Os defensores da intervenção militar, parte da massa que tomou as ruas do País no último 15 de março, têm como alvo principal, segundo seus próprios brados, a corrupção. Olhando mais de perto para os grupos pró-intervenção – que nada mais é do que um golpe, segundo juristas -, outros "inimigos" aparecem: homossexuais, a imprensa, criminosos comuns e até o Big Brother Brasil (BBB) e a funkeira Valesca Popozuda.
Além do comunismo, frequentam a linha de tiro dos militaristas o "afrocomunismo", o Foro de São Paulo (grupo que reúne políticos de esquerda da América Latina), a presidente Dilma Rousseff (PT), os senadores Aécio Neves (PSDB) e José Serra (PSDB), os ex-presidentes Lula (PT) e Fernando Henrique Cardoso (PSDB), os presidentes do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL) e o da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), dentre outros.
"Não adianta gritar: “Fora PT”, “Fora Dilma”,. Tem que gritar: “Fora Foro de São Paulo; Fora PT; Fora Dilma; Fora Aécio; Fora FHC; Fora Serra; Fora Lula; Fora Unasul; Fora todos os partidos políticos", diz mensagem publicada nesta semana na linha do tempo do Intervenção Militar 2014.
Uma das maiores comunidades fechadas do movimento, o Intervenção tem 50 mil integrantes, e assim como as demais, é contra o impeachment de Dilma, já que a medida seria um farsa montada por PMDB, PSDB e PT. Também é contra a reforma política, considerada um golpe do PT. A reportagem procurou três de seus administradores, mas nenhum respondeu aos contatos.
Além do antipartidarismo, o elogio à violência integra a linha do tempo do Intervenção. Nesta quinta-feira (19), um participante festejava as Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar (Rota) por, segundo uma reportagem, ser a polícia que mais matou nos dois primeiros meses de 2015 no Estado de São Paulo.
"Parabéns", diz a postagem. "Obrigado por honrar as pessoas de bem da verdadeira sociedade, limpando o lixo que alguns preferem como vida!!!".
Nesta semana, mensagens de apoio ao intervencionismo e de ataques a políticos dividiam a linha do tempo com um quiz. "Pergunta à ala masculina: dessas três mulé da política, [em] qual delas você teria coragem de dar uma jebada?", diz uma postagem de um integrante publicada nesta quarta-feira (18). O texto acompanha as fotos da senadora Gleisi Hofmman Hoffmann (PT-PR) e das deputadas federais Jandira Feghali (PCdoB-RJ) e Maria do Rosário (PT-RS).
A postagem remete à afirmação do deputado federal Jair Bolsonaro (PP-RJ), feita em dezembro passado, de que não estupraria Maria do Rosário porque ela "não merece". O pepista é um dos poucos políticos retratados sob uma ótica positiva, embora sua postura esteja sendo considerada dúbia demais pelo movimento.
"Por que será que o Bolsonaro não diz uma 'palavra' em favor da intervenção militar (?)", questionou um integrante do Intervencionistas Brasil, que tem 8,6 mil participantes, na terça-feira (17).
O grupo é administrado por Rogério Prevedel. Em vídeo divulgado na página do Facebook nesta semana, o autoentitulado patriota militar da reserva não-remunerada convoca os participantes a enviar cartas aos comandantes regionais das Forças Armadas com um pedido de intervenção e a realizar um "pré-alistamento" via e-mail do grupo. A ideia é formar, segundo ele, "um grupamento de milhares e nossa tendênica é chegarmos a milhões de pessoas undas a um só ideal."
Para que o objetivo seja atingido, recomenda outro integrante do Intervencionistas, é preciso mudar a "imagem de terror" que os "esquerdistas" criaram contra os militares. O argumento é ilustrado com uma foto de dois homens fardados, cacetetes em punho, perseguindo um civil.
"Bons tempos em que bandidos, terroristas e comunistas eram tratados como bandidos, terroristas e comunistas", diz a legenda.
Procurado pela reportagem, por meio de sua conta no Facebook, Rogério Prevedel mostrou-se indócil. "Vá pedir amizade para o capeta, repórter safado, comunista do inferno", escreveu. Antes, houve outra tentativa de aproximação com o administrador da comunidade intervencionista. "Não trato com comunistas, principalmente com os 'idiotas úteis' – são todos ratos, uma casta inferior", destilou.
Afinal, conforme outra participante do Intervencionistas publicou recentemente, "no reino vermelho, a inversão de valores impera". Prova disso são o BBB, considerado cultura, e Valesca Popozuda, chamada de "pensadora contemporânea" numa prova escolar no ano passado. Ambos são alvo comuns das críticas postadas em outros grupos militaristas.
A "inversão de valores esquerdista" também é responsável pelo entendimento de que os gays são oprimidos, avalia essa participante do Intervencionistas, e a defesa do casamento homossexual, escreveu outra, é uma ferramenta para enfraquecer a família, com o objetivo de permitir ao do Foro de São Paulo implantar o comunismo no Brasil.
O iG procurou um segundo administrador do Intervencionistas. Adolf Menzel, que define o deputado Jean Wyllys (PSOL-RJ) como um "bosta" e quem vota nele, "filho da puta", desejou apenas "boa sorte com suas mentiras de hoje" à reportagem.
No Movimento para Intervenção Militar (MIM) São Paulo, que tem 6,8 mil membros, a morte de um suposto criminoso enforcado em uma janela foi postada na quinta-feira (19), junto a uma imagem de Maria do Rosário, acusada de defender ladrões.
É do MIM também a crítica ao que é definido como "afrocomunismo", que estaria configurado numa suposta proposta do governo Dilma de confiscar parte dos rendimentos dos brancos que ganham mais de R$ 9 mil para destinar os recursos aos negros.
Um dos administradores do MIM, Welcio Matozo – que foi cordato com a reportagem – alega que nem tudo o que é postado na página é de responsabilidade do grupo, e nega racismo.
"Existe [é] o PT pregando diariamente o vitimismo. Veja, eles falaram que quem estava na manifestação era a elite branca", diz Matozo. "Outra data ouvimos o [ex-presidente] Lula falar que a 'presidanta' não é um nordestino ignorante. E mais de uma vez ouvimos o Lula falar que o nordestino é feio e pobre", argumenta.
O artigo 142 da Constituição, que autorizoria uma intervenção militar segundo os partidários da ideia, não tem nenhuma menção a essa hipótese, e subordina as Forças Armadas ao Presidente da República.
Qual a diferença, então, entre a intervenção e um golpe militar? É que a Pátria, hoje, com a participação do PT, já estaria ameaçada por forças externas, inclusive haitianas.
"Está tudo às claras. O PT não faz mais questão de esconder. Forças das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farcs) treinando o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra (MST) aqui dentro do Brasil. As fronteiras abertas e 20 mil haitianos dentro do Brasil. O [líder do MST, João Pedro] Stédile falando que vai mandar o exército dele pra cima do povo", enumera Matozo. "E vocês acham que intervenção constitucional é golpe?"
Fonte: iG