Opinião Renato Paiva

Leviandade

Neste momento que antecede as disputas eleitorais de 2026, os “estilistas” trabalham duro para construir fantasias com as quais os candidatos se apresentarão ao público. Também os redatores constroem o discurso. Textos e roupagens precisam disfarçar o personagem real e mostrar o que foi idealizado para convencer o povo de que tal ou qual candidato tem suficientes dotes para ocupar os melhores cargos. 

A roupagem idealiza um concorrente, transformando muitas vezes um sapo em um príncipe, mostrando seu eventual lado bom e escondendo a face feia. E assim, hipocritamente, tenta passar pelo que não é. Já, o discurso busca depreciar os concorrentes divulgando algumas falhas reais dos adversários e inventando outras. É a leviandade, uma poderosa ferramenta usada na disputa e que muitas vezes produz os resultados buscados, não raro decidindo eleições. 

Esta é, na verdade, uma seleção perversa. Se a leviandade e a hipocrisia funcionam, os que as praticam tendem a se eleger mais. Os que resistem, apresentando-se como são e deixando de atacar os adversários, raramente tem essa virtude valorizada e podem ser derrotados. 

Se os defeitos (hipocrisia e leviandade, por exemplo) estão bem distribuídos na sociedade e tem o poder de favorecer seus adeptos levando-os ao poder, parece aceitável deduzir que nos meios políticos ela esteja mais concentrada. Não é que estes vícios sejam mais evidentes entre os políticos por acaso; eles se alastram porque o sistema recompensa quem os utiliza com mais habilidade e menos escrúpulo. 

Ou seja, nós, de alguma forma, nos identificamos com esses defeitos, elegendo com mais intensidade os hipócritas e os boquirrotos. Isso explicaria, entre muitos outros, um Sóstenes Cavalcante e Nikolas Ferreira (direita) e Glauber Braga e Lindbergh Farias (esquerda).

Não podemos afirmar que a política só atrai pessoas moralmente piores; as pessoas boas também se interessam por ela. Pode ser que o povo — que somos todos nós — prefira os mais falastrões, aqueles que estão dispostos a realçar as próprias virtudes e exagerar os defeitos (reais ou inventados) dos concorrentes. 

Mas há outro ponto a observar. Será que a leviandade e a hipocrisia estão mais presentes entre os políticos ou, na média, eles seriam iguais à população que representam? Porque se nós os elegemos, de alguma forma os admiramos. Ainda, convém lembrar que os defeitos deles podem aparecer mais que os nossos, porque estão expostos a holofotes e microfones. 

A exposição constante funciona como lente de aumento. Um comentário infeliz no círculo privado morre ali; no palanque ou nas redes sociais, viraliza, influencia eleitores e pode decidir eleições. 

Isso ajudaria a explicar por que a leviandade e a hipocrisia parecem mais frequentes entre eles, não porque seja mais comum, mas porque é mais visível e, sobretudo, mais vantajosa?

Por fim, terminou o espaço e, indo para um lado e para o outro, nada concluí. O vício e a virtude — os defeitos e as qualidades — a que se referiam os filósofos gregos estariam igualmente distribuídos tanto na população como nos partidos políticos?

Renato de Paiva Pereira.

Renato Paiva

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