Opinião

Jacutinga: assim falava a “canção da américa”

Abrigo temporário Nambiquara (Anna Maria, 1983)

Na aldeia, junto ao Nambiquara, as “velhas formas do viver” de Jacutinga foram, pouco a pouco, transformando-se. Conheceu João Maxixe, que tinha hábito de compor frases em sua língua, misturadas às palavras em português e em inglês, envoltas em um humor peculiar que deixava no ar a veracidade do que falava. Apaixonado por sementes, cultivou um pomar em sua aldeia Barracão Queimado. Quando as frutas, ainda nos pés, começavam a crescer, a criançada escrevia seus nomes com caneta, identificando sua posse. Homem belo, galanteador, de porte elegante, tirava suspiro das mulheres da cidade. Certa vez, escutei de uma antropóloga que Maxixe deixaria para trás muito galã hollywoodiano.

Lídio parecia pertencer a uma classe de lordes britânicos, ainda que de um despojamento material jamais visto por Jacutinga. Em suas palavras, seus bens “beiravam ao nada”. De gestos pausados, era magérrimo, mas com uma força na voz fenomenal.

Zezinho era uma espécie de Professor Pardal, o inventor criado em 1952 para os quadrinhos Disney. Não sabia apenas manejar motosserra e dirigir trator ou qualquer outro veículo, mas de sua mecânica. A cana-de-açúcar de sua roça virou garapa graças à moenda de madeira que ele mesmo fez. Roberto parecia que carregava a alegria e simplicidade do mundo dentro de si. Jacutinga gostava de ouvi-lo falar em português porque colocava todas as palavras no plural. Fuado, com estado de espírito ora sisudo ora carismático, é o único Nambiquara que, até hoje, anda de mãos dadas com Jacutinga, um hábito entre “cunhados”.

Eládio faz mais do que fala. Trabalhador que só, é o primeiro a acordar e dar início às atividades da aldeia. Corajoso, não se intimida nos enfrentamentos com outras etnias, quando se impõe com a altivez de um guerreiro. Erdo, de uma gentileza ímpar, legado de seus pais, controla os rigores das variações das chuvas e dos ventos.

Como as talas de bambu do trançado do cesto-cargueiro Nambiquara, Jacutinga entremeou-se aos indígenas e, por muitas vezes, se pariu a si mesmo, como poetizou Gabriel José García Márquez.

Redação

About Author

Reportagens realizada pelos colaboradores, em conjunto, ou com assessorias de imprensa.

Você também pode se interessar

Opinião

Dos Pampas ao Chaco

E, assim, retorno  à querência, campeando recuerdos como diz amúsica da Califórnia da Canção Nativa do Rio Grande do Sul.
Opinião

Um caminho para o sucesso

Os ambientes de trabalho estão cheios de “puxa-sacos”, que acreditam que quem nos promove na carreira é o dono do