O anúncio de que o Escritório do Representante Comercial dos Estados Unidos (USTR, na sigla em inglês) irá investigar supostas práticas comerciais desleais brasileiras é uma tentativa do governo americano de dar respaldo legal às ações contra o Brasil e afastar a ideia de que o governo de Donald Trump age apenas por motivos políticos na questão. A avaliação é da professora da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ) e pesquisadora de comércio exterior associada ao Instituto Brasileiro de Economia (Ibre) da Fundação Getulio Vargas (FGV), Lia Valls.
A pesquisadora acrescenta ainda que o pedido de investigação indica que o cerco ao Brasil tem pouca relação com a ideia de que os Estados Unidos teriam déficit comercial na relação bilateral, um dos argumentos utilizados por Trump na semana passada ao anunciar tarifas de 50% a produtos brasileiros. “Pouco tem a ver com a história de ser superavitário ou deficitário, e sim que essas práticas desleais prejudicam os interesses das empresas e cidadãos americanos”, reforça ela.
Valls também destaca que a investigação do USTR têm rito próprio, que costuma levar meses e, por isso, o anúncio desta terça-feira, 15, tem poucos efeitos práticos imediatos, inclusive sobre futuras negociações para as tarifas de 50%. “A negociação das tarifas é algo que depende ainda de esforço diplomático”, diz.
Ela também cita que a seção 301, dispositivo da Lei do Comércio de 1974, é prerrogativa da legislação americana e, por isso, há pouca margem para contestação em órgãos multilaterais, como o fórum de resolução de conflitos da Organização Mundial do Comércio (OMC), que tem sido esvaziado pelos próprios americanos.
Entre as práticas listadas pelo USTR no pedido de investigação, Valls considera que há pontos em que o Brasil tem totais condições de se defender das acusações americanas, como comercialização de produtos contrabandeados e mecanismos anticorrupção.
Já a reclamação americana sobre as tarifas impostas pelo Brasil à compra de etanol americano é passível de refletir em novos acordos, após as investigações, já que era uma reivindicação antiga dos EUA.