Os entendimentos em torno do fim das conduções coercitivas a partir de uma decisão em liminar expedida pelo ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), voltaram aos holofotes na tarde desta quinta (15), com a decisão da juíza Selma Arruda por garantir autonomia à Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Câmara de Cuiabá que investiga o prefeito Emanuel Pinheiro para realizar pedidos desse tipo às forças policiais.
Lotada na 7ª Vara Criminal, a magistrada atende ao pedido feito pelo presidente da CPI, Marcelo Bussiki (PSB), para que fosse autorizada a condução coercitiva do servidor da Assembleia Legislativa Valdecir Cardoso, responsável por instalar a câmera que gravou Emanuel Pinheiro recebendo maços de dinheiro e os derrubando enquanto tentava acondicionar os volumes dentro do terno (gerando inclusive o apelido do procedimento: CPI do Paletó).
Com depoimento marcado para o último dia 7, o então homem forte de Silval Barbosa não compareceu e mandou informar que estava em viagem. O dinheiro seria suposta propina paga ao atual prefeito (na época deputado estadual) qua para que ele apoiasse projetos do ex-governador.
No entendimento do advogado criminalista Eduardo Mahon, era de se esperar, entretanto, que magistrados não mais determinassem ou permitissem conduções coercitivas por dois motivos bastante objetivos. O primeiro é o que eles chamam de simetria no entendimento e atribuições da lei, o segundo é o pouco ou nenhum efeito prático das conduções.
Mahon esclarece que a liminar expedida por Gilmar Mendes é relativa a um caso específico e por isso não tem o valor ou a força de uma súmula vinculante, logo, é uma decisão vinda sim do Supremo, entretanto, unilateral, do relator em liminar e por isso pode ser entendida de maneira diversa por juízes. Pelo menos não até haver um julgamento pela maioria do STF.
“Alguns juízes vão entender que a condução coercitiva ainda está em vigência, mas eu gostaria de pontuar que no fundo a condução coercitiva é contraproducente, porque qualquer pessoa pode ser conduzida e chegar diante de uma autoridade ou a CPI, delegado ou promotor e exercer o seu direito de ficar em silêncio. Portanto, não vejo muita utilidade prática, hoje, na condução coercitiva, não com o nosso sistema processual adequado ao molde constitucional. Não vejo utilidade prática”, disse ao Circuito Mato Grosso.
Para justificar a ausência, a assessoria de Valdecir entregou ao relator da CPI, Adevair Cabral (PSDB), um ofício para informar a impossibilidade de comparecer à oitiva. No entanto, era um documento sem protocolo de recebimento por parte de Adevair ou comprovação da alegada viagem. Assim, o ofício não foi considerado pela CPI, que recorreu à Justiça pela condução coercitiva.
“Todavia, anoto que a CF/88 conferiu às CPIs os mesmos poderes instrutórios das autoridades judiciais, sendo dispensável socorrer-se do Judiciário para tal tarefa, consoante o entendimento consolidado, inclusive no STF, até porque se trata, ao menos em teor, de hipótese expressamente prevista na legislação processual penal”, escreveu a magistrada.
A partir do entendimento da juíza, a própria CPI pode deliberar sobre a data de condução de Valdecir Cardoso.
Para Marcelo Bussiki, a decisão vai dar força e celeridade à CPI. “Havendo necessidade futura, não precisaremos mais encaminhar oficio à Justiça Criminal. Não precisaremos aguardar decisão judicial. Podemos encaminhar os pedidos direto à polícia”, afirma.
Isso não deve acontecer com Valdecir, pois a nova data, sexta-feira (16), foi acordada após a advogada dele entregar à CPI novo requerimento esclarecendo os motivos da ausência dele e requerendo nova data para a oitiva.
A advogada comprovou com documentos (como um atestado de óbito e passagens) que a viagem aconteceu por causa do falecimento de um familiar.
Logo após as imagens serem mostradas na imprensa, durante a delação de Silvio Corrêa, ex-chefe de gabinete de Silval, Valdecir registrou uma declaração em cartório para inocentar Emanuel Pinheiro das acusações. Afirmou que o dinheiro não era relativo à propina, mas a um pagamento por serviços prestados por Marco Polo de Freitas Pinheiro, irmão do prefeito.