Opinião

Jacutinga e o reino que não tem rei

Preparem seus corações pras coisas que Jacutinga, em Disparada, vem contando do sertão de Mato Grosso. Nos rastros de Geraldo Vandré e Théo de Barros chegou o inesquecível José Benedito. Em 1981, os índios da etnia Nambiquara do Cerrado seguiram suas pegadas na trilha da Linha Telegráfica e levado à aldeia Juína. Aí foi destinado a servir a aldeia no trabalho agrícola da coleta, no transporte dos produtos da roça até à aldeia, no abastecimento de água e lenha, em troca de abrigo.

José Benedito, que aprendeu “a dizer não e a ver a morte sem chorar”, foi indentificado como Nambiquara por ter orificios no septo nasal e lábio superior. Era de pouca conversa, forte, ainda que um homem velho. Sem documento algum, seu passado foi uma incógnita.

Jacutinga e José Benedito ficaram muito próximos quando dividiram a mesma casa, de madeira azul, de arquitetura jamais vista. Seu sonho de ter um rádio Transglobo de “oito elementos” foi atendido. De pouco sono, a noite era preenchida pelas ondas curtas de diversas partes do planeta e de sua própria voz, a espantar espíritos que perambulavam pela casa. Com Jacutinga, a caçar na mata escura, sua voz forte também espantou uma onça-preta indesejável.

A conta-gotas, Jacutinga soube de pedaços de sua existência, que nunca chegaram a completar o quebra-cabeça de sua vida. Pertencente à região da Serra do Norte, trabalhou como mascate para um índio peruano nos seringais de Rondônia. No Cerrado, casou-se com Tereza, sua conterrânea. Seu corpo está enterrado na nova aldeia Sowaintê, às margens do Roosevelt, sua terra natal, retomada por Jacutinga e os índios. 

Os dois Josés se tornaram amigos. Jacutinga lembrou que pegou uma virose que o fez perder muito peso em pouco tempo: de 68 para 48! Por um longo tempo, uma febre o visitou com hora marcada, sempre ao final da tarde. Os implastos e chás do amigo evitaram sua internação no hospital Rio de Janeiro, em Vilhena.

José Benedito, que já foi boi e se montou, que no mundo foi rodando em seus próprios pés, agora é cavaleiro, num reino que não tem rei.

 

Redação

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Reportagens realizada pelos colaboradores, em conjunto, ou com assessorias de imprensa.

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