Uma reviravolta nesta tarde, entre as 16h27 e as 16h37, tirou o Ibovespa do negativo e o colocou na máxima do dia, aos 130.898,89 pontos, no maior nível intraday desde 7 de novembro – e acumulando variação de 3.108,91 pontos ao longo daqueles dez minutos. Às 16h27, a colunista Mônica Bergamo, da Folha de S.Paulo, antecipou a informação de que o presidente Lula vai ser submetido a novo procedimento para bloquear o fluxo de sangue em uma região do cérebro e minimizar risco de outro sangramento. O dólar, que se mantinha pouco acima de R$ 6, mergulhou a R$ 5,9537 na mínima do dia e fechou em baixa de 1,53%, a R$ 5,9557.
“Não é que o mercado torça contra a saúde do presidente ou de qualquer pessoa. Mas reflete, nos preços dos ativos, o que o governo faz. Houve muito descontentamento com o pacote fiscal e a isenção do IR para a renda mensal de até 5 mil. Há muita preocupação ainda com a direção das contas públicas”, diz um profissional do mercado. E, sem especular sobre a saúde do presidente, caso o vice, Geraldo Alckmin, venha a ter um papel mais importante, pode fortalecer o que agrada ao mercado na equipe econômica, que tem sofrido derrota em embates com a ala política do governo, inclusive na recente formatação do pacote, aponta o observador.
Até então, o dia era de correção parcial em Vale – em queda até ali superior a 2% – após o salto de 5% na ação anteontem, e o Ibovespa não conseguia estender, hoje, a série de recuperação pela terceira sessão, mesmo relativamente favorecido pela moderada retração no câmbio e na curva do DI, à exceção mais uma vez do vencimento curto, de janeiro de 2025, vértice em alta como ontem. Assim, tendo retomado a marca dos 128 mil na terça-feira, o Ibovespa convergia para os 127 mil, e ali se mantinha até as 16h27 quando veio a publicação da colunista da Folha de S.Paulo.
No fechamento, o Ibovespa marcava alta mais discreta, de 1,06%, sem conseguir sustentar o nível de 130 mil no fim do dia, aos 129.593,31 pontos, como ontem no maior nível de encerramento desde 26 de novembro. O nível de 130 mil não é visto em fechamento desde 6 de novembro, então aos 130.340,92 pontos. No fim da tarde, o médico Roberto Kalil detalhou o procedimento “simples e fora de centro cirúrgico” que será feito amanhã no presidente Luiz Inácio Lula da Silva, como um “complemento de baixo risco” que já estava programado desde a cirurgia inicial.
Com giro reforçado a R$ 29,2 bilhões na sessão, o índice oscilou dos 127.361,90 até os 130.898,89 pontos, do pico da tarde, saindo de abertura aos 128.228,49. Na semana, acumula agora ganho de 2,90% e, no mês, sobe 3,12% – no ano, ainda cede 3,42%. Além da Vale, a sessão era negativa também para Petrobras, que virou ao fim para alta de 0,71%, na ON, e de 1,00%, na PN – ambas caíam até a notícia sobre Lula. O dia era misto para as ações de grandes bancos, que se alinharam em alta com a mesma notícia, em avanço de 2,13% para BB ON; de 0,97% para Itaú PN, e de cerca de 2% para os papéis de Bradesco (ON +2,30%, PN +1,76%).
Na ponta ganhadora do Ibovespa, Totvs (+7,37%), Petz (+6,34%) e Hapvida (+5,95%). No lado oposto, Ambev (-3,29%), Vale (-1,56%) e Azul (-1,55%).
“De forma estrutural, o mercado está posicionado negativamente para 2025. Assim, quando entra algum fluxo comprador, especialmente de estrangeiro, o ‘stop’ vem logo”, o que tira fôlego da recuperação na Bolsa, diz Cesar Mikail, gestor de renda variável da Western Asset. Ele menciona as preocupações em torno da sustentabilidade do endividamento público, em nível que se aproxima de 80% do PIB quando se considera a dívida bruta, no momento em que se acumulam frustrações em torno de um pacote de ajuste fiscal que não parece cumprir a função.
“A decisão e a comunicação do Copom desta noite serão muito importantes. Se vier um aumento de 100 pontos-base, como muitos esperam, pode acalmar o mercado. O BC vai precisar segurar no peito, na decisão e no comunicado, reafirmando a disposição de ser duro com a inflação”, acrescenta o gestor, observando que a decisão de hoje será a última com a participação de Roberto Campos Neto, que será substituído por Gabriel Galípolo no comando do Banco Central em janeiro.
“O câmbio tem refletido todo esse estresse fiscal. Se considerássemos apenas o efeito esperado do protecionismo de Trump sobre emergentes, a conta estaria mais para R$ 5,50, no máximo a R$ 5,70. A diferença para cima, que tem mantido o dólar a R$ 6, é o prêmio relativo à percepção sobre o fiscal. E quando se inclui isenção de IR para quem ganha até R$ 5 mil – o que corresponderia a 87% do universo de contribuintes -, há uma intenção conflitante com ajuste fiscal”, aponta Mikail.
“O consenso sobre o Copom de hoje, que era de um aumento de meio ponto porcentual se conversássemos um mês atrás, passou para 0,75 ponto e chegou a 1,00 ponto porcentual para a maioria do mercado, o que levaria a Selic a 12,25% no fechamento de 2024, refletindo o bate-cabeça do governo no ajuste fiscal e a rápida deterioração das expectativas. O tom do comunicado de hoje vai ser muito importante”, diz Paulo Henrique Duarte, economista da Valor Investimentos.
Dólar
O dólar à vista mergulhou na reta final do pregão e fechou abaixo do nível de R$ 6,00 pela primeira vez desde 28 de novembro. Esse movimento coincidiu com a informação de que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva passará amanhã por procedimento complementar da cirurgia realizada na última terça-feira, 10, para tratar sangramento intracraniano.
Desde a sessão de ontem, após a internação de Lula no hospital Sírio-Libanês, operadores e analistas ouvidos pelo Broadcast têm atribuído a redução de prêmios de risco embutidos nos ativos domésticos à possibilidade de que o presidente não concorra à reeleição em 2026. A avaliação é de que a ausência do petista no pleito, em razão de saúde mais frágil e idade avançada, ampliaria a possibilidade de vitória de um nome à direita do espectro político, em tese mais comprometido com uma agenda de contenção dos gastos públicos.
Ao longo da tarde, antes da informação sobre Lula, o dólar já vinha em baixa, mas ainda acima da linha de R$ 6,00. A recuperação do real era atribuída ao aumento das chances de votação do pacote fiscal do governo ainda neste ano, após fala ontem do presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL). Foram indicados relatores para a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) do pacote fiscal, além dos projetos que limitam o crescimento do salário mínimo e estabelecem novos gatilhos ao arcabouço.
Parte do alívio também estaria ligada à consolidação da aposta de que o Comitê de Política Monetária (Copom) anuncie hoje uma aceleração do ritmo de alta da taxa Selic, talvez até com uma alta de 1 ponto porcentual, e sinalize ciclo de aperto monetário mais intenso. A aposta é de aumento da atratividade das operações de carry trade, em razão da ampliação do diferencial entre juros interno e externo, uma vez que a leitura da inflação ao consumidor nos EUA em novembro, divulgada pela manhã, reforçou a expectativa de que o Federal Reserve reduza a taxa básica americana neste mês.
Com mínima a R$ 5,9537, logo após a informação do procedimento complementar da cirurgia de Lula, antecipada pela Folha de S. Paulo e confirmada por boletim médico divulgado pelo Sírio-Libanês, o dólar à vista terminou a sessão em baixa de 1,53%, cotado a R$ 5,9557 – menor valor de fechamento desde 27 de novembro (R$ 5,9135). Graças ao tombo de hoje, a moeda passou a acumular desvalorização em dezembro (-0,76%).
O real apresentou de longe o melhor desempenho entre divisas emergentes e de países exportadores de commodities. Pares da moeda brasileira, como o peso mexicano e o rand sul-africano, também apresentaram ganhos, embora bem mais modestos. Já o DXY – termômetro do comportamento do dólar em relação a uma cesta de seis divisas fortes – teve alta moderada, com máxima aos 106,806 pontos.
“As piores moedas no ano, o peso mexicano e o real, estão se valorizando hoje. Além disso, o dólar já estava bem esticado aqui e havia espaço para um ajuste”, afirma o head da Tesouraria do Travelex Bank, Marcos Weigt, para quem uma decisão unânime do Copom de elevar o ritmo de alta da Selic pode dar fôlego novo ao real, uma vez que torna custosa carregar posições “compradas” em dólar.
Para o gerente de câmbio da Treviso Corretora, Reginaldo Galhardo, a perspectiva de aprovação do pacote de gastos do governo, após liberação de emendas parlamentares, e o aumento do diferencial de juros interno e externo ajudaram a explicar a queda do dólar ao longo do dia.
“Com as apostas de corte de juros pelo Fed na semana que vem, podemos ver uma janela para o investidor estrangeiro explorar o spread entre os juros americanos e o nosso. Além disso, há já um movimento maior dos exportadores, que aumentaram a internalização de recursos após o dólar superar os R$ 6,00”, afirma Galhardo.
Juros
Os juros futuros voltaram a fechar a sessão em queda consistente. As taxas já tinham recuo firme desde cedo e receberam impulso extra
à tarde com a informação de que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva será submetido a procedimento complementar à cirurgia de ontem, dada a leitura de que sua condição de saúde não deve lhe permitir concorrer à reeleição em 2026. As apostas de atuação firme do Copom na Selic e o maior otimismo sobre o andamento do pacote fiscal completam a lista de fatores a explicar o alívio nos prêmios. O quadro de apostas para a decisão de política monetária, porém, seguiu inalterado.
A taxa do contrato de Depósito Interfinanceiro (DI) para janeiro de 2026 encerrou em 14,20%, de 14,38% ontem no ajuste, o DI para janeiro de 2027 cedeu de 14,69% para 14,35%. O DI para janeiro de 2029 fechou com taxa de 13,90% (de 14,31%).
O noticiário sobre o pós-operatório de Lula, que mobiliza atenções desde ontem, seguiu no radar ao longo do dia, funcionando como um pano de fundo para estimular a recomposição de posições vendidas. Mas um movimento mais agudo veio por volta das 16h30 com o boletim médico sobre o quadro de Lula, informando que ele realizará na manhã desta quinta-feira, 12, um novo procedimento como complementação da cirurgia realizada na cabeça. Segundo o médico Roberto Kalil, o procedimento é simples, estava previsto desde a cirurgia de ontem e não deve atrasar a liberação para alta. De todo modo, os juros aceleraram a queda para 30 pontos em toda a curva e o dólar cedeu abaixo de R$ 6,00.
Uma possível ausência de Lula na corrida eleitoral é vista como positiva sob a ótica das contas públicas, dado o viés de expansionismo fiscal que, dizem os economistas, tem marcado o seu terceiro mandato. Com isso, cresce a perspectiva de substituição por um nome mais ortodoxo, que não sobrecarregue o papel da política monetária para ancorar as expectativas.
A isso soma-se a percepção de que a questão das emendas está sendo pacificada de forma a destravar o andamento do pacote de corte de gastos no Legislativo, após a portaria acertada com a cúpula do Congresso para o pagamento de quase R$ 7 bilhões.
O economista-chefe da Nova Futura Investimentos, Nicolas Borsoi, comenta que a melhora da perspectiva para o cenário fiscal pegou o mercado num momento tecnicamente frágil. “O mercado tinha sido forçado a reduzir posições aplicadas muito rapidamente, até com bancos tentando proteger suas posições em títulos públicos. Como o processo de desalavancagem foi violento, agora o pessoal se sente mais à vontade para aplicar”, afirma, lembrando que a curva chegou a precificar Selic terminal perto de 16%.
Nesta tarde, a projeção de taxa terminal já estava mais perto de 15%, a 15,25%, ainda elevada. Para o Copom de hoje, a curva embutia 88% de chance de aumento de 1 ponto porcentual na Selic e apenas 12% de chance de aperto de 0,75 ponto. O crescimento de 1% no volume de serviços prestados em outubro, acima da mediana das estimativas, de alta de 0,5%, e perto do teto de 1,4%, reforça a expectativa de uma elevação mais forte.
Para Borsoi, num cenário ideal o Copom deveria aplicar a dose de 1 ponto com sinalização da mesma magnitude para a reunião de janeiro. “Se não houver este guidance, o BC telegrafaria um cenário muito aberto, o que pode resultar em uma arapuca para Galípolo na sua primeira reunião”, diz, sobre o atual diretor de Política Monetária que assumirá o comando do Banco Central em janeiro. Para o economista, o aumento de 0,75 ponto seria ruim, independentemente da mensagem do Copom. “O BC tem de mostrar a cara para dissipar qualquer suspeição sobre Galípolo”, completa.