Após três sessões no negativo, o Ibovespa obteve leve recuperação, em alta de 0,31%, aos 125.534,07 pontos, enquanto o dólar interrompeu nesta quarta-feira, 5, uma sequência de 12 sessões em baixa frente ao real. O bom desempenho de Vale (ON +0,54%) e em especial dos grandes bancos, tendo Santander (Unit +6,20%) à frente após a divulgação de balanço trimestral, resultou em ganhos para o índice da B3, em dia ainda negativo para Petrobras (ON -1,01%, PN -0,73%). O giro financeiro desta quarta-feira foi a R$ 19,6 bilhões. Na semana e no mês, o Ibovespa acumula perda de 0,48%, após ganho de 4,86% em janeiro, que foi o primeiro desde agosto.
Além de Santander, destaque para Embraer (+15,51%), Auren Energia (+2,96%) e SLC Agrícola (+2,72%) na ponta ganhadora do Ibovespa na sessão. No lado oposto, Azul (-8,87%), Raízen (-7,65%), Vamos (-5,82%) e CVC (-5,21%). “O resultado do Santander surpreendeu, e as ações dos demais bancos reagiram à expectativa de que 2024 inteiro, principalmente o último trimestre, trará resultados muito bons para o setor, com efeitos para 2025 – lembrando que o segmento financeiro é o de maior relevância no Ibovespa”, diz Matheus Lima, analista e sócio da Top Gain. Dessa forma, destaque também para outros grandes nomes, como Itaú (PN +1,52%) e Bradesco (ON +1,46%, PN +2,33%), neste meio de semana.
“Alta do Ibovespa nada vibrante, mas tinha havido certo exagero na correção do fim do ano passado. De qualquer forma, não dá para comemorar dólar a R$ 5,80, e ainda há prêmio na curva de juros. Mercado americano está em momento diferente do brasileiro, no meio de uma boa temporada de resultados. Ruídos sobre o governo americano ainda persistem: é preciso se acostumar a um patamar de volatilidade mais alto”, diz Matheus Spiess, analista da Empiricus Research. “Os mesmos problemas do fim do ano passado incerteza sobre situação fiscal doméstica e sobre a política tarifária dos Estados Unidos continuam no ambiente.”
“Falas recentes de Trump ainda causam polêmica e geram cautela, especialmente com relação à China. Apesar do desempenho do câmbio hoje, ainda há fluxo de entrada de recursos no Brasil – e um ajuste natural após uma sequência longa de queda para a moeda americana frente ao real”, diz Charo Alves, especialista da Valor Investimentos. Ele menciona que a incerteza em torno de Trump e da política econômica americana contribui para alguma diversificação de risco “Ex-EUA”.
Ponto focal das atenções globais nas últimas semanas, a abordagem de Trump para a política comercial tem sido neste início de segundo mandato na Casa Branca pautada por avanços e recuos, o que traz um grau maior de volatilidade para a precificação de ativos como o câmbio, a curva de juros e as ações em Bolsa. De forma ainda mais aparente do que no primeiro mandato, Trump é visto como um negociador que tenta trazer para a política táticas mais comuns ao meio empresarial – especialmente a de elevar a barra, ou bastão, antes de iniciar uma barganha.
De ontem para hoje, Trump voltou a surpreender, ao tratar a Faixa de Gaza como uma propriedade, e não um território, que poderia passar unilateralmente ao controle dos Estados Unidos para que seja reconstruída pela atuação direta americana – o que incluiria o afastamento dos palestinos, segundo proposto por Trump, para países vizinhos, como Egito e Jordânia. O mundo árabe, com os sauditas à frente, continua a defender a solução de dois estados, Israel e Palestina, e não aceita a remoção dos palestinos da Faixa de Gaza, uma população de 2 milhões.
Analistas observam, contudo, que Trump tem lançado ideias para logo em seguida corrigir o discurso, como fez recentemente com as tarifas que havia anunciado para Canadá e México – iniciativa quase instantaneamente revogada a partir de entendimento bilateral entre as partes, que acertaram trégua de um mês. Mas entre idas e vindas, o comportamento do presidente americano produz ruído, que traz variações maiores de preços aos ativos, sejam o dólar, a curva de juros ou ações.
“Essa gangorra da retórica – do faz, não faz – continua a trazer volatilidade, depois de Trump ter iniciado o governo de forma mais light, o que animou em um primeiro momento os ativos, sem se confirmar a princípio a esperada tarifação da China pelos Estados Unidos”, diz Alison Correia, analista e sócio-fundador da Dom Investimentos, destacando que o presidente americano chegou a ameaçar a China com tarifas de até 60% – o que “por enquanto não aconteceu”. “Conforme ele vai aumentando o tom, o clima fica mais tenso e os preços dos ativos financeiros trabalham então de forma mais negativa”, acrescenta.
No entanto, à medida que a estratégia do bate e volta vai sendo reiterada, um grau maior de ceticismo começa a prevalecer no mercado – o que se refletiu, por exemplo, nos preços do petróleo, que caíram cerca de 2% na sessão em Londres e Nova York, mesmo com a possibilidade de retomada da tensão no Oriente Médio e de comprometimento do acordo de troca de prisioneiros entre Israel e Hamas a partir dos comentários de Trump – que envolveram, também, a proposta de recorrer a uma política de “pressão máxima” sobre o Irã, importante produtor.
Contudo, o que predominou na sessão do petróleo foram os fundamentos, não o ruído: o dado oficial de que os estoques da commodity nos Estados Unidos aumentaram em 8,66 milhões de barris na semana passada, em variação bem acima do esperado para o intervalo.
Dólar
Após recuar nos últimos doze pregões, em que acumulou desvalorização de 4,83% e registrou a maior sequência de baixa da história do Plano Real, o dólar à vista encerrou a sessão desta quarta-feira, 5, em alta moderada. Segundo operadores, o recuo dos preços das commodities, em especial do petróleo, e a perda de fôlego das divisas latino-americanas abriram espaço para ajustes técnicos e movimentos de realização de lucros no mercado doméstico.
Com mínima a R$ 5,7513 e máxima a R$ 5,8179, o dólar à vista fechou cotado a R$ 5,7942, avanço de 0,38%, depois de tocar pontualmente terreno negativo no meio da tarde. Apesar da alta de hoje, a moeda americana ainda recua na semana (0,73%). No ano, o dólar acumula desvalorização de 6,25%, após ter encerrado 2024 com ganhos de 27,34%.
“Podemos dizer que houve uma correção após 12 pregões de recuo da moeda. Não vejo uma reversão de tendência, que deve continuar sendo de queda”, afirma o head de renda variável da Veedha Investimentos, Rodrigo Moliterno, acrescentando que o mercado monitorou a apresentação, pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, de documento de 25 prioridades para o biênio 2025/2026 ao novo presidente da Câmara, Hugo Mota (Republicanos-PB). “Isso chegou a provocar alguma volatilidade durante o pregão, até por conta da proposta do Imposto de Renda”.
Uma das prioridades de Haddad é a chamada reforma da renda, com a proposta de isenção de IR para quem ganha até R$ 5 mil mensais. Como contrapartida para perda de receitas, o governo pretende aumentar o imposto para faixas maiores de renda, o que é visto com ceticismo pelos investidores. Analistas ouvidos pelo Broadcast nos últimos dias ponderam que a questão do IR tem potencial de provocar solavancos no dólar.
Lá fora, o índice DXY – termômetro do comportamento da moeda americana em relação a uma cesta de seis divisas fortes – recuou, operando abaixo da alinha dos 107,500 no fim da tarde, com perdas demais de 1% do dólar em relação ao iene, em meio ao aumento das apostas em alta de juros pelo Banco do Japão (BoJ).
Apesar da criação de vagas acima das expectativas no setor privado dos EUA em janeiro, segundo pesquisa ADP, os sinais são de perda de fôlego da atividade econômica – o que abriria espaço para queda dos juros ainda neste ano. O índice de gerente de compras (PMI) dos EUA, calculado pelo Instituto para Gestão da Oferta (ISM), caiu de 54,1 em dezembro para 52,8 em janeiro, abaixo da estimativas (54).
Embora mostre chances maiores de que o Federal Reserve promova um corte acumulado de 50 pontos-base na taxa básica americana neste ano, ferramenta do CME Group apontou aumento da possibilidade de uma redução de 75 pontos-base após dados do setor de serviços. As atenções dos investidores se voltam agora para a divulgação, na sexta-feira, 7, do relatório mensal de emprego (payroll) de janeiro, além do desenrolar da novela da adoção de tarifas de importação do governo Trump.
Analistas não descartam a possibilidade de que haja uma suspensão de tarifa adicional de 10% a produtos chineses, nos moldes doas negociações envolvendo Canadá e México, que conseguiram um adiamento da imposição de tarifas após oferecer contrapartidas aos EUA, como maior controle da fronteira e combate ao tráfico de drogas. Há expectativa de uma eventual conversa telefônica entre Trump e o líder chinês, Xi Jinping, para tratar da questão.
O gerente de câmbio da Treviso Corretora, Reginaldo Galhardo, observa que as ameaças de “tarifaço” por parte de Trump, com adoção de tarifas universais, não se confirmaram, dando lugar a negociações bilaterais com os principais parceiros comerciais dos EUA.
“Isso trouxe alívio do mercado, que correu atrás de ‘galinhas mortas’ como os ativos domésticos. O real carregava uma desvalorização de quase 30% na virada do ano e investidores aproveitaram o cenário externo mais clamo para zerar posições vendidas na moeda brasileira”, afirma Galhardo, para quem a taxa de juros local elevada contribui para a entrada de fluxo estrangeiro, em meio a ausência de ruídos políticos em Brasília.
Juros
Os juros futuros aceleraram a alta no período da tarde, com o mercado ajustando suas posições na véspera do leilão de prefixados do Tesouro. O mercado também reavaliou o dado da produção industrial divulgado pela manhã que, por ter vindo acima do esperado, coloca em dúvida a tese de uma desaceleração econômica mais forte, a qual respaldaria cortes de juros mais cedo. Operadores apontam ainda que há espaço para essa correção – que ocorre no mesmo dia em que o dólar avança, após 12 pregões em queda -, considerando o fechamento expressivo da curva de juros recentemente.
A taxa do contrato de depósito interfinanceiro (DI) para janeiro de 2026 subiu para 14,965%, de 14,921% no ajuste anterior. O DI para janeiro de 2027 avançou a 15,020%, de 14,879%, e o para janeiro de 2029 subiu para 14,645%, de 14,454% no ajuste de ontem.
Gustavo Okuyama, gestor de renda fixa da Porto Asset, afirma que a abertura dos juros longos ocorre por ajustes antes do leilão de venda de títulos prefixados do Tesouro, nesta quinta-feira. “O investidor tem receio de que venha um lote grande e que o Tesouro pague o prêmio, então quem está posicionado na queda de juros acaba saindo dessas posições, ou tenta se proteger. Isso faz com que o juro longo abra”, explica.
A alta também se deu nas taxas de DIs de curto prazo, com o mercado reavaliando a produção industrial, que veio acima do esperado: caiu 0,3% em dezembro ante novembro, na série com ajuste sazonal, perto do teto das estimativas, que iam de -2,2% a -0,1%.
“Com essa surpresa, o mercado começa a duvidar da desaceleração mais rápida da atividade, assim diminuindo a expectativa de que o Comitê de Política Monetária inicie corte de juros mais cedo”, complementa o gestor de renda fixa da Porto Asset.
O economista Julio Hegedus Netto, da Confiance Tec, destaca ainda que havia espaço para correção tanto no dólar (que fechou em alta de 0,38%, a R$ 5,7942) quanto nos juros futuros, após quedas recentes.
Para Netto, preocupa ainda a guerra de tarifas, que pode causar desaceleração da atividade econômica dos Estados Unidos e aumento da inflação global. “É esperado que o impacto da elevação de tarifas sobre os custos de produção seja repassado aos preços ao consumidor. Acabaremos sofrendo por tabela se houver aperto monetário nos EUA”, analisa.