamos manter a mesma geração de emprego que nós tínhamos no início [do governo], de quando saímos do desemprego e passamos a crescer. Mas temos dados extremamente favoráveis. Nós somos o país com a menor taxa de desemprego. É óbvio que se tem uso eleitoral dos processos de flutuação. Agora uma coisa é interessante, quando é pra cima, ninguém anuncia muito não".
Em 2015
No mês passado, as demissões superaram as contratações em 95.602 vagas, segundo informações do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged). O resultado de setembro foi o pior para este mês desde o início da série histórica, em 1992. Até então, o pior resultado para meses de setembro havia sido registrado em 1995 – com 67.242 postos de trabalho fechados.
Em 2014
Na ano passado, Dilma afirmou que 2015 não seria ano de ajustes e garantiu que o Brasil iria “bombar”. “Dizer que o Brasil vai explodir em 2015 é ridículo. Me desculpe. O Brasil não vai explodir em 2015. O Brasil vai é bombar em 2015".
Em 2015
Na última terça-feira (27), o governo revisou a meta fiscal de 2015, passando de um superávit – economia para pagar juros da dívida – de R$ 8,7 bilhões para um déficit de R$ 51,8 bilhões nas contas do governo. O Tesouro Nacional já admite que o rombo pode chegar a R$ 110 bilhões, se forem contabilizadas as “pedaladas fiscais” realizadas em 2014, que consistiram no atraso de transferências aos bancos públicos para pagamento de programas sociais. A previsão mais recente do mercado para a variação do Produto Interno Bruto (PIB), a soma das riquezas produzidas pelo país, é de uma retração de 3,02%.
Fonte: G1