Sem sucesso, o Ibovespa iniciou a semana em busca de mitigação de danos, à medida que 2024 se aproxima do fim e a pressão no câmbio, bem como na curva de juros doméstica, não dá trégua nesta transição de ano, de pouco alívio na incerteza fiscal. Com giro a R$ 20,6 bilhões na sessão, o índice da B3 oscilou entre mínima de 120.617,32 e máxima de 122.104,68 correspondente ao nível de abertura.
Ao fim, mostrava baixa de 1,09%, aos 120.766,57 pontos, acumulando perda de 3,90% no mês e de 10,00% no ano. Assim, segue a caminho de confirmar a sua pior performance desde 2021 – um ano ainda de pandemia em que cedeu quase 12%, e que havia sido, também, o pior para Bolsa brasileira desde 2015. O nível de fechamento desta segunda-feira foi o menor desde 20 de junho, então aos 120,4 mil pontos.
Na máxima de hoje, o dólar à vista foi negociado a R$ 6,2010 e, no fechamento, ainda mostrava alta de 1,86%, a R$ 6,1851. Entre os papéis de maior peso e liquidez na B3, apenas Vale ON (+0,42%) e Petrobras (ON +0,76%, na máxima do dia no fechamento; PN +0,03%) mereceram destaque ainda que moderado, em sessão na qual o recuo nas ações de grandes bancos chegou a 3,09% (Santander Unit) no fechamento e atingiu 1,94% (Itaú PN) na principal do segmento.
Na ponta ganhadora do Ibovespa nesta véspera de pausa para o Natal, Hypera (+3,32%), Suzano (+2,72%) e IRB (+2,42%). No lado oposto, destaque para a realização de lucros em Automob (-19,05%), que estreou muito bem na semana passada e hoje puxou a corrente de perdas, à frente de Azul (-9,34%) e de Brava (-7,67%). Dos 87 papéis da carteira Ibovespa, apenas 13 conseguiram fechar o dia com ganhos.
“Nessas últimas sessões do ano, o volume tende a cair com a série de feriados, de Natal e Ano Novo, o que vale para o exterior também. Espera-se então menos volatilidade, considerando que ainda há muita incerteza no cenário, o que torna os investidores mais defensivos”, diz Felipe Moura, analista da Finacap.
Ele acrescenta que o mercado tende a se manter nessa “toada” em direção do fechamento de 2024. “Todo mundo ainda com as barbas de molho”, e com o noticiário também se esvaziando perto do fim do ano, o que dificulta a orientação dos negócios. “Entrando janeiro sem definição clara sobre como as classes de ativos se comportarão: é um mês no qual os gestores de carteira montam os planejamentos estratégicos para o ano. Vai ser agitado e interessante. Houve uma deterioração muito rápida, e janeiro tende a ser de grande movimentação, seja para tomar risco ou para evitá-lo ainda mais”, observa o analista.
“O ano chega ao fim com muita aversão a risco. Em questão de um mês muita coisa mudou com relação a cenário para Selic e perspectiva para inflação. Janeiro vai ser bem chacoalhado com relação aos movimentos de alocação de capital”, diz.
Para Christian Iarussi, sócio da The Hill Capital, de certa forma “o avanço do pacote fiscal no Congresso foi bem recebido, mas a desidratação das medidas gera incerteza sobre a capacidade do governo de cumprir metas fiscais, o que mantém o mercado cauteloso”. Ele acrescenta que tende a prevalecer um viés mais “conservador” entre os investidores neste fechamento de ano, refletindo as incertezas fiscais e o esvaziamento dos negócios, sem muitos catalisadores à disposição nesta reta de chegada.
Dólar
Após dois pregões seguidos de baixa, o dólar à vista voltou a subir com força nesta segunda-feira, 23, e encerrou na casa de R$ 6,18, no segundo maior valor nominal de fechamento da história. O Banco Central, que na semana passada interveio pesadamente no mercado cambial, desta vez não atuou, limitando-se à rolagem programada de swaps cambiais tradicionais.
Em dia de fortalecimento global da moeda americana no exterior e de fluxo de saída de recursos típica de fim de ano, o real apresentou o pior desempenho entre divisas emergentes. Operadores atribuem a fraqueza da moeda brasileira ao desconforto com o quadro fiscal e à nova rodada de piora das expectativas de inflação no Boletim Focus.
A avaliação predominante é a de que a desidratação do pacote de contenção de gastos aprovado pelo Congresso coloca em risco o alcance das metas fiscais pelos próximos dois anos, o que faz com que a taxa de câmbio carregue prêmios de risco ainda elevados.
Embora o presidente Luiz Inácio Lula da Silva tenha adotado um tom mais moderado no fim da semana passada, reforçando a autonomia do Banco Central e a busca pela responsabilidade fiscal, há dúvidas se o ministério da Fazenda será capaz emplacar novas medidas de austeridade. Há receio também de dificuldades de articulação no Congresso após o ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal, voltar a suspender distribuição de emendas de comissão previstas até o fim de ano.
Com máxima a R$ 6,2010 à tarde, o dólar à vista terminou a sessão em alta de 1,86%, cotado a R$ 6,1851 – valor inferior apenas ao do fechamento da última quarta-feira, 18 (R$ 6,2657). Naquela ocasião, além da crise de confiança local, houve uma disparada da moeda americana no exterior, após o Federal Reserve sinalizar que há menos espaço para reduzir os juros em 2025. Em dezembro, o dólar já sobe 3,06%, o que leva a valorização no ano a 27,44%.
O gerente de câmbio da Treviso Corretora, Reginaldo Galhardo, observa que ainda há fluxo de saída de fim de ano de empresas multinacionais e fundos, embora menor que o verificado na semana passada, em um ambiente marcado por liquidez reduzida às vésperas do feriado de Natal. Por ora, Galhardo trabalha com dólar na faixa de R$ 6,10 e R$ 6,30.
“O investidor estrangeiro está com o pé atrás e não se desfaz de suas posições cambiais defensivas. Enquanto perdurarem as dúvidas com o risco fiscal, não há como visualizar um cenário mais favorável ao Brasil no curto prazo”, diz Galhardo. “O BC entrou quando percebeu que havia distorções no mercado. Mas ele não vai entrar agora com uma tendência de dólar forte lá fora”.
Em dezembro, o BC injetou US$ 27,760 bilhões no mercado. Apenas as vendas em leilões à vista, iniciadas em 12 de dezembro, superaram US$ 16,76 bilhões. Reportagem de Cícero Cotrim e Célia Froufe, do Broadcast, mostra que a saída de dólares do Brasil entre os dias 2 e 19 de dezembro, de US$ 14,699 bilhões, foi a maior para o período na série histórica do BC, iniciada em 2008. Considerando exatamente os primeiros 19 dias do mês, a maior saída até agora, de US$ 12,651 bilhões, havia sido registrada em dezembro de 2019.
Entre as explicações para a magnitude do fluxo negativo figuram três hipóteses: dividendos maiores em razão do crescimento forte da economia neste ano, receio de aumento da tributação dos mais ricos (que seria utilizada para compensar isenção de IR para quem recebe até R$ 5 mil) e aumento de envio ao exterior por pessoas físicas.
Juros
Os juros futuros fecharam com alta expressiva a segunda-feira, 23, cravada entre o fim de semana e o feriado de Natal, devolvendo toda a queda registrada na sexta-feira. Pesaram sobre as taxas os receios sobre possíveis impactos da decisão do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Flávio Dino sobre o cenário fiscal, o avanço do rendimento dos Treasuries e do dólar, além da piora das medianas das estimativas na pesquisa Focus. O efeito desse mix de fatores foi potencializado pela liquidez reduzida.
A taxa do contrato de Depósito Interfinanceiro (DI) para janeiro de 2026 encerrou em 15,22%, de 14,91% no ajuste anterior. A taxa do DI para janeiro de 2029 subiu de 14,56% para 15,05%. A do DI para janeiro de 2027 terminou em 15,47% (de 14,99% na sexta-feira). Este vencimento hoje foi o mais negociado, com 370 mil contratos, muito abaixo da média diária de 706 mil nos últimos 30 dias.
Boa parte das taxas retornou à casa dos 15%, mostrando avanço entre 30 e 45 pontos-base durante a sessão. O mercado havia encerrado a semana passada “mais leve” depois do presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmar que o futuro presidente do Banco Central, Gabriel Galípolo, terá autonomia de gestão e que quer pacificação com o mercado financeiro. Nesta segunda-feira, porém, a curva voltou a estressar.
O Boletim Focus trouxe nova deterioração nas projeções de IPCA, mesmo com aumento também nas expectativas para a Selic. A mediana para a inflação suavizada dos próximos 12 meses, que passará a balizar a meta de inflação contínua de 3%, passou de 4,68% para 4,89%. A mediana para 2025 disparou quase 25 pontos, de 4,60% para 4,84%. Para a Selic, a expectativa para o fim do ciclo de aperto monetário subiu de 14,25% para 15%.
Pelo lado fiscal, na esteira do pacote de corte de despesas aprovado no Congresso com algum grau de desidratação, há receios quanto aos impactos de decisão de Flávio Dino de voltar a suspender a distribuição de emendas de comissão – R$ 4,2 bilhões estavam previstos para ser pagos até o fim do ano. Tais emendas têm sido consideradas como moeda de troca para matérias de interesse do Executivo no Congresso, que depois do recesso de janeiro entra na fase de eleição para presidentes da Câmara e Senado. Os atritos entre Judiciário e Legislativo podem acabar comprometendo a viabilidade de eventuais novas medidas que espera-se que o governo vá encaminhar para consolidar o ajuste fiscal.
O exterior não deu trégua, apesar do acordo para elevar o teto da dívida e evitar o shutdown da máquina nos EUA. Os rendimentos dos Treasuries subiram e, no caso da T-Note de dez anos, flertaram com a marca de 4,60%. Apesar de indicadores de atividade mais fracos do que o esperado, o quadro de apostas segue apontando quase consenso na manutenção do juro na reunião de janeiro. O dólar também se fortaleceu ante as demais moedas, com reflexos no câmbio local. A moeda americana voltou a tocar R$ 6,20 nas máximas do dia, mas fechou nos R$ 6,18.