Cidades

Homofobia ainda impera em Mato Grosso

Foto: Ahmad Jarrah / Circuito MT

Mato Grosso é um dos muitos estados que ainda não possuem conselho específico para tratar sobre os temas ligados ao combate à descriminação e violência contra lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais (LGBT). Em 2013, levando em consideração os homicídios motivados pela homofobia, Mato Grosso foi considerado o quinto estado mais violento em números gerais e o segundo no total de homicídios por milhão de habitantes.

Segundo relatório divulgado em 2014 pelo Grupo Gay da Bahia (GGB), em todo o País foram registrados 312 mortes, sendo que 40% dos homicídios ocorreram na região Nordeste. Já no Centro-Oeste, Mato Grosso respondeu por quase metade das 35 mortes, liderando com folga o ranking regional da homofobia. Cuiabá foi considerada a capital mais perigosa do País, registrando, proporcionalmente, o maior número de assassinatos de LGBT’s, com dez casos.

Entre os 26 Estados e o Distrito Federal, apenas Alagoas, Bahia, Goiás, Mato Grosso do Sul, Pará, Paraíba, Paraná, Pernambuco, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul possuem conselhos específicos para debater o tema. Em outros estados, como Mato Grosso, a comunidade LGBT é atendida no Centro de Referência em Direitos Humanos, ligado à Secretaria de Estado de Justiça e Direitos Humanos (Sejudh). 

O Governo de Mato Grosso até tentou mudar esse quadro e criar o Conselho Estadual para combater a discriminação e promover ações e direitos a Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais e Transgêneros (CELGBT). A iniciativa foi através de decreto, que acabou sendo revogado na Assembleia Legislativa de Mato Grosso (AL/MT).

Os efeitos da criação do decreto 253 foram anulados por meio de decreto legislativo assinado pelos deputados Emanuel Pinheiro (PR), Coronel Taborelli (PV), Sebastião Rezende (PR) e Oscar Bezerra (PSB), e aprovado por unanimidade na sessão ordinária do dia 20 de outubro.

A justificativa dos deputados é que o conselho, por ser vinculado a uma secretaria estadual – no caso, a Sejudh – que foi criada por lei, deveria também ter sido votado e aprovado pelos deputados estaduais.

“Ele não pode criar um conselho sem a matéria passar pela Assembleia Legislativa. Eu não estou entrando no mérito da matéria. Acredito que precisamos discutir o assunto e todos os avanços nos direitos civis são importantes. Mas que se faça da maneira certa, que envie a matéria para cá”, explicou Emanuel Pinheiro, durante a sessão que aprovou, em primeira votação, a revogação do decreto, no dia 7 de outubro.

Mas nem todos os parlamentares se apoiaram sobre a justificativa da legitimidade de criação do Conselho pelo Executivo Estadual. O deputado Sebastião Rezende defendeu a revogação do decreto por motivos religiosos. Para o parlamentar, o CELGBT utilizaria recursos públicos para fazer “apologia à homossexualidade”.

“Vão possibilitar, com recursos públicos, a apologia à homossexualidade. Vai possibilitar que esse segmento possa ferir princípios basilares de família”, declarou o parlamentar, durante discurso na Tribuna da Casa de Leis.

A sessão ordinária em que os parlamentares aprovaram o fim do Conselho, que não chegou a funcionar, foi acompanhada por dezenas de populares católicos e evangélicos, que pressionavam para que os deputados não permitissem que o Estado possuísse um Conselho específico para a criação de políticas públicas em prol da qualidade de vida e dignidade humana da comunidade LGBT. O discurso dos deputados, que apoiavam a criação do conselho, arrancou vaias dos religiosos.

“Não vejo por que a Igreja fazer uma movimentação contra a diminuição da violência, porque é este o objetivo do conselho. Não estamos discutindo questões familiares, mas, sim, políticas públicas. O Estado é um dos mais violentos contra os homossexuais, e não vejo como a diminuição dessa violência possa ser ruim e prejudicar a vida de alguém”, declarou a deputada Janaína Riva (PSD).

A deputada ainda lembrou que já existem outros conselhos criados no Governo, como o da mulher, de dependentes químicos e de negros.

“Quando se cria um conselho da mulher, não é para privilégios, mas para criar uma condição de igualdade de direitos. Quando se pegam os dados brasileiros e se vê que a homofobia gera um assassinato a cada 28 horas, que irmã estou sendo quando vou à igreja, sento ao lado de um LGBT, o abraço, dou paz de Cristo, mas não estou atrás de ao menos minimizar esse sofrimento?”, questionou.

O líder do governo na AL, deputado Wilson Santos (PSDB), afirmou que o assunto deve ficar para o ano que vem e deverá seguir para Assembleia como projeto de lei.

“O que pegou foi que no decreto do governador há uma previsão do conselho, assim como os outros já criados, em ter acesso a recursos financeiros públicos. Então essa é a porta de entrada que senti que dá para reconstruir lá na frente”, explicou.

Papel do Estado no combate à homofobia – O governador Pedro Taques (PSDB), que tinha como plano de governo em sua eleição, a criação do Conselho LGBT, ainda avalia qual medida tomar em relação à derrubada do decreto.

“É direito da Assembleia e o Estado vai avaliar o que deve ser feito. Ainda não vi o decreto [da AL/MT], mas vamos dar uma analisada”, afirmou o governador ao Circuito Mato Grosso, na segunda-feira (26.10).

O conselho foi criado por meio do decreto Nº 253, de 21 de setembro de 2015. Ele seria de natureza consultiva e deliberativa e integraria a estrutura básica da Secretaria de Justiça e Direitos Humanos (Sejudh). 

Para criar o conselho, o governador considerou o artigo 66, incisos III e V, da Constituição Estadual e artigo 5° da Constituição Federal que diz que “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza”. 

Conforme o decreto, o Conselho, caso estivesse funcionando, teria o papel de formular e propor diretrizes de ações governamentais, em âmbito estadual, voltadas para o combate à discriminação e defesa dos direitos do público LGBT.  

Conselho Municipal Cuiabá

Em Mato Grosso, Cuiabá foi o primeiro – e ainda é o único – município a possuir um conselho municipal LGBT. 

O Conselho de Atenção à Diversidade Sexual (CMADS) foi instituído no ano passado para debater e criar políticas públicas em defesa dos direitos de lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais. Ao todo, são 15 membros que integram o conselho, sendo representantes do Poder Público, OAB, Ministério Público (MPE/MT), instituições civis e outros órgãos.

O presidente do CMADS, o colunista social Valdomiro Arruda, explica que, além de cumprir o papel de discutir e propor políticas públicas que combatam a violência e melhore a vida do grupo LGBT, o conselho também orienta a comunidade sobre questões diversas, como as ligadas à saúde, por exemplo. 

Entre as ações realizadas neste ano, ele destaca o seminário "(RE) Significado Saberes e Práticas sobre Diversidade Sexual e de Gênero", elaborado em conjunto com o Grupo Livre-Mente. O debate da agenda do Movimento LGBT antecedeu a 13º edição da Parada da Diversidade Sexual, que reuniu mais de 4 mil pessoas no centro da Capital, em setembro deste ano.

Valdomiro viu com tristeza e preocupação a revogação do Conselho Estadual, que ampliaria as políticas públicas voltadas à diversidade sexual e de gênero.

“O Conselho é para trabalhar políticas públicas para esta população LGBT. Não cria cargos, apenas espaço para que representantes governamentais e não-governamentais criem essas políticas públicas, assim como os conselhos racial e da mulher. Não sei  por que, num estado com problemas na saúde, falta de emprego e outras áreas,  os católicos e evangélicos ficam preocupados com a criação de um conselho, que só vai melhorar a vida de uma população que luta pelos seus direitos”, declarou o presidente do CMADS.

Embates Nacionais

Projetos de Leis em discussão no Congresso Nacional começam a tomar repercussão mundial. O embate entre grupos políticos conservadores com os que defendem os direitos das minorias chegou a causar preocupação na Organização das Nações Unidas (ONU) no Brasil.

Nesta semana, por meio de nota, a ONU disse estar acompanhando “com preocupação” a tramitação, no Congresso Nacional, da Proposição Legislativa que institui o Estatuto da Família (PL 6583/2013), especialmente quanto ao conceito de família e “seus impactos para o exercício dos direitos humanos”.

Citando tratados internacionais, a ONU acredita ser importante assegurar que outros arranjos familiares, além do formado por casal heteroafetivo, também sejam igualmente protegidos como parte dos esforços para eliminar a discriminação. Entre os demais arranjos, a Organização citou o unipessoal, casal com filhos, casal sem filhos, mulher/homem sem cônjuge e com filhos, casais homoafetivos com ou sem filhos.

“Negar a existência dessas composições familiares diversas, para além de violar os tratados internacionais, representa uma involução legislativa”, diz trecho da nota divulgada pela organização.

O Projeto de Lei 6583/2013 define família como a união entre homem e mulher, por meio de casamento ou união estável, e exclui a união homoafetiva. O texto também considera família o arranjo formado por apenas um dos pais e os filhos. O projeto está em tramitação desde 2013 na Câmara dos Deputados, onde está sendo analisado.

Confira detalhes da reportagem do Jornal Circuito Mato Grosso

Redação

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Reportagens realizada pelos colaboradores, em conjunto, ou com assessorias de imprensa.

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