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Ibovespa sobe 1,87%; dólar recua com expectativa de corte de gastos e desmonte de ‘Trump trade’

O cancelamento da viagem que o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, faria esta semana à Europa trouxe efeito oposto ao do anúncio, no fechamento da semana passada, de que se ausentaria de Brasília: relativa descompressão na taxa de câmbio e na curva de juros doméstica, ante a expectativa de que o governo esteja mais perto de, enfim, anunciar o aguardado pacote de cortes de gastos públicos. A permanência de Haddad no Brasil – um pedido que teria sido feito pelo próprio presidente Lula – se fez acompanhar nesta segunda-feira por sinais de que o governo acelerou os movimentos para entregar logo o pacote.

Assim, nesta abertura de semana, o Ibovespa mais do que reverteu a queda de 1,23% vista na sexta-feira, quando prevalecia a impressão de que o governo parecia não estar agindo com a urgência considerada necessária pelos agentes de mercado. Hoje, com melhor ânimo dos investidores, a mínima do dia (128.128,13) praticamente correspondeu ao nível de abertura, aos 128.129,60 pontos, tendo o Ibovespa chegado na máxima da sessão aos 130.608,79 pontos. No fechamento, mostrava alta de 1,87%, aos 130.514,79 pontos, com giro financeiro a R$ 19,4 bilhões. Nas duas primeiras sessões de novembro, o índice da B3 sobe 0,62% – no ano, cai 2,74%.

Foi a maior alta diária em porcentual para o Ibovespa desde 6 de fevereiro (+2,21%), vindo o índice, hoje, de perdas nas quatro sessões anteriores.

“As atenções do mercado se voltam para o valor exato dos cortes que serão anunciados pelo governo – e a expectativa é de reduções da ordem de R$ 30 bilhões a R$ 50 bilhões”, diz Inácio Alves, analista da Melver, mencionando também a espera pela deliberação do Comitê de Política Monetária (Copom) nesta quarta-feira, 6, quando a Selic deve ser mais uma vez elevada, possivelmente em meio ponto porcentual.

“Dá pra dizer que é uma das semanas mais aguardadas do ano, com decisão sobre juros nos Estados Unidos e no Brasil, além, claro, da eleição americana e a expectativa para o pacote fiscal que o ministro Haddad disse estar próximo – o que deu fôlego ao apetite por ações, hoje, com muito poucos papéis do Ibovespa destoando do sinal”, diz Willian Queiroz, sócio e advisor da Blue3 Investimentos.

“Pelas falas do Haddad, existe possibilidade efetiva de cortes de gastos, precisamos ainda entender como será isso”, ressalva Paloma Lopes, economista da Valor Investimentos, destacando em especial a retração do dólar na sessão, em baixa de 1,47%, a R$ 5,7831 no fechamento, ainda em nível “dentro do esperado”.

No encerramento desta segunda-feira, apenas cinco das 86 ações que compõem o Ibovespa mostravam perdas na sessão. Na ponta ganhadora, destaque para Cogna (+11,03%), Magazine Luiza (+10,38%), CVC (+9,28%) e Pão de Açúcar (+8,19%). No lado oposto, Azul (-3,01%), Hypera (-1,98%), Braskem (-1,04%), Bradesco ON (-0,24%) e Suzano (-0,03%).

Entre as blue chips, destaque para o setor metálico, com Vale (ON +1,03%), CSN (ON +2,49%) e Usiminas (PNA +3,80%). Petrobras ON e PN subiram hoje 0,10% e 0,23%, enquanto, entre os grandes bancos, o desempenho também se mostrou positivo no fechamento – à exceção de Bradesco ON. Itaú PN subiu hoje 1,35%, antes da divulgação do balanço do terceiro trimestre.

Dólar

A perspectiva de anúncio iminente de medidas de cortes de gastos pelo governo Lula, após aceno do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e o desmonte parcial do chamado “Trump trade” abriram espaço para uma forte recuperação do real nesta segunda-feira, 4.

Após subir 1,53% na sexta-feira, 1º, quando fechou a R$ 5,8694, no segundo maior nível nominal da história, o dólar à vista encerrou o dia em baixa de 1,47%, cotado a R$ 5,7831, com mínima a R$ 5,7562 pela manhã.

O real, que havia apanhado mais que seus pares na semana passada, hoje apresentou o melhor desempenho entre divisas emergentes e de países exportadores de commodities mais relevantes, seguido pelo seu principal par, o peso mexicano.

Termômetro do comportamento do dólar em relação a uma cesta de seis divisas fortes, o índice DXY recuou, voltando a operar abaixo da linha dos 104,000 pontos. As taxas dos Treasuries caíram em bloco, com a T-note de 10 anos rompendo o piso de 4,30% pela manhã, quando registrou as mínimas da sessão. As commodities metálicas e o petróleo subiram.

O economista-chefe do Banco Master, Paulo Gala, observa que o real não foi a única moeda emergente a sofrer na sexta-feira, ressaltando que o peso mexicano também enfrentou uma desvalorização acima de 1% em meio à disparada dos juros dos Treasuries no fim da semana passada.

Ele nota que hoje há uma reversão do “Trump trade” – aposta na valorização do dólar em relação a outras divisas, em especial emergentes -, com o avanço da candidata democrata, Kamala Harris, nas pesquisas de intenção de voto, na véspera do pleito nos EUA. O candidato republicado, o ex-presidente Donald Trump, tende a adotar medidas protecionistas, o que pode prejudicar moedas emergentes.

“Os mercados estão desmontando parcialmente as posições agressivas de sexta-feira. No entanto, ainda é incerto quem vencerá a eleição, e o mercado segue oscilando conforme as notícias”, afirma Gala.

Ao quadro externo mais benigno somaram-se sinais de que o pacote de redução de gastos prometido pelo governo Lula vai sair do papel nos próximos dias. O ministro da Fazenda cancelou a viagem que faria à Europa nesta semana. Parte relevante do estresse no mercado de cambio na sexta-feira havia sido atribuída à percepção de que o périplo de Haddad mostrava falta de senso de urgência do governo em ajustar as contas públicas.

Pela manhã, o ministro disse que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva passou o fim de semana debruçado sobre as medidas fiscais, que podem ser anunciadas nesta semana, dado que “as coisas estão muito adiantadas do ponto de vista técnico”. Haddad reuniu-se com Lula hoje à tarde, acompanhado do secretário-executivo da Fazenda, Dario Durigan, e do secretário de Política Econômica, Guilherme Mello.

Pela manhã, o economista-chefe do Banco BV, Roberto Padovani, afirmou que seria consenso governo a desindexação do Benefício de Prestação Continuada (BPC) e que pode haver um ajuste no abono salarial. Estaria descartada a possibilidade de mudança nas regras de gastos com saúde e educação. Padovani participou de reunião com Durigan, em que foi discutido o tema da revisão de despesas.

Para o economista-chefe da Equador Investimentos, Eduardo Velho, se o governo não promover “um corte robusto” de gastos públicos, de uma faixa entre R$ 30 bilhões e R$ 40 bilhões, além de adotar cláusulas de ajuste nas despesas obrigatórias, o dólar à vista pode ultrapassar o nível de R$ 6,00 nesta semana. “Será preciso avaliar as medidas fiscais para saber se a recuperação do real não será apenas pontual”, afirma Velho.

Além da eleição presidencial americana e da expectativa para o corte de gastos, investidores aguardam as decisões de política monetária aqui e nos Estados Unidos. A maioria dos economistas projeta que o Comitê de Política Monetária (Copom) anuncie uma alta de 0,50 ponto porcentual da taxa Selic na quarta-feira, 6. Já o Federa Reserve tende a promover novo corte de 0,25 ponto em sua taxa básica na quinta,7.

A combinação de aumento da Selic com alívio monetário nos EUA poderia dar, em tese, fôlego ao real, por ampliar o diferencial entre juros interno e externo e, por tabela, aumentar a atratividade das operações de carry trade. Mas a percepção de risco fiscal e as incertezas relacionadas à eleição americana mantêm os investidores na defensiva e desautorizam apostas contundentes a favor da moeda brasileira no curto prazo.

Juros

Os juros futuros fecharam mais de 20 pontos-base no período da tarde, conforme o mercado calibra as expectativas de que o governo federal anuncie um pacote de contenção de despesas nesta semana. O prazo foi citado pelo próprio ministro da Fazenda, Fernando Haddad, depois de ter cancelado viagem à Europa para cuidar de “temas domésticos” a pedido do presidente Lula. No exterior, o alívio nos rendimentos dos Treasuries e do dólar, após pesquisas eleitorais apontarem aumento da chance de que a candidata democrata, Kamala Harris, seja eleita nos Estados Unidos também contribui para o movimento.

A taxa do DI para janeiro de 2026 caiu a 12,880% nesta segunda-feira, de 13,089% do ajuste de sexta-feira; a do DI para janeiro de 2027 recuou de 13,27% do ajuste anterior para 13,03%; e a do DI para janeiro de 2029 cedeu de 13,29% do ajuste para 13,04%.

Os ajustes no mercado de juros começaram desde a abertura do pregão, visto que o cancelamento da viagem de Haddad à Europa, divulgado no domingo, para cuidar de “temas domésticos” foi interpretado como um maior senso de urgência por parte do governo em relação ao aperto fiscal.

O economista-chefe da Nova Futura, Nicolas Borsoi, considera que na semana passada o mercado teve a percepção de que havia um desarranjo no governo brasileiro, principalmente diante do “sinal bizarro” de Haddad viajando em um momento que “não fazia sentido”. Contudo, conforme Haddad cancelou a viagem a pedido do presidente Lula, essa percepção de desarranjo se reduziu um pouco e contribuiu para queda de juros no Brasil. “Não é nem que a questão de risco fiscal melhorou. Acho que investidores ainda estão ressabiados com a capacidade do governo de controlar gasto, mas nossos juros estão muito esticados”, pondera.

Haddad disse no fim da manhã que acredita que ainda nesta semana será possível anunciar as medidas de corte de gastos. “Essas medidas são muito importantes para que o governo consiga recuperar a confiança do mercado. Então só esse movimento de cancelamento de viagem, de novas falas de Haddad e sinais que o governo está se movimentando quanto a isso já ajudaram”, afirma o Head de alocação da W1 Capital, Victor Furtado.

Nesta tarde, Haddad foi ao Palácio do Planalto acompanhado do secretário-executivo, Dario Durigan, e do secretário de Política Econômica, Guilherme Mello, para tratar do plano de corte de gastos.

O pano de fundo externo contribuiu para o fechamento das taxas. Segundo Borsoi, pesquisas recentes mostraram maior chance de Kamala Harris ganhar a eleição dos Estados Unidos, que será “bem disputada”, fazendo com que os Treasuries e o dólar tivessem alívio e, consequentemente, ajudassem os juros futuros no Brasil.

Estadão Conteudo

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