O médico responsável pelo transplante multivisceral da menina Sofia Gonçalves de Lacerda, de um ano e seis meses, explicou ao G1 como será a rotina dela após a alta hospitalar, que aconteceu na quinta-feira (2). "A vida dela será cada vez mais próxima do normal", garante Vianna, que trabalha há três anos no Jackson Memorial Hospital, em Miami, nos Estados Unidos, onde foi feito o delicado procedimento.
Sofia deixou o hospital exatamente um ano depois da chegada da família aos EUA, após uma longa disputa judicial para que o governo pagasse os custos do trnasplante, de aproximadamente R$ 2 milhões.
A menina poderá ir à escola e parques, sem restrições. Porém, segundo Vianna, os pais deverão ter cuidado com a proximidade da filha com pessoas que estejam com alguma doença contagiosa. "Isso porque ela pode contrair doenças mais facilmente e demorar mais para se curar. Mas, depois de algum tempo, a vida fica praticamente normal."
Sofia nasceu com a Síndrome de Berdon, que causa a má-formação dos órgãos do sistema digestivo. Ela precisou ser submetida a uma cirurgia para o transplante dos cinco órgãos (intestino grosso e delgado [que inclui o duodeno]; fígado; pâncreas e estômago). O procedimento foi realizado no dia 10 de abril e durou quase dez horas.
Para os próximos meses, o tratamento de Sofia será focado em estimular cada vez mais a alimentação pela boca – desde que nasceu, a menina sempre recebeu nutrição parenteral. "Nós também iremos diminuir bastante o número de remédios e daqui a um ano ela deve tomar apenas dois ou três". Atualmente, a menina toma 17 medicamentos por dia.
Os outros cuidados com Sofia consistem na troca da bolsa da colostomia – bolsa externa ligada ao intestino para facilitar a eliminação das fezes –, troca de curativos do acesso que ela tem para medicamentos intravenosos e colocação de cateter de quatro em quatro horas para esvaziar a bexiga da menina.
Desenvolvimento
Ainda segundo Vianna, o transplante dos cinco órgãos de Sofia não deve ser motivo para atraso no seu desenvolvimento psicomotor. "Na verdade, desde o transplante ela tem se desenvolvimento muito rapidamente. Sentimos uma diferença muito grande nela", afirma.
Com relação à expectativa de vida, o médico explica que os dois primeiros anos pós-transplante são importantes para uma avaliação da sobrevida. Mas faz questão de citar outros pacientes que passaram pelo mesmo procedimento a que Sofia foi submetida e que já estão com 20 anos de transplante. "Depois desta marca [dois anos pós transplante] a sobrevida é muito estável."
Vianna destaca que a chance de sobrevivência dela sem o transplante era zero e que, agora, ela ganhou a chance de ter uma vida normal. "Foi um caso muito complexo, mas temos uma equipe muito bem preparada e ela [Sofia] não teve complicações cirúrgicas em nenhum momento. Mas, é claro, contamos sempre com a ajuda divina", finaliza.
Primeira 'papinha' em casa
Sofia comeu a primeira 'papinha' em casa na tarde de sexta-feira (3). A mãe da menina, Patrícia de Lacerda, enviou um vídeo ao G1 do momento em que a filha come a 'papinha'.
Nas imagens é possivel ver Sofia toda animada na hora em que vê a refeição do dia, escolhida bem no estilo brasileiro: caldinho de feijão. Depois, mostra Patrícia dando uma colherada e, como a menina ainda estranha se alimentar pela boca, ela parece recusar, mas depois aceita o alimento normalmente. "Ela comeu tudo. Nem colocou para fora", comemorou a mãe.
Entenda o caso
Devido à complexidade da síndrome de Berdon, os médicos estimaram, no dia do nascimento de Sofia, que ela não passaria de um ano de vida. Porém, a menina contrariou as expectativas da medicina e comemorou seu primeiro aniversário no dia 24 de dezembro de 2014. "Quando temos fé, o impossível não existe. Quando temos perseverança, o impossível é possível. E a Sofia continua lutando com fé", disse Patrícia ao G1, na época.
Desde que nasceu, no hospital da Universidade de Campinas (Unicamp), no interior de São Paulo, Sofia nunca esteve na casa dos pais, que moram em Votorantim (SP). Ela passou pelo Hospital Samaritano, em Sorocaba (SP) e pelo Hospital das Clínicas de São Paulo. Neste período, passou por três cirurgias, mas ainda necessitava de atendimento especializado para a síndrome rara e para o transplante multivisceral, que não era realizado no Brasil.
Por isso, uma campanha de iniciativa da própria mãe foi iniciada na internet, com o nome “Ajude a Sofia”, visando arrecar fundos para transferir a menina. Ao todo, a família arrecadou R$ 1,8 milhão. Mas os pais continuaram brigando na Justiça para que o governo brasileiro pagasse o valor da cirurgia.
Após diversas questões judiciais, o desembargador do Tribunal Regional Federal (TRF) determinou, em julho do ano passado, a transferência da menina para o Jackson Memorial Hospital, em Miami, nos Estados Unidos, especializado no tipo de procedimento ao qual Sofia precisava ser submetida, o transplante multivisceral.
Fonte: G1