Depois de cambalear na primeira parte da sessão desta sexta-feira de vencimento de opções sobre ações, a Bolsa conseguiu ganhar tração à tarde e recuperar o nível dos 122 mil pontos. O principal motivo foi a declaração do presidente Luiz Inácio Lula da Silva de que o futuro presidente do Banco Central, Gabriel Galípolo, será o chefe da autarquia com “mais autonomia” que a instituição já teve. Também houve viés positivo com a aprovação do pacote de ajuste fiscal no Congresso, ainda que desidratado.
A referência da B3 renovou sucessivas máximas após Lula publicar um vídeo ao lado de Galípolo, mencionando que o futuro presidente do BC assumirá o cargo por uma “relação de confiança minha e de toda a equipe do governo”.
O Ibovespa terminou o dia em 122.102,15 pontos, avanço de 0,75%. Na semana, contudo, houve perda de 2,01%.
Segundo o sócio fundador da Veedha Investimentos, Rodrigo Moliterno, o pronunciamento de Lula reforça o compromisso do governo com a autonomia do BC, dando maior credibilidade a Galípolo. “A virada mais forte do Ibovespa veio após pronunciamento de Lula junto a Galípolo. Deu aquele ímpeto a mais”, comenta.
Para a Fitch Ratings, em relatório publicado nesta tarde, o aperto monetário agressivo do BC em dezembro (alta de 1 ponto porcentual), elevando a Selic a 12,25% ao ano, demonstra claramente sua independência. “Além disso, sua unanimidade na decisão e forward guidance para as próximas reuniões sinalizam continuidade e previsibilidade, mesmo com a mudança de três membros do conselho, incluindo o presidente, no final do ano.”
As maiores quedas do índice hoje foram Automob (-10,64%) e Caixa Seguridade (-3,81%), todas revertendo lucros recentes. Na ponta positiva, destaque para ações cíclicas: Vamos (+6,61%) e Assaí (+6,07%).
Dólar
O dólar à vista emendou o segundo pregão consecutivo de baixa nesta sexta-feira, em mais um dia de intervenção pesada do Banco Central no mercado de câmbio, com injeção de US$ 7 bilhões. A aprovação das medidas de contenção de gastos do governo no Senado, mesmo com algum grau de desidratação, e a perda de força da moeda americana lá fora também contribuíram para a recuperação do real.
Em terreno negativo desde a abertura dos negócios, o dólar terminou a sessão em baixa de 0,84%, a R$ 6,0721. Trata-se de um alívio considerável em relação ao pico visto no fechamento da última quarta-feira, 18 (R$ 6,2657), fruto da combinação de crise de confiança local com alta global do dólar, após o Federal Reserve sinalizar que há menos espaço para reduzir os juros em 2025.
Mesmo assim, a moeda termina a semana com ganhos de 0,68%, o que leva a valorização acumulada em dezembro a 1,18%, após alta de 3,81% em novembro e de 6,31% em outubro. Como ontem, o real apresentou hoje o melhor desempenho entre pares emergentes, seguido de perto pelo peso mexicano. No ano, a moeda brasileira ainda amarga as piores perdas entre as principais moedas globais.
O dólar chegou a operar pontualmente abaixo de R$ 6,05, com mínima a R$ 6,0458, no meio da tarde, em momento marcado por máximas do Ibovespa e aprofundamento das perdas do juros futuros. Operadores atribuíram esse movimento conjunto de melhora dos ativos domésticos a declarações do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Em vídeo de almoço ministerial publicado na rede social X, Lula afirma, ao lado de Galípolo, que ele será o presidente com mais autonomia que o País já teve. “Jamais haverá qualquer interferência no trabalho que você tem no BC”, disse Lula ao futuro presidente e hoje diretor de política monetária da autarquia.
Parte do estresse que tomou conta do mercado local nesta semana foi atribuída a fala de Lula em entrevista ao programa Fantástico, da Rede Globo, suscitando temores de interferência do governo na gestão da política monetária no mandato de Galípolo, indicado pelo presidente. Na ocasião, Lula disse que não havia explicação para a taxa Selic no nível atual. “A irresponsabilidade é de quem aumenta a taxa de juros todo dia, não é do governo federal. Mas nós vamos cuidar disso também”, disse Lula ao Fantástico.
O economista-chefe do Banco Master, Paulo Gala, afirma que a semana termina com um alívio no mercado local. Além da intervenção histórica do BC no mercado de câmbio, ele ressalta declarações firmes de Galípolo ontem, reiterando o foward guidance do Comitê de Política Monetária (Copom) de mais duas altas seguidas de 1 ponto porcentual da taxa Selic, em janeiro e março.
“Essas duas altas são necessárias para pôr a trajetória da inflação a caminho da meta. Isso foi passado de maneira clara”, diz Gala, ressaltando que o Congresso também aprovou o pacote fiscal, embora um “pouco desidratado” em relação à proposta original. “Houve alguma coisa no BPC (Benefício de Prestação Continuada), mas a regra que coloca o crescimento do salário mínimo alinhado ao arcabouço, que é muito importante, passou.”
Após injetar US$ 8 bilhões no mercado cambial ontem – dos quais US$ 5 bilhões em moeda à vista -, o BC voltou a atuar hoje. Foram vendidos US$ 3 bilhões em moeda à vista e mais US$ 4 bilhões em linha com compromisso de recompra.
Somando os dois instrumentos – venda à vista e linhas – o BC colocou US$ 27,7 bilhões no mercado em dezembro – a maior intervenção da história do regime de câmbio flutuante. O recorde anterior era de US$ 23,354 bilhões, em março de 2020, durante a pandemia de covid-19.
Apenas as vendas em leilões à vista, iniciadas em 12 de dezembro, atingiram US$ 16,76 bilhões, o equivalente a 4,62% das reservas internacionais do País. Foi a quarta maior venda proporcional em um único mês, atrás de abril de 1999 (9,66%), março de 1999 (5,62%) e setembro de 2002 (5,20%).
“O BC fez o papel de dar ao mercado a liquidez necessária em um momento de muita demanda por moeda, com remessas enormes de multinacionais. Não tem como objetivo defender nenhuma taxa explicitamente, o câmbio é flutuante. Mas foram intervenções importantes para suprir a liquidez necessário no fim do ano”, afirma Gala, do Master, acrescentando que, além da atuação do BC, os leilões de compra de títulos do Tesouro contribuíram para acalmar o mercado nos últimos dias.
Juros
Os juros fecharam a sessão em queda firme, após terem subido mais de 30 pontos-base na primeira etapa, mas ainda acumularam alta na semana. A redução dos prêmios de risco foi atribuída a um combo de fatores, que inclui a aprovação das pautas fiscais no Congresso e a atuação conjunta do Banco Central e do Tesouro nos mercados de câmbio e títulos. A cereja do bolo veio com a sinalização do presidente Luiz Inácio Lula da Silva de que dará autonomia ao trabalho do Banco Central sob o comando de Gabriel Galípolo.
A taxa do contrato de Depósito Interfinanceiro (DI) para janeiro de 2026 encerrou em 14,94%, de 15,07% ontem no ajuste, e a do DI para janeiro de 2027 caiu de 15,31% para 15,10%. O DI para janeiro de 2029 terminou com taxa de 14,68%, de 14,96%.
Apesar do alívio nos prêmios de risco hoje, os DIs seguem precificando Selic terminal acima de 16%. Segundo o estrategista-chefe e sócio da EPS Investimentos, Luciano Rostagno, projetavam taxa de 16,22% no fim do ciclo a meados da tarde. Para o Copom de janeiro, a precificação era de 142 pontos-base, cerca de 30% de chance de alta de 125 pontos e 70% de probabilidade de 150 pontos, “mesmo com a queda do dólar e do reforço do guidance do BC”, afirmou Rostagno. Ontem, Galípolo afirmou que a barra para mudança na sinalização do BC é alta.
A primeira parte do dia foi difícil, diante da decepção dos investidores com a desidratação das propostas fiscais aprovadas pelo Congresso. Analistas estimam que as mudanças reduziram o potencial de economia do pacote entre R$ 10 bilhões e R$ 20 bilhões, sendo que ninguém já comprava a ideia inicial do governo de economia de R$ 70 bilhões. O mercado debatia ainda o risco de o País entrar em dominância fiscal.
Na sequência, a curva começou a melhorar depois que o Senado finalizou o pacote, ao aprovar o projeto que limita o crescimento real do salário mínimo ao máximo permitido pelo arcabouço, de 2,5% ao ano, e estabelece mudanças no Benefício de Prestação Continuada (BPC). Além disso, passou o projeto que alonga o prazo para instituições financeiras deduzirem perdas decorrentes de inadimplência da base de cálculo do IRPJ. A medida vai gerar uma arrecadação adicional de R$ 16,8 bilhões em 2025.
Mas as mínimas do dia vieram com Lula indicando que Galípolo terá carta branca para trabalhar quando assumir o BC em janeiro. As taxas longas aceleraram o recuo para mais de 40 pontos-base, já operando abaixo dos 15%.
Em um vídeo publicado ao lado de Galípolo durante almoço com ministros, Lula disse que ele será o chefe da autarquia com “mais autonomia” que a instituição já teve e que assumirá o cargo por uma “relação de confiança minha e de toda a equipe do governo”. “Quero que você saiba que jamais, jamais, haverá da parte da Presidência qualquer interferência no trabalho que você tem que fazer no Banco Central.”
O mercado gostou do que chamou de “tentativa do governo de retomar a credibilidade”, numa aparente mudança de postura em relação a Roberto Campos Neto, que deixou hoje a instituição. Os últimos meses de Campos Neto à frente do BC foram marcados por pesadas críticas de Lula ao nível de juros, mas, agora, a impressão é de que Galípolo terá liberdade. “De certa maneira, também alimenta a esperança de que o governo possa apresentar novas medidas fiscais que facilitem o trabalho do BC”, afirmou Rostagno.
Segundo apurou o Broadcast, no almoço de hoje, Lula teria indicado aos ministros querer a “pacificação” com o mercado financeiro e que entende os juros elevados. Teria dito ainda que “o governo não pode gastar mais do que arrecada”.
A nova atuação conjunta entre o BC e Tesouro também ajudou a tirar pressão da curva de juros, como já havia ocorrido ontem. O BC vendeu US$ 3 bilhões em moeda à vista e US$ 4 bilhões em linha com compromisso de recompra, enquanto o Tesouro recomprou hoje 1,9 milhão de NTN-F e 3,4 milhões de LTN.