Após ter sido estimulado ontem pela percepção de que o governo acelerou os movimentos para entregar logo o aguardado pacote de cortes de gastos, o Ibovespa operou perto da linha d’água ao longo da tarde desta segunda, 5, à espera do anúncio da decisão. Assim, vindo do que foi a sua maior alta desde 6 de fevereiro, o Ibovespa fechou hoje aos 130.660,75 pontos, em leve avanço de 0,11%, uma pausa após a progressão de 1,87%, na segunda-feira, que havia sucedido quatro perdas consecutivas. O giro ficou em R$ 19,5 bilhões. No mês, o Ibovespa sobe 0,73% nas primeiras três sessões, o que limita a perda do ano a 2,63%. Na semana, ganha 1,98%.
Entre a mínima e a máxima do dia, o índice da B3 oscilou dos 129.692,26 aos 130.768,59 pontos, saindo de abertura aos 130.514,79. Na ponta ganhadora da carteira nesta terça-feira, destaque para Itaúsa (+3,66%) e Itaú (+3,00%), após a divulgação dos resultados do terceiro trimestre do maior banco privado brasileiro. Também entre as favoritas do dia apareceram Petz (+3,82%), Totvs (+3,74%), Azul (+3,11%) e Raia Drogasil (+3,06%). No lado oposto, Carrefour (-5,16%), TIM (-3,93%), Natura (-2,26%) e Minerva (-2,19%). Entre as blue chips, o fechamento foi negativo também para Vale (-0,88%) e Petrobras (ON -0,50%, PN -0,31%).
“O Ibovespa se manteve lateralizado hoje na expectativa também pela definição da eleição americana. Eventual vitória de Donald Trump pode fortalecer o dólar e fazer o Ibovespa ‘penar’ um pouco mais”, diz Rubens Cittadin, operador de renda variável da Manchester Investimentos, referindo-se às inclinações protecionistas mais uma vez manifestadas pelo republicano na campanha de retorno à Casa Branca.
No cenário doméstico, “a antecipação da reunião desta tarde sobre cortes de gastos trouxe um pouco de ânimo, porque mostra que o governo está se mexendo” para buscar solução de questão demandada pelos investidores, acrescenta o operador, que destaca a conservação da linha de 130 mil pontos pelo índice da B3.
A reunião desta tarde entre Fernando Haddad e outros ministros, originalmente prevista para as 16h, foi antecipada em cerca de duas horas, o que contribuiu para que o Ibovespa zerasse as perdas do dia, a partir do meio da tarde, e tocasse a máxima da sessão, em leve alta de 0,19% no melhor momento.
Em meio à expectativa para o anúncio – quem sabe ainda hoje – da decisão sobre redução de despesas, fontes ouvidas em Brasília pelo Broadcast apontaram que ministros que integram a Junta de Execução Orçamentária (JEO) teriam outra reunião, às 16h, com representantes das pastas do Trabalho, da Saúde e Educação – ministérios que haviam participado, ontem, de encontro com o presidente Lula e Haddad, reportam os jornalistas Amanda Pupo, Caio Spechoto e Fernanda Trisotto.
Na outra ponta de incerteza para os investidores, na eleição americana, “uma vitória de Trump seria positiva para o dólar, especialmente caso ocorra uma vitória completa dos republicanos: os investidores imediatamente precificariam redução de impostos nos Estados Unidos, elevação das taxas do Federal Reserve, maior protecionismo e riscos geopolíticos elevados”, avalia Matthew Ryan, head de estratégia de mercado da Ebury.
Por outro lado, em eventual triunfo da democrata Kamala Harris, “os movimentos nas moedas seriam mais contidos, embora ainda pudéssemos ver uma queda acentuada do dólar e valorização nas moedas de mercados emergentes, simplesmente pela precificação de uma derrota de Trump”, diz Ryan.
No quadro doméstico, “ainda que em grau menor do que o de ontem, o fechamento da curva de juros prosseguiu hoje”, destaca Paulo Luives, especialista da Valor Investimentos, chamando atenção para a relativa descompressão de ativos conhecidos pela sensibilidade à percepção de risco fiscal, no momento em que o governo tem procurado mostrar ao mercado que irá endereçar logo iniciativas que mantenham de pé o arcabouço para as contas públicas.
Além da apuração da eleição americana a partir desta noite e madrugada, as atenções globais estarão voltadas, na quinta-feira, para a deliberação do Federal Reserve sobre a taxa de juros. “O Fed deve cortar os juros em 0,25 ponto porcentual, sustentado por um mercado de trabalho robusto e inflação mais moderada, cenário que permite ao comitê uma confiança crescente na estabilização da inflação de longo prazo em torno de 2% ao ano”, aponta em nota Luiz Arthur Fioreze, diretor de gestão de fundos da Oryx Capital.
No Brasil, por outro lado, o Banco Central deve seguir trajetória oposta, com previsão de aumento de 0,50 ponto porcentual na Selic, na noite de quarta-feira, para manter “as expectativas de juros de longo prazo ancoradas, além de neutralizar a desconfiança em relação ao equilíbrio fiscal”. “No atual cenário, o Tesouro IPCA oferece juros reais de aproximadamente 7% ao ano, refletindo a necessidade de uma política monetária mais rígida que mitigue riscos de inflação e reforce a confiança na responsabilidade fiscal”, acrescenta Fioreze.
Dólar
Após oscilações contidas na manhã desta segunda-feira, 5, quando predominou leve sinal de alta, o dólar à vista se firmou em baixa ao longo da tarde de olho andamento de reuniões em Brasília para definição do pacote de corte de gastos prometido pelo governo Lula.
O quadro externo foi mais favorável ao real nesta terça-feira. Apesar das incertezas em torno do desenlace da eleição presidencial nos EUA, a moeda americana caiu na comparação com pares fortes e a maioria das divisas emergentes.
Com mínima a R$ 5,7404, o dólar à vista encerrou a sessão em baixa de 0,60%, cotado a R$ 5,7484. Após ter fechado no segundo maior nível nominal da história do real no dia 1º (R$ 5,8694), a moeda acumulou desvalorização de 2,06% nos dois últimos pregões. A alta do dólar em 2024, que chegou a superar 20%, agora é de 18,44%.
O gatilho para o movimento da apreciação do real ao longo da tarde foi a notícia da antecipação em duas horas do encontro do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, com titulares de outras pastas no Palácio do Planalto para tratar do corte de gastos. Ontem à noite, o ministério da Fazenda divulgou nota afirmando que o “quadro fiscal do País foi apresentado e compreendido, assim como as propostas em discussão”.
Ministros que compõem a Junta de Execução Orçamentária (JEO) também voltaram a se reunir hoje com as pastas da Educação, da Saúde e do Trabalho, que estiveram no encontro de ontem com a equipe econômica e o presidente Lula.
Uma das medidas em pauta é eventual desindexação do Benefício de Prestação Continuada (BPC) em relação ao salário mínimo. Segundo cálculos de especialistas obtidos pelo Broadcast, tal mudança poderia trazer uma economia superior a R$ 200 bilhões em dez anos. Benefícios como seguro-desemprego e abono salarial também podem ser redesenhados.
Para o economista-chefe do Banco Fibra, Marco Maciel, uma eventual mudança no reajuste do BPC seria muito bem recebida pelos investidores e levaria a uma queda do prêmio de risco refletido no juro longo brasileiro, abrindo espaço para uma rodada de apreciação do real.
“Se as medidas derem mais consistência ao arcabouço fiscal, podemos ver um recuo do juro longo brasileiro de 50 pontos-base em um primeiro momento e entre 30 e 50 pontos em um segundo momento. Isso seria compatível com um câmbio entre R$ 5,40 e R$ 5,50”, afirma Maciel, ressaltando que o cancelamento da viagem de Haddad à Europa nesta semana e as reuniões do Planalto ontem e hoje para debater as medidas fiscais explicam o alívio no dólar nos últimos dois dias. “Se não fosse isso, poderíamos ver o juro longo mais alto e o dólar perto de R$ 5,92”.
Dada dinâmica do sistema eleitoral americano, é possível que as medidas de contenção de gastos sejam anunciadas antes do resultado do pleito nos EUA, trazendo uma recuperação para o real a despeito do clima de cautela no exterior que pode predominar no exterior.
Apesar da alta sensibilidade da formação da taxa de câmbio ao quadro fiscal doméstico, parte recente da alta do dólar esteve ligada ao chamado “Trump trade” – ou seja, a aposta no dólar contra moedas emergentes em razão da perspectiva de que o candidato republicano conquiste novamente a Casa Branca.
Maciel ressalta que as taxas dos Treasuries subiram recentemente, uma vez que a agenda de Trump é “protecionista e inflacionária”, o que se refletiu no fortalecimento do dólar. Ele observa que hoje o real se sobressai em comparação aos pares latino-americanos, em razão da perspectiva de anúncio das medidas fiscais com o andamento de reuniões no Planalto. Já o rand sul-africano tem um desempenho superior ao da moeda brasileira em função de dados positivos da economia chinesa.
“A questão fiscal e as eleições americanas são as variáveis fundamentais para projeções do dólar no curto prazo. Do lado dos fundamentos e da necessidade de financiamento externo, poderíamos ver uma taxa de câmbio muito mais baixa”, ressalta Maciel.
Juros
Os juros futuros fecharam em baixa, com destaque para a ponta longa, mais sensível ao noticiário fiscal e ao ambiente externo, após exibirem alta durante a manhã desta segunda, 5. No Brasil, a antecipação de reuniões em Brasília para a discussão do pacote fiscal foi determinante para a melhora, ao sinalizar o senso de urgência na definição, e consequente do anúncio, das medidas de corte de gastos que os agentes tanto vêm cobrando do governo. Lá fora, o avanço dos rendimentos dos Treasuries perdeu força após um leilão de T-Notes com demanda acima da média, em meio ainda ao enfraquecimento do ‘Trump trade’ no dia D da eleição nos EUA.
A taxa do contrato de Depósito Interfinanceiro (DI) para janeiro de 2026 fechou em 12,81%, de 12,89% ontem no ajuste, e a do DI para janeiro de 2027 encerrou a 12,94% (de 13,03% ontem). A taxa do DI para janeiro de 2029 caiu de 13,04% para 12,93% (mínima).
A expectativa pelo pacote fiscal e a eleição americana ditaram a dinâmica dos mercados durante toda a sessão, deixando em segundo plano por ora a decisão do Copom amanhã. Inicialmente, o mercado optou pela cautela enquanto aguardava a nova reunião de ministros para selar o destino da agenda de revisão de despesas, que ocorreria às 16h. Do encontro, participaram Fernando Haddad (Fazenda), Rui Costa (Casa Civil), Carlos Lupi (Previdência), Wellington Dias (Desenvolvimento Social), Simone Tebet (Planejamento), Esther Dweck (Gestão), além de representantes do INSS, Dataprev e Serpro.
Porém, a informação no começo da tarde de que a reunião foi antecipada em duas horas abriu espaço para a curva devolver o estresse, com as taxas todas voltando a rodar abaixo de 13%. Para as 16h, ficou então a reunião da Junta de Execução Orçamentária (JEO) com as pastas da Educação, da Saúde e do Trabalho, segundo apurou o Broadcast.
“O mercado ficou um pouco frustrado, pois havia expectativa de que o pacote de Haddad seria divulgado. Hoje começou o dia devolvendo a melhora de ontem e à tarde voltou a melhorar com a antecipação da reunião com a Casa Civil”, relata Rafael Ihara, economista-chefe da Meraki Asset.
A presença de Dias e Lupi no encontro de hoje não é por acaso. O Desenvolvimento Social é o responsável pelo Benefício de Prestação Continuada (BPC), que está no centro do debate da agenda de gastos. O benefício é operacionalizado pelo INSS, que está no guarda-chuva da Previdência. Cálculos de especialistas apontam que uma desindexação do BPC em relação ao salário mínimo geraria economia bilionária ao governo, que pode superar R$ 200 bilhões em dez anos.
O ambiente internacional também favoreceu a distensão no mercado de juros, via Treasuries e moedas emergentes. A alta dos yields dos títulos dos EUA arrefeceu depois do leilão de US$ 42 bilhões em T-notes de 10 anos, com demanda forte. Ao mesmo tempo, o dólar perdeu força e se firmou em baixa ante o real, para encerrar a R$ 5,7484. No fim da tarde, o retorno da T-Note marcava 4,293%, longe das máximas da manhã em 4,36%.
Ihara lembra que desde o fim de semana vem crescendo a expectativa de uma vitória da democrata Kamala Harris na eleição norte-americana, com base na evolução do desempenho da vice-presidente nas últimas pesquisas de intenção de voto. “O trade relacionado ao Trump era tomado em juros americanos, principalmente ponta longa, e venda de moedas emergentes. Talvez o mercado esteja reduzindo essas apostas com o cenário mais incerto de quem ganha”, afirma.
Sobre o Copom, dado o consenso nas apostas de alta de 0,50 ponto porcentual da Selic, para 11,25%, o mercado quer ver como o comunicado vai trabalhar o cenário prospectivo, sobretudo se haverá algum tipo de guidance ou os diretores deixarão os próximos passos dependente dos dados econômicos.