Tosses, náuseas, sangramentos pelo nariz, dores de cabeça são sintomas que têm sido comuns aos moradores da Vila de São Jorge, localizada a 36km de Alto Paraíso (GO), e próxima à área afetada pelo incêndio no Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros. Desde o início das queimadas, a vila é invadida por fumaça e fuligem. Sem assistência, os moradores precisam buscar atendimento em outras cidades.
A professora Regiana Araujo, 29 anos, teve que levar a filha, Kauane, de 1 ano e 10 meses para Brasília. “Ela passou muito mal, nunca tinha tido isso”, conta. Regiana é professora de ensino infantil, na Escola Municipal Povoado de São Jorge. Desde o início do incêndio pelo menos seis crianças faltaram aula por não se sentirem bem.
A situação se repete também entre as crianças mais velhas, no ensino fundamental. “Tem muita criança faltando as aulas, muita fumaça. A gente tem que trabalhar na sala de aula com ventilador ligado”, diz a vice-diretora Shirley da Silva Gomes.
Pela cidade, os relatos de problemas de saúde não são poucos. A terapeuta Gisele Aleixo Bianchini, 37 anos, grávida, decidiu deixar São Jorge e ir para a casa dos pais, em Franca (SP). “Vou embora da vila para poder me proteger, estou passando muito mal, preciso também proteger o neném”, diz. Gisele é uma das voluntárias no combate ao incêndio. Ela abriu as portas da casa para concentrar as doações e preparar comida para brigadistas e voluntários. Mas, com a fumaça, decidiu deixar o local.
A pedagoga e também voluntária Paula Marina Monteiro, 32 anos, tem colocado toalhas úmidas nas janelas e até mesmo jogado água no patio da casa para reduzir os efeitos da fumaça. “Tem horas que fica cheio de fuligem, com criança pequena, tenho que tomar esses cuidados, mas mesmo assim estou sentindo dores de cabeça. É terrível”, diz.
A agente de saúde de São Jorge Conceição de França decidiu, por conta própria, fazer uma lista das pessoas que estão passando mal com a fumaça para pedir que a Secretaria de Saúde de Alto Paraíso, município no qual está a vila, reforce o atendimento na comunidade. “Nada foi feito ainda pela Secretaria de Saúde devido a não ter sido levado até eles os dados das pessoas que estão passando mal. Eu, por conta própria, resolvi passar nas casas, fazer um levantamento e levar até eles para que as providências sejam tomadas”.
Segundo Conceição, as pessoas sentem os efeitos da fumaça desde o dia 10, quando ocorreu um primeiro foco no Parque Nacional. No dia 17, com o surgimento dos novos focos que deram origem ao atual incêndio, que já devastou 26% da área da reserva, os sintomas se intensificaram. Os que mais sofrem são as crianças e os idosos.
“Algumas pessoas estão procurando a unidade de saúde daqui. Temos médico de terça a quinta, mas precisamos de mais assistência. Uma paciente teve que ser levada a Alto Paraíso. Ela é hipertensa. A pressão aumentou, teve um dor de cabeça muito forte e sangramento nasal”, diz e acrescenta: “A situação é simplesmente caótica porque não houve na nossa região um incêndio dessa magnitude. Está afetando a todos”.
Segundo o prefeito de Alto Paraíso, Martinho Mendes da Silva, o sistema de saúde do município é frágil e ele precisará da ajuda estadual para atender os afetados indiretamente pelo incêndio. “Para se ter ideia, nossas crianças não nascem aqui, nascem às vezes na ambulância, em deslocamento para Goiânia ou Brasília”. Ele ressalta que o município consegue oferecer atendimento nas unidades de emergência, que oferecem os cuidados primários, com médicos 24h.
O prefeito disse que chegou a pedir ajuda ao governo de Goiás. O vice-governador José Eliton esteve em Alto Paraíso na última quarta-feira (25). Antes disso, Martinho da Silva esteve em Goiânia.
Por meio da assessoria de imprensa, o governo de Goiás disse que “está colocando as equipes de pneumologia do Hospital Geral de Goiânia Alberto Rassi (HGG) e do Hospital de Urgências Governador Otávio Lage (Hugol) em alerta para fornecer orientações a profissionais de saúde da região e para encaminhamento dos casos mais graves, conforme regulação”. Ambos hospitais são em Goiânia.
“A fumaça de grandes incêndios podem ser tóxicas e pessoas expostas a ela podem necessitar de cuidados médicos em caso de falta de ar e outros sintomas”, acrescenta a nota. A Secretaria de Saúde estadual também atende por telefone pelo Centro de Informações Toxicológicas (CIT), para informações sobre intoxicações 24h por dia, pelo númer 0800 646 4350, com médicos especializados para prestar orientação à população.