Cidades

Júlio Müller está em estado de penúria, diz superintendente do hospital

O Hospital Júlio Müller ganhou o status de centro de ensino e prática médica no começo da década 1980. Ele tinha sido projetado e construído para atender a pacientes tuberculosos, em uma época que a doença estava em situação alarmante no país. Mas também havia urgência para ampliar o atendimento ao público, no período em que as DST (Doenças Sexualmente Transmissíveis) assustavam a população. Foi nesse cenário que o hospital ganhou relevância na rede pública de saúde e tornou-se referência em Mato Grosso e para países vizinhos.

E infelizmente também carrega consigo hoje a imagem da precariedade do SUS. Recém-empossado, o superintendente o HUJM, Hildevaldo Monteiro Fortes, disse em entrevista ao Circuito Mato Grosso que a estrutura original do hospital está cercada por “puxadinhos”, concluídos e inacabados que foram construídos nos últimos anos para dar conta do crescimento constante da demanda e para se enquadrar no padrão de instituição universitária, por onde, anualmente, passam centenas de estudantes em formação médica. Mas a estrutura está presa no tempo.

CIRCUITO MATO GROSSO – Qual o problema mais grave no atendimento médico?

Hildevaldo Fortes – Em 1982, o Júlio Müller foi cedido pelo governo estadual para ser um hospital universitário, num momento de emergencial profissional. Ele fora construído como sanatório para tuberculosos, não foi um hospital com características próprias de grande porte, de alta complexidade. Então, o hospital tem uma infraestrutura que cresce em anexo. A cada momento que o hospital cresce em ensino e pesquisa, também cresce em anexo, como um puxadinho que se multiplica dentro da estrutura física do hospital. Isso gera uma série de problemas, transtornos de toda natureza: em relação ao próprio paciente, capacidade técnica, de desenvolvimento médico.

CMT – Pode citar um exemplo de complicação?

H.F. – O hospital tem uma peculiaridade: nós temos um hospital de médio porte que produz muito, mas o que nem sempre é muito visto porque os pacientes necessitam permanecer no hospital, é uma casa para eles também. São patologias que não têm resolutividade como na maioria dos outros hospitais. As partes de reumatologia, de infectologia, todas as referências no estado de Mato Grosso estão dentro do Júlio Müller.

CMT – Há muitos “puxadinhos” no hospital hoje?

H.F. – Mesmo com todas as reformas, todas as ampliações, uma melhoria do parque tecnológico do hospital, nós sofremos com problemas de infraestrutura. Nós temos hoje três situações que são bem difíceis: o prédio de cinco andares na entrada do hospital que está não concluído há vários anos, está servindo, inclusive, de agravante à saúde; do ambulatório que foi planejado para funcionar em três andares, que iria resolver todo o problema ambulatorial da região, do município, só temos um esqueleto do primeiro andar; tivemos um compromisso, um termo de cooperação quando o Hospital São Thomé foi adquirido pelo Estado, para resolver a parte de infectologia, também está incompleto. São obras não terminadas que estão funcionando no atendimento à saúde da comunidade.

CMT – O novo prédio do Júlio Müller foi projetado para suprir essa necessidade?

H.F. – Ele foi projetado dentro dos moldes de hospital universitário. Temos três, quatro blocos já concluídos para ensino da área médica e também temos o próprio dentro do padrão exigido de hospital de grande porte, com parque tecnológico e a estrutura exigida. Que pena que também está parado há vários anos; o projeto tem concluídos 7%, 8% da obra.

CMT – O número de profissionais é suficiente?

H.F. – É um número totalmente insuficiente. O hospital assinou um contrato com a Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (Ebserh), que existe para administrar os hospitais públicos que estavam em penúria nos três últimos anos. A empresa veio para fazer reestruturação da área física, contratar técnicos e reequipar os hospitais. Houve uma melhora, sim, no número de profissionais. Mas esse redimensionamento de pessoal foi realizado num momento de precariedade do hospital (2012), foi um número muito aquém do que o hospital tem necessidade caso o hospital voltasse a funcionar como deveria funcionar. Com isso, o hospital começou a desenvolver várias outras atividades, a oferecer vários outros serviços, ampliou seu campo de atuação. Houve uma não correspondência entre o que você presta de assistência, de ensino, e o pessoal que atua nessas áreas. Isso está bastante defasado.

CMT – Mas e o número de profissionais?

H.F. – Temos 831 funcionários, com alguns cedidos pelo Ministério da Saúde, Estado e pelo município, além disso, temos 200 terceirizados que estão nas atividades-meio. Os estudantes não estão nesse grupo de funcionários, mas compõem mão de obra fundamental no hospital, principalmente dos internos e os das residências médicas. Nós temos hoje 15 programas de residência médica, com cerca de 100 residentes. Sem contar os bolsistas, de projetos de extensão, e também os convênios com as universidades e instituições relacionadas à saúde que enviam estudantes para cá, o que é possibilitado pela característica de o Júlio Müller ser um hospital de ensino de saúde.

CMT – Qual é o déficit de profissionais?

H.F. – Nós temos um problema muito grande de déficit na área técnica; técnicos de laboratório, técnicos de radiologia, são áreas com mais deficiência. Nós temos carência também com profissionais de ensino superior. O hospital tem hoje um problema sério com o mercado de fisioterapeutas.  Não posso te passar um quantitativo porque não seria exato, até porque dependeria da ampliação do hospital para sabermos quantos seriam necessários para o atendimento. Temos que fazer um estudo de readequação do hospital.

CMT – Qual o número de atendimentos do Júlio Müller hoje?

H.F. – O hospital tem uma média anual de 15 mil consultas. Se nós conseguirmos resolver o problema dos prédios inacabados no hospital, ampliaríamos esse número para 50, 60 mil consultas. Internações anuais estão em 4.169, com 117 leitos. Com a ampliação, passaríamos de 150 leitos, o que nos transformaria de um hospital de pequeno porte para um hospital de médio porte. Amplia o parque tecnológico, o financiamento, teríamos aditivo de 50% em internações, muda completamente. Temos 11 mil exames anuais de alto custo, exames de laboratório, 60 mil por ano. Também teriam aumento de 50% se tivéssemos a ampliação do hospital.

CMT – O que precisa ser feito de imediato para melhorar o atendimento no Júlio Müller?

H.F. – Precisamos do apoio da nossa bancada política [no Congresso Nacional] para buscar recursos para o Hospital Júlio Muller, que é eminentemente público, só atende pelo SUS. O seu funcionamento depende hoje de duas fontes de recursos. Uma do governo federal, que é o REHUF (Programa Nacional de Reestruturação dos Hospitais Públicos), uma verba vem para hospitais universitários com prazo definido para vencer, se não usou o dinheiro, a fonte tranca. Ele também tem falha orçamentária. No ano passado tínhamos recursos de R$ 11 milhões, mas só recebemos R$ 6 milhões, o que fez com que tivéssemos um endividamento bastante acentuado. E temos hoje a contratualização, que é um convênio com o município para prestação de serviços.  Essa compra de serviços nos garante uma verba que mantém o funcionamento do hospital, mas também [uma quantia paga] muito aquém do que produzimos.

CMT – Por que há esse problema de verba baixa?

H.F. – As pessoas pensam que nós somos um hospital pequeno, que produz pouco. Isso não é verdade. Nós produzimos muito. O problema é que temos pacientes que ficam mais tempo no hospital, diferentemente do que acontece em outros locais. Mas o Júlio Müller é a maior referência hoje em Mato Grosso.

CMT – Qual é o volume da dívida do hospital?

H.F. – R$ 11 milhões.

CMT – Qual é o planejamento para sair da situação de penúria?

H.F. – Nós temos três momentos, vamos assim dizer, ligados ao hospital de ensino da Universidade Federal de Mato Grosso. No curto e médio prazos, precisamos de reestruturação, de reforma do prédio, a conclusão desses dois blocos inacabados, e o valor vai girar em torno de R$ 20 milhões. De imediato, nós teríamos que humanizar a entrada do hospital, por causa desses prédios inconclusos, termina que temos um atendimento embaixo de um esqueleto [predial]. Então, precisamos de uma reforma imediata, que seja só da recepção, pois precisamos melhorar esse atendimento.  Com R$ 400 mil, R$ 500 mil não conseguimos dar uma melhora na entrada do hospital. No longo prazo, a conclusão do novo prédio do hospital na MT-040.

CMT – As necessidades de curto prazo não têm previsão de serem sanadas?

H.F. – Nós estamos em fase de negociação bastante avançada e positiva com o governo do Estado, com a Prefeitura de Cuiabá, tentando buscar uma parceria envolvendo o Ministério Público do Estado, o Tribunal de Contas do Estado (TCE) para suprir essa necessidade do hospital, que tem atendimento eminentemente público.

CMT – Qual é o apelo para a reestruturação do hospital?

H.F. – Nós precisamos de bastante apoio da comunidade, do Estado, de todos os municípios, porque o Júlio Müller é referência para todos os municípios.  Atendemos grande parte da população e, o que é mais importante, formamos grande parte de profissionais, que vão trabalhar em atendimento em todo o Estado. Ele tem que ser visto como um hospital diferente, como um hospital que forma pessoas e ajuda as pessoas com qualidade.

Reinaldo Fernandes

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