Seguindo Pascoal Santullo Neto, Cuiabá paga o segundo IPTU mais barato do País. Ele garante que não há aumento e atribui o que o contribuinte vai sentir no bolso à atualização da Planta de Valores Genéricos.
Durante a entrevista o especialista em direito tributário afirma que o projeto de lei encaminhado para a Câmara de Vereadores, que atualiza a planta, vem com uma correção em média de 30%.
Pascoal fala ainda sobre ITBI e ISSQN e “desmistifica” o valor arrecadado com as multas dos radares: “Ele é 100% destinado para o fundo da Secretaria de Mobilidade Urbana (Semob)”.
Circuito Mato Grosso: No dia 14 de outubro o prefeito Mauro Mendes assinou o decreto n° 5877 que possibilita ao contribuinte inadimplente reparcelar em até três vezes o seu IPTU 2015. Essa medida teve eficácia? Como estão os reparcelamentos?
Pascoal Santullo Neto: A medida teve eficácia, sim. Com o advento da crise econômica, vários contribuintes que parcelaram no início do ano, pagaram parte das parcelas e pararam de pagar. O município fez um estudo, estratificou esses contribuintes e verificou que um grande número deixou de pagar no meio do parcelamento. Então nós atualizamos esse saldo remanescente e demos a oportunidade de ele pagar dentro do ano. A meta interna da prefeitura era arrecadar R$ 102 milhões com IPTU, em 2015, sendo que ano passado eram R$ 92. Prevemos um crescimento de R$ 11%. Em números absolutos nós lançamos R$ 186 milhões. Desses R$186, R$ 22 milhões são isentos – imóveis abaixo de R$ 25 mil, aposentados com requisitos para não pagar, portadores de necessidades especiais – então nós temos R$ 162 milhões que poderíamos receber. Com o relançamento nós já chegamos a R$ 108 milhões, ou seja, ultrapassamos e tivemos acréscimo de R$ 6 milhões. No mês de novembro o contribuinte recebe o décimo terceiro, então ele poderia pagar, sem atualização de juros, só com a correção monetária.
CMT: Em 2015 houve índice de inadimplência de 44%, sendo a região Sul de Cuiabá responsável por 63% do tributo não pago. Esses números superam os de 2014?
PSN: Com o relançamento esse número já caiu para 40%, com possibilidade de chegar a 38% até o final do ano. Em 2014 a média de inadimplência foi de 45%. Historicamente a região sul sempre foi a de maior inadimplência. Eu atribuo isso à falta de presença do poder público. Mas tem um detalhe importante, o Distrito Industrial tinha uma grande renúncia fiscal e, a partir do ano que vem, não terá mais, então nós, da fazenda pública municipal, acreditamos que em 2016 a inadimplência da região sul deve diminuir e região norte deverá ficar com o maior número de inadimplência. A maior inadimplência em Cuiabá é no territorial, principalmente nas grandes áreas, e não no predial.
CMT: Recentemente o senhor afirmou que as alíquotas de 2015 não tiveram alteração e mantiveram os 0,4% no caso de Imposto Predial e 2% de Imposto Territorial. Apesar disso a Câmara aprovou, recentemente, um aumento de 30 % no valor do imposto em algumas regiões de Cuiabá, para 2016. Como o senhor explica isso?
PSN: Eu afirmo e reafirmo que Cuiabá tem o 2º menor imposto predial no Brasil, nós só perdemos para Vitória. O territorial é mais caro para evitar a especulação. Quem constrói paga menos. Onde tem habitação, paga-se menos. O código tributário municipal, no artigo 202, determina que o gestor municipal, em até três anos – acho uma falha pois deveria ser todo ano – faça a atualização da Planta de Valores Genéricos. Então não houve aumento de 30%. O município de Cuiabá, cumprindo a legislação, juntamente com a sociedade civil, criou uma comissão, que foi formada em julho desse ano, foi a campo, fez uma pesquisa com 1250 imóveis, juntamente com o Creci, Secovi, Sinduscom e outras instituições, para atualizar a Planta de Valores Genéricos. O projeto de lei encaminhado para Câmara de Vereadores, que atualiza a planta, vem com uma correção em média de 30%, considerando que, nos mesmos projetos a prefeitura propõe que no exercício de 2016 o contribuinte que pagar o seu IPTU em dia, tenha um desconto de 20%.
CMT: Qual o valor do metro quadrado em Cuiabá, para base de cálculo do imposto?
PSN: Cada bairro e cada rua tem um valor de metro quadrado. O máximo é Avenida Rubens de Mendonça, que é de R$ 2800, enquanto para o mínimo há até R$ 10 reais o metro quadrado. Vou te explicar o porquê. Nessa pesquisa de campo feita, e com as informações dos corretores, nós pegamos os valores de dois imóveis que estão sendo vendidos no local. Um é vendido por R$ 6 mil reais o metro quadrado, de acordo com anúncio do proprietário. O outro é vendido por R$ 3,500 reais o metro quadrado. Nós pegamos também o IPDI, que são as últimas transações comerciais que houve na cidade, então quem comprou e vendeu nessa região, o fez na faixa de R$ 2,500 reais, aí você faz um preço médio entre o que o mercado está pedindo e aquilo que efetivamente está sendo negociado. A finalidade de Planta de Valores Genéricos é que o imóvel seja avaliado o mais próximo do valor de mercado.
CMT: Como são definidos esses valores?
PSN: Para o predial nós adotamos a tabela de preço Cub, Custo Unitário Básico da construção, que é uma tabela divulgada pelo Sinduscon. Todo estado tem essa tabela e ele tem o padrão de construção, baixo, médio e alto. Esse índice é apurado com base nos preços dos materiais de construção e da mão de obra. No territorial é valor de mercado, mais o preço histórico das últimas transações.
CMT: Quanto o valor do IPTU aumentou desde o começo da gestão Mauro Mendes? O senhor pode fazer uma linha do tempo com datas e porcentagem?
PSN: Aumento de alíquota nenhum, 0%. Quando Mauro Mendes entrou a alíquota era 0,42 e continua. Só houve correção monetária pelo IPCA, então você precisa pegar o índice do IPCA de 2013, 2014 e 2015. Todos os tributos municipais são corrigidos monetariamente pelo IPCA, então todos os anos teve correção de acordo com o IPCA. O IPCA desse ano vai dar 9.65. Do ano passado foi 5.62. De 2014 eu não me recordo de cabeça. Agora não terá aumento e sim atualização da Planta de Valores Genéricos. Uma coisa é a alíquota do tributo, outra coisa é a correção.
CMT: E quanto ao aumento do ITBI?
PSN: O ITBI é um Imposto de Transmissão de Bens Imóveis. Ele só é cobrado quando alguém comercializa um bem. Então veja bem, se alguém vai vender um imóvel em 2016 e esse imóvel teve aumento no valor de venda, será cobrado esse aumento, sobre o valor que o proprietário registra no cartório. Ele tem uma alíquota única de 2% sobre o valor da transação comercial. Isso é padrão no Brasil inteiro.
CMT: Que outras alterações podemos esperar da nova Planta de Valores Genéricos de Cuiabá?
PSN: Em algumas áreas, houve redução do valor venal. Como por exemplo, em todas as áreas onde há trincheiras da Copa. A realidade é que a atualização da planta reflete aquilo que o mercado diz à prefeitura, e por isso é feita de três em três anos. Eu defendo que ela deveria ser feita anualmente, mas sou voto vencido. Há cinco anos não é feita a atualização, porque o antigo gestor não a fez. Há cinco anos não havia trincheiras, Av. das Torres…
CMT: Com o aumento do teto do simples nacional, haverá redução da arrecadação do ISS em Cuiabá, assim como em todo o Brasil. Quanto Cuiabá deixará de arrecadar?
P.S.N.: Caso o projeto que está em tramitação no Senado seja aprovado, Cuiabá, em 2016, terá uma perda de receita na ordem de R$50 milhões no ISSQN, e em 2017, na ordem de R$ 54 milhões. Como tributarista, há duas coisas que sou contra nesse projeto. Existe uma coisa no direito tributário chamado “Extra Fiscalidade”, que quer dizer que, o seguimento de bebidas e cigarros pagam maiores impostos, porque eles são prejudiciais à saúde. Eles causam um dano à saúde do Estado, indiretamente. O projeto de lei PLC 25 enquadra as fábricas de bebida alcoólicas no Simples Nacional. Não tem cabimento um negócio desses! Outro detalhe que está no projeto, a Micro Empresa de Crédito. Essa micro empresa será enquadrada no Simples Nacional, ou seja, com até R$14,4 milhões e não terei o controle do Banco Central. Isso é um absurdo. É legalizar a agiotagem no Brasil até esse valor. A mudança a que somos contrários é que o projeto estabelece um limite de R$ 3,6 milhões R$ 14,4 milhões. Isso significa que uma empresa que fatura R$ 1,2 milhão por mês é uma micro empresa. Ou seja, para fins de comercio, é um milhão de dólares, para fins de serviço, cinco milhões de dólares. Em lugar nenhum do mundo o microempresário tem esse enquadramento. Espanha, que é um país desenvolvido, é micro empresa aquele que fatura 440 mil euros por ano.
CMT: Como a prefeitura pretende lidar como esse problema? Qual o impacto para a economia municipal?
P.S.N.: Essa redução só será implementada em 2017/2018, e eu não sei como a próxima gestão vai fazer para recuperar a perda de receita. Hoje, o principal tributo do município de Cuiabá é o ISSQN. A prefeitura arrecada com o Simples Nacional cerca de R$2,2milhões por mês e com o ISS R$23 milhões por mês. O que terá que ser feito? Eu defendo que essa proposta não passe, pois se ela passar ela traz um grande prejuízo na arrecadação própria dos municípios, que, de alguma forma, o Governo Federal terá que recompensar. O que está ocorrendo é uma minirreforma tributária para prejudicar o ente federado mais pobre: o município.
CMT: Dentro do projeto existe alguma compensação?
P.S.N.: Não existe nada. O pior do projeto é que, quando você paga o ISSQN por meio do DAM (Documento de Arrecadação Municipal) esse dinheiro vem para os cofres do município, e o atual gestor tem autonomia para fazer as políticas públicas que desejar. Quando o dinheiro é arrecado pelo DAS (Documento de Arrecadação do Simples) esse dinheiro vai para Receita Federal em Brasília. Então, continuaremos indo com o “pires na mão” a Brasília para continuar tentando que esse recurso seja repassado.
CMT: O aumento do IPTU é uma compensação pela quebra que a redução do ISS causará nos cofres municipais?
P.S.N.: Não compensa. Nós arrecadamos R$ 108 milhões com o IPTU, com o ajuste de 20%, o alinhamento médio é de 30% no ISS. Se eu tiver 10% em R$ 108 milhões, eu tenho R$ 10milhões, então eu vou arrecadar no ano que vem, cerca de R$118 milhões no IPTU do ano que vem. Entretanto, vou perder R$ 50 milhões no ISS. Não existe compensação nenhuma aqui. Hoje, o principal tributo do município de Cuiabá, e de qualquer outro município, é a chamada ISSQN. Sem ele, nenhum município que tem receita própria consegue sobreviver.
CMT: Existe algum plano em que o prefeito Mauro Mendes esteja pensado, caso seja reeleito, para conseguir manter a arrecadação do município?
P.S.N.: Terá que haver uma mudança no pacto federativo, vão ter que arrumar uma forma de repassar recursos para esses municípios. Porque se, não, não tem como sobreviver. Hoje, se Cuiabá tiver uma perda de receita de R$50 milhões a prefeitura fecha as portas.
CMT: Qual a receita total da prefeitura para o próximo ano?
P.S.N.: A Receita programada para 2016 é de R$1 bilhão. O ISSQN representa 30% dessa receita. Hoje, mensalmente arrecadamos R$23 milhões de ISSQN, e de “Simples” R$2,2 milhões. O Simples Nacional é gerido pela Receita Federal, existe um comitê que cuida disso. Estão querendo fazer uma reforma tributária às avessas, querendo prejudicar a parte mais frágil que é o município.
CMT: E isso se deve a quê?
P.S.N.: Isso se deve à falta de liderança política do poder executivo. Se nós tivéssemos um poder executivo forte, um projeto desse tipo não passaria nunca na Câmara e no Senado.
CMT: Secretário, onde o contribuinte pode pesquisar para saber de que maneira a receita da prefeitura está sendo investida? Tanto de IPTU, ITBI, radares eletrônicos e afins.
P.S.N.: Eu vou desmistificar a questão dos radares. A arrecadação com os radares não vai um centavo para a ‘Fonte 100’. Ele é 100% destinada para o fundo da Secretaria de Mobilidade Urbana (Semob). Na lei que criou o fundo diz que, de 30% a 40% desse valor vai para a educação no trânsito. 30% é para a recuperação de calçadas e os outros 30% para a recuperação de vias públicas. A Secretaria de Fazenda não administra esse recurso. Para saber onde o dinheiro é investido, o contribuinte pode mandar carta, entrar no site ou ligar para a Controladoria Geral do Município. Hoje em dia a gente tem um controle muito rigoroso, do Tribunal de Contas do Estado (TCE), da imprensa e da sociedade civil.