Opinião

Jacutinga: “já escuto os teus sinais”

Em 1981, o presidente da Funai, Coronel Nobre da Veiga, e o delegado do órgão em Cuiabá, Coronel Pinho, foram visitar o Posto Indígena Manairisu, morada de um dos grupos da etnia Nambiquara, Vale do Guaporé, Mato Grosso. Jacutinga, que foi incumbido de recepcioná-los, desconfiou do interesse da visita, localizada “num ponto equidistante entre o Atlântico e o Pacífico”.

Próximo à pista de pouso onde aterrissou o avião da comitiva, ficava a aldeia Petoyensu, onde os índios insistiam em permanecer. Na sede do Posto Indígena, cujo titular achava-se de férias, Lia, a atendente de enfermagem, serviu rúcula no almoço, vinda da horta que os militares quiseram conhecer. Jacutinga entrou em pânico, pois junto à rúcula havia também a “erva do diabo” de uso medicinal. Retornam em boa hora, furiosos, pois no caminho os militares viram crianças dormindo no chão de cinzas e envoltas na bandeira nacional.

O grupo Manairisu, homem da floresta, teve os primeiros encontros com os não índios por volta de 1734, com a descoberta de ouro em seu território. Vila Bela, a primeira capital de Mato Grosso, nasceu assim, saqueando suas vidas. É uma história de resistência sem fim. Enfrentaram cobiça, doenças. Mas foi a estrada aberta no idos de 1960 que trouxe o boi e o sarampo e quebrou sua resistência. Próximo do extermínio, a situação foi reportada pela imprensa como a “Biafra brasileira”, e só freada pela atuação insana de uns poucos indigenistas da Funai. A visita dos militares deveu-se aos preparativos para asfaltar a BR 364 e sua variante, a BR 174, que cortaram o território Manairisu, próximo de suas cavernas sagradas, do Abrigo do Sol.

Para os índios, a profanação de suas cavernas, um dos sítios arqueológicos mais antigos das Américas, anuncia o fim do mundo. Nas cavernas moram as almas de seus ancestrais e o Aikahlosu, espírito do primeiro pajé que acompanha seu povo desde a saída da pedra, responsabilizando pela proteção de seus líderes e de suas roças.

Redação

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Reportagens realizada pelos colaboradores, em conjunto, ou com assessorias de imprensa.

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