O juiz Wladmynir Perri, da 12º Vara Criminal da Comarca de Cuiabá, descartou as qualificações dolosas dos crimes cometidos pela médica Letícia Bortolini, que atropelou e matou o verdureiro Francisco Lúcio Mara, na Avenida Miguel Sutil, em Cuiabá. Com isso, a ré não irá a júri popular. O crime aconteceu em abril de 2018, quando a vítima atravessava a via.
A decisão foi proferida nessa quinta-feira (24). No documento, o juiz diz que não há comprovações de que a médica ingeriu bebida alcoólica nem que dirigia em excesso de velocidade. Por isso, o crime de homicídio doloso deve passar para homicídio culposo, quando não há intenção de matar.
Letícia, antes do acidente, estava com o marido em um festival de churrasco e cerveja. Segundo a decisão, ela não fez o teste do bafômetro e o médico legista da Perícia Oficial e Identificação Técnica (Politec) apontou que os sinais vitais dela eram normais.
"Em juízo, [Letícia] declarou não ter ingerido bebida alcoólica na data dos fatos e que teria se recusado à realização do exame de alcoolemia porque havia ingerido vinho na noite anterior", diz trecho da decisão.
Além disso, o magistrado considerou que duas testemunhas disseram não ter visto Letícia consumindo bebida alcóolica no evento.
"Entendo não haver provas hábeis ao reconhecimento da alteração da capacidade psicomotora da acusada pela ingestão de bebida alcoólica", cita o documento.
Excesso de velocidade
Além disso, o juiz disse que não há comprovação de que a médica trafegava em excesso de velocidade já que o relatório da Polícia Civil concluiu que Letícia não sofreu autuação de trânsito.
"Ademais, há severas dúvidas se a acusada, Letícia Bortolini, teria deixado voluntariamente de parar o veículo e prestar socorro ou apenas não teria percebido ter atropelado a vítima", continua a decisão.
Letícia Bortolini é acusada de atropelar e matar o verdureiro, na Avenida Miguel Sutil, em Cuiabá. De acordo com as polícias Militar e Civil, ela estava com o marido em um carro no dia 14 de abril, por volta das 20h, quando atingiu a vítima, que terminava de atravessar a via.
A Perícia Oficial e Identificação Técnica (Politec) constatou em laudo que a velocidade média de impacto do veículo da médica, um Jeep Compass, era de aproximadamente 103 km/h.
O veículo não parou para prestar socorro e foi encontrado em um condomínio no bairro Jardim Itália, na capital, após uma testemunha seguir o veículo e informar a polícia. Para a polícia, a médica assumiu conscientemente o risco do acidente.
Na conclusão do inquérito policial, o delegado considerou que a vítima apresentava capacidade psicomotora comprometida por elevado estado de embriaguez, confirmado em laudo pericial.
Ela foi presa na casa dela, em um condomínio da capital, e foi solta dois dias depois sob a alegação de que ela tem um filho com 1 ano de idade que precisa dos cuidados dela. Desde então, permanece em liberdade, atuando como médica na capital.
Um vídeo de câmeras de segurança registrou o momento em que o carro da médica atinge o vendedor ambulante. A gravação não tem imagens nítidas, mas é possível ver o carro da médica atingindo o vendedor ambulante.
Francisco é arremessado e o corpo atinge uma árvore, quase no centro do vídeo. Letícia não freou o veículo e não prestou socorro ao pedestre, segundo a polícia. A Polícia Militar, ao detê-la, disse que ela apresentava sinais de embriaguez.
Um vídeo que circulou pelas redes sociais em agosto de ano mostra a médica dizendo que é "tratada diferente", negativamente, por ser "médica e rica".
"Eu tenho muitas pessoas que me amam, que gostam de mim, que sabem o quanto eu sofro com isso tudo […]. Sabem que o meu caso é diferente porque eu sou médica, principalmente porque eu sou médica, porque eu sou rica, porque eu tenho dinheiro", diz.
A médica continua: "Existe uma briga, uma guerra de rico e pobre nesse país, que parece que quando pode pegar um rico e colocar na cadeia, todo mundo fica feliz". Nesse momento, existe um corte e o vídeo termina.