Foto: Vanessa Backes
O asfalto em frente à boate Kiss, em Santa Maria, Região Central do Rio Grande do Sul, foi pintado com frases de protesto. Nesta terça-feira (9), ocorre o último dia dos trabalhos de limpeza no interior da casa noturna, atingida por incêndio que matou 242 pessoas em janeiro de 2013. No local, em roxo e branco, foram escritos os dizeres: "Já pagamos com nossas vidas. Precisa pagar mais?" e "negociata suja com agentes públicos corruptos e empresários sem escrúpulos mataram 242 jovens".
O protesto diz respeito à cobrança para que familiares não paguem a limpeza dos pertences encontrados no interior do local, além de pedir que funcionários da prefeitura municipal e do Ministério Público (MP) sejam investigados. Familiares das vítimas, que fazem parte do Movimento Santa Maria do Luto à Luta, assumiram a autoria das frases.
Os trabalhos de limpeza da boate entraram em fase final na manhã desta terça. Técnicos da equipe responsável pelo trabalho e da Fundação Estadual de Proteção Ambiental (Fepam) ainda realizam a recontagem dos pertences, documentos e chaves encontrados no prédio durante os sete dias de atuação. Logo depois, o prédio será fechado e a chave entregue a um oficial de Justiça.
Os dois últimos containers com os resíduos do local vão ser retirados à tarde. O descarte acontece em um aterro especial que fica em Capela de Santana, no Vale do Caí. A Justiça ainda não confirmou se haverá uma reconstituição da noite da tragédia após a limpeza. Sobre o futuro do prédio, o juiz Ulisses Louzada informou que a decisão só deverá ser tomada quando o processo criminal for finalizado.
O trabalho começou quase dois anos depois do incêndio. Um equipamento foi instalado para puxar o ar de dentro do prédio porque faz muito calor no interior do local. Ainda há fios de energia pendurados e restos de espuma pelo local. A queima da espuma do teto da boate, que liberou uma substância tóxica, foi apontada como uma das principais causas para o elevado número de mortes. A fachada da casa noturna foi pintada de branco para evitar que haja contaminação através da parede. A calçada também foi reformada.
Entenda
O incêndio na boate Kiss, em Santa Maria, ocorreu na madrugada do dia 27 de janeiro de 2013. A tragédia matou 242 pessoas, sendo a maioria por asfixia, e deixou mais de 630 feridos. O fogo teve início durante uma apresentação da banda Gurizada Fandangueira e se espalhou rapidamente pela casa noturna, localizada na Rua dos Andradas, 1.925.
O local tinha capacidade para 691 pessoas, mas a suspeita é que mais de 800 estivessem no interior do estabelecimento. Os principais fatores que contribuíram para a tragédia, segundo a polícia, foram: o material empregado para isolamento acústico (espuma irregular), uso de sinalizador em ambiente fechado, saída única, indício de superlotação, falhas no extintor e exaustão de ar inadequada.
Ainda estão em andamento os processos criminais contra oito réus, sendo quatro por homicídio doloso (quando há intenção de matar) e tentativa de homicídio, e os outros quatro por falso testemunho e fraude processual. Os trabalhos estão sendo conduzidos pelo juiz Ulysses Fonseca Louzada. Sete bombeiros também estão respondendo pelo incêndio na Justiça Militar. O número inicial era oito, mas um deles fez acordo e deixou de ser réu.
Entre as pessoas que respondem por homicídio doloso, na modalidade de "dolo eventual", estão os sócios da boate Kiss, Elissandro Spohr (Kiko) e Mauro Hoffmann, além de dois integrantes da banda Gurizada Fandangueira, o vocalista Marcelo de Jesus dos Santos e o funcionário Luciano Bonilha Leão. Os quatro chegaram a ser presos nos dias seguintes ao incêndio, mas a Justiça concedeu liberdade provisória a eles em maio do ano passado.
Atualmente, o processo criminal ainda está em fase de instrução. Após ouvir mais de 100 pessoas arroladas como vítimas, a Justiça está em fase de recolher depoimentos das testemunhas. As testemunhas de acusação já foram ouvidas e agora são ouvidas as testemunhas de defesa. Os réus serão os últimos a falar. Quando essa fase for finalizada, Louzada deverá fazer a pronúncia, que é considerada uma etapa intermediária do processo.
No dia 5 de dezembro de 2014, o Ministério Público (MP) denunciou 43 pessoas por crimes como falsidade ideológica, fraude processual e falso testemunho. Essas denúncias tiveram como base o inquérito policial que investigou a falsificação de assinaturas e outros documentos para permitir a abertura da boate junto à prefeitura.
Fonte: G1