Política

Jornal Circuito Mato Grosso antecipou esquema criminoso

O juiz da 1ª Vara Federal em Cuiabá, Ciro José de Andrade Arapiraca, determinou o bloqueio de bens e contas dos ex-secretários de Estado de Saúde, Augustinho Moro e Augusto Carlos Patti do Amaral, em até R$ 28 milhões. Os dois são acusados de permitir a contratação de empresas que forneceram remédios com preços considerados superfaturados.

As empresas VidaFarma Distribuidora de Medicamentos Ltda. e seu sócio, Leonardo Souza Rezende, Hospfar Indústria e Comércio de Produtos Hospitalares Ltda., juntamente com os sócios Brandão de Souza Rezende, Moisés Alves de Oliveira Neto e Marcelo Reis Perillo, também estão envolvidas na decisão que possui caráter liminar.

O parecer, publicado no dia 28 de abril, atendeu a um pedido do Ministério Público Federal (MPF), em ação de improbidade administrativa. O fato que ensejou a investigação esteve nas páginas do jornal Circuito Mato Grosso há dois anos, na edição 487, em maio de 2014.

A denúncia foi publicada na coluna Pérolas com o nome “TCE, REMÉDIOS & MÁFIA”, que questionava o esquema fraudulento de vendas de medicamentos, reproduzida abaixo na íntegra.

A edição 487 do Circuito relacionava o ex-secretário de Estado de Saúde de Mato Grosso (SES-MT), Augustinho Moro, e os contratos que a pasta mantinha com a Hospfar – Indústria e Comércio de Produtos Hospitalares, empresa de propriedade do primo do governador de Goiás, Marconi Perillo, e que possuía ligação em esquemas de superfaturamento encabeçados pelo contraventor Carlinhos Cachoeira.

Na época em que Augustinho Moro era secretário, durante a gestão Blairo Maggi (PR), o hoje conselheiro do Tribunal de Contas do Estado (TCE-MT), Waldir Teis, tinha o cargo de secretário de Estado de Fazenda (SEFAZ-MT), ou seja, Teis era o “dono do caixa”, que autorizava o pagamento das contas superfaturadas. Após sair do poder executivo estadual, Moro se tornou chefe de gabinete do conselheiro do TCE.

 

O caso

Segundo investigação do MPF, os processos licitatórios não levavam em conta a previsão de isenção de ICMS e o preço máximo de venda estabelecido pelo governo, “deixando a cargo da Secretaria de Administração do Estado de Mato Grosso a pesquisa de preços”, conforme aponta o despacho do juiz.

A decisão do juiz revela ainda que “Augustinho Moro não adotou as medidas acima

Descritas,” sem informar a isenção do ICMS no edital, através do Convênio nº 87/2002 (CONFAZ),de modo que a SES/MT deveria adotar medidas capazes de alertar a Secretaria de Administração do Estado de Mato Grosso (SAD/MT) sobre a forma de agir nos casos de compras de medicamentos excepcionais, visando ao pleno atendimento do desconto do ICMS naquela operação.”

Em relação à Hospfar – empresa proibida de contratar junto ao poder público nos Estados de Goiás e da Bahia, envolvida ainda em esquemas de superfaturamento em Mato Grosso do Sul e outros Estados -, aumentava o preço do produto em 17% no momento do faturamento em relação ao valor licitado, para, logo em seguida, promover o desconto do imposto, como explica a transcrição abaixo.

“A sociedade empresária HOSPFAR, no momento do faturamento, aumentava o preço do produto em 17% (dezessete por cento) em relação ao valor licitado, para, logo em seguida, promover o desconto do ICMS, deixando de pagar o tributo e passando a vendê-lo pelo mesmo preço adjudicado na licitação. Por outro lado, a VIDAFARMA, no pregão nº 130/2007, alienou medicamentos com o ICMS embutido no preço ofertado, fazendo com que o valor contido na NF fosse elevado”.

Além disso, segundo as informações do processo N° 0010139-85.2015.4.01.3600 da 1ª Vara Federal, outras dez empresas apresentaram superfaturamento superior ao limite, ocasionando prejuízos de R$ 11.178.921,93 entre os anos de 2008 e 2011, período que vai desde o fim da era Maggi no Palácio Paiaguás até a gestão de Silval Barbosa (PMDB), hoje preso.

Decisão

Após análise dos argumentos do MPF, o juiz afirmou que se “evidencia a grave lesão possivelmente promovida ao Erário, consistente na aplicação indevida de recursos federais destinados à aquisição de medicamentos excepcionais pela Secretaria de Saúde do Estado de Mato Grosso” e que “calha reconhecer a clara responsabilidade legal e técnica da Secretaria de Saúde do Estado de Mato Grosso para a elaboração do devido Termo de Referência de forma obediente à lei”.

O juiz Ciro José de Andrade Arapiraca anota ainda que as empresas “Hospfar e VidaFarma [se] aproveitaram para apresentar propostas acima do teto fixado”, apontando para “a confirmação dos prejuízos ao Erário, ante a não observância das normas legais pertinentes à incidência do ICMS nas aquisições de medicamentos excepcionais vendidos pelas empresas”.

Por fim, o magistrado deferiu a medida de urgência, pleiteada pelo MPF, determinando a indisponibilidade de bens imóveis e móveis de Augustinho Moro no valor de R$ 13.959.708,09 e também da Hospfar e seus sócios, no montante de R$ 11.800.649,87, citando ainda a Vidafarma, que tem bloqueado pela justiça R$ 2.159.058,22 além de Augusto Carlos Patti do Amaral, secretário de Estado de Saúde de Mato Grosso entre 28/04/2010 a 29/12/2010, que deverá ressarcir ao erário R$ 277.631,92.

Edição 487 do Circuito fez reportagem sobre a Hospfar

 

“Farra ultrapassa os R$ 160 milhões”, de maio de 2014, já antevia a relação fraudulenta entre ex-gestores da Saúde de Mato Grosso, empresas denunciadas em várias unidades da federação e mafiosos do calibre de Carlinhos Cachoeira.

Segundo a reportagem de dois anos atrás, “Nos últimos 10 anos e cinco meses, que envolvem os governos de Blairo Maggi (PR) e Silval Barbosa (PMDB), a empresa, que tem como sócio proprietário Marcelo Reis Perillo, primo do governador de Goiás, Marconi Perillo (PSDB) – sócio de Carlinhos Cachoeira -, faturou mais de R$ 160 milhões dos cofres públicos, boa parte com dispensa de licitação”.

A reportagem de Sandra Carvalho afirma ainda que “No segundo mandato de Blairo Maggi, de 2007 a 2010, a Hospfar recebeu pelo menos R$ 120 milhões da Secretaria de Estado de Saúde. Fazendo um levantamento no Sistema Integrado de Planejamento, Contabilidade e Finanças (Fiplan), o Circuito Mato Grosso apurou que foram empenhados para essa fornecedora R$ 36,3 milhões em 2007; R$ 26 milhões em 2008; R$ 28,9 milhões em 2009.”

Rombo em Goiás

A reportagem da edição 487 do Circuito traz ainda informações da repórter investigativa Edna Santos, autora do livro “A Reportagem Proibida”. Segundo a jornalista, a Hospfar é acusada pelo Ministério Público Estadual e Federal de causar um rombo de mais de R$ 10 milhões aos cofres do Estado e da União. O esquema consistia em vender remédios a preços superfaturados para a Secretaria Estadual de Saúde (SES), entre os anos de 2002 e 2006.

Segundo o MP-GO e o MPF, a Hospfar comercializava medicamentos ao Estado sem passar por licitação e acrescentava no preço final dos remédios o valor do ICMS – Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços, num esquema parecido com o que ocorria em Mato Grosso. Os estados são isentos de pagar o tributo na compra de medicamentos e produtos hospitalares.

A reportagem da edição 487 informava ainda que, além de Goiás e Mato Grosso, a Hospfar responde a processos em Brasília, Mato Grosso do Sul, Alagoas, Roraima, Pernambuco, Tocantins e na Bahia.

Veja mais na edição 582 do jornal impresso 

Diego Fredericci

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