O governo brasileiro enviou uma carta assinada pelo ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira, à revista britânica “The Economist” nesta terça-feira, 1, respondendo a um artigo que afirma que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) é “incoerente no exterior” e “impopular em casa”. O texto publicado neste domingo, 29, questiona a influência externa e a popularidade interna do petista.
O artigo se refere às críticas feitas por Lula em relação aos ataques de Israel e dos Estados Unidos contra o Irã. No dia 22 de junho, o governo brasileiro se posicionou “condenando veementemente” a ação norte-americana e afirmando que os ataques foram uma “violação da soberania do país persa e do direito internacional”.
Para a The Economist, o “presidente deveria parar de fingir que o Brasil é importante em questões de guerra na Europa ou no Oriente Médio, e se concentrar em questões mais próximas de casa”.
A revista criticou o presidente nesse sentindo afirmando que “no começo, ser membro dos Brics oferecia ao Brasil uma plataforma para exercer influência global. Hoje, isso faz com que o País pareça cada vez mais hostil ao Ocidente”.
No entendimento da revista, Lula é “incoerente” por se reunir com líderes de países orientais enquanto não demonstra esforços para estreitar laços com o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump. Segundo o artigo, isso faz do Brasil “a maior economia cujo líder não apertou a mão do presidente americano”.
O brasileiro ainda foi criticado por sua atuação com os países vizinhos: “Lula parece não estar disposto ou não ser capaz de reunir as nações latino-americanas para apresentar uma frente unida contra as deportações de imigrantes e a guerra tarifária de Trump”, escreve a The Economist.
Em defesa do governo, o embaixador Mauro Vieira diz que o Brasil não faz “tratamento à lá carte do direito internacional” e que o respeito “à autoridade moral” do chefe do Executivo brasileiro é “indiscutível”.
Além disso, na carta endereçada aos britânicos, o chanceler menciona que Lula “apresentou uma ousada proposta de taxação de bilionários que terá incomodado muitos oligarcas”.
O ministro destacou a importância dos Brics, sob a liderança de Lula, “na luta por um mundo multipolar, menos assimétrico e mais pacífico” e que “a posição do Brasil quanto aos ataques ao Irã e, sobretudo, às instalações nucleares é coerente com esses princípio”.
O texto defende ainda que Lula não foi incoerente ao condenar a invasão da Ucrânia pela Rússia, apontando a necessidade de uma resolução diplomática para o conflito.
“Lula não é popular entre os negacionistas climáticos. Em face de uma nova corrida armamentista, ele está entre os líderes que denunciam a irracionalidade de investir na destruição, em detrimento da luta contra a fome e do aquecimento global”, diz a carta de Mauro Vieira.
Veja a carta na íntegra
“Em relação ao recente artigo publicado na sua página na internet em 29 de junho, gostaria de fazer as seguintes considerações.
Poucos líderes mundiais, como o Presidente Lula, podem dizer que sustentam com a mesma coerência os quatro pilares essenciais à humanidade e ao planeta: democracia, sustentabilidade, paz e multilateralismo. Como Presidente do G20, Lula construiu um difícil consenso entre os membros, no ano passado, e ao longo do processo logrou criar uma ampla aliança global contra a fome e a pobreza. Também apresentou uma ousada proposta de taxação de bilionários que terá incomodado muitos oligarcas.
O Brasil vê o BRICS como ator incontornável na luta por um mundo multipolar, menos assimétrico e mais pacífico. Nossa presidência trabalhará para fortalecer o perfil do grupo como espaço de concertação política em favor da reforma da governança global e como esfera de cooperação em prol do desenvolvimento e da sustentabilidade.
Sob a liderança de Lula, o Brasil tornou-se um raro exemplo de solidez institucional e de defesa da democracia. Mostrou-se um parceiro confiável que respeita as regras multilaterais de comércio e oferece segurança a investidores. Como um país que não tem inimigos, o Brasil é também um coerente defensor do direito internacional e da resolução de disputas por meio da diplomacia. Não fazemos tratamento à la carte do direito internacional nem interpretações elásticas do direito de autodefesa. Lula é um eloquente defensor da Carta das Nações Unidas e das Convenções de Genebra.
A posição do Brasil quanto aos ataques ao Irã e, sobretudo, às instalações nucleares é coerente com esses princípios. Nossa condenação responde ao fato elementar de que essas ações constituem uma flagrante transgressão da Carta da ONU. Ferem, em particular, as normas da Agência Internacional de Energia Atômica, organização responsável por prevenir contaminação radioativa e desastres ambientais de larga escala.
Na gestão do Presidente Lula, o Brasil condenou a invasão da Ucrânia pela Rússia, ao mesmo tempo em que apontou a necessidade de abrir caminhos para uma resolução diplomática do conflito, ainda em 2023.
Lula não é popular entre os negacionistas climáticos. Em face de uma nova corrida armamentista, ele está entre os líderes que denunciam a irracionalidade de investir na destruição, em detrimento da luta contra a fome e do aquecimento global.
Para humanistas de todo o mundo, incluindo políticos, líderes empresariais, acadêmicos e defensores dos direitos humanos, o respeito à autoridade moral do presidente Lula é indiscutível.”