Os primeiros cinco meses de 2019 em Mato Grosso são os melhores, desde 2017, na área de segurança pública. O índice dos crimes mais comuns – homicídio, roubo e furto – caíram em média de 16%, num cenário de corte de gastos pelo governo estadual. O secretário de Segurança Pública, Alexandre Bustamante, disse ao Circuito Mato Grosso que os serviços na área dependem de verba, mas há estratégias paralelas de trabalho integrado para “otimizar” os serviços nas ruas, com foco da força policial em áreas consideradas com maior potencial de criminalidade. Ele avalia que o fechamento de delegacias em 16 municípios não deve dificultar o quadro estadual de força policial. E pelos trabalhos de flanco ele diz buscar caminhos para implantação de tecnologia na segurança, ferramenta vista como necessária para colocar os serviços em nível mais sofisticados, inclusive contra as facções criminosas.
Circuito Mato Grosso: A quantidade crimes de janeiro a maio deste ano é a menor desde 2017, em Mato Grosso. Qual é a causa?
Alexandre Bustamante: Até o final de maio a gente teve uma redução sensível, na ordem de quase 16%. O que atrapalha muito a nossa estatística é a regional de Barra do Garças, que teve três homicídios em 2018 e cinco homicídios em 2019. É um aumento de mais de 60%, aí desequilibra toda a estatística. Nas regionais que causam mais transtorno, Cuiabá e Várzea Grande, houve redução de 18% e 44%, respectivamente. O trabalho está sendo bem feito, de análise criminal, de uso da inteligência para focar nos locais onde podem ocorrer homicídio, roubo e furto – os temos os três em redução. Tivemos uma operação há pouco tempo nos bairros onde houve homicídio centralizando força, foi iluminação pública, limpamos terrenos, são mudanças em locais onde possíveis roubos e homicídios podem acontecer.
CMT: Mais força policial na rua contribui para a queda?
AB: Também. Eu acho que é um conjunto. É trabalho de utilização melhor da análise criminal, que é a ferramenta que a gente tem. Alguns locais têm coincidente de homicídio, de roubo, então por que a gente não faz enfrentamento? A gente tem feito isso, e nos locais onde era comum a ocorrência de furto e roubo não é mais. É um trabalho, primeiro, policial e, segundo, com as prefeituras de iluminação pública e limpeza de terrenos baldios.
CMT: Onde começa o trabalho de inteligência da polícia?
AB: O enfretamento ao crime tem analogia com a parede, que é feita de vários tijolos. No trabalho de segurança, cada órgão é responsável por um tijolo e cada tem que colocar o seu tijolo para a parede ficar forte. Esse é o trabalho da inteligência, é compartilhamento de informações que você tem e outro, não tem. Muitas vezes, o não compartilhamento pode comprometer uma ação policial. O que a gente tem feito é um trabalho muito sério de chamar todo mundo para trabalhar junto, militares, civis, federais, Politec (Perícia Oficial e Identificação Técnica), sistema prisional. Essas informações temos conseguir otimizar o trabalho da polícia na rua, você trabalhar em foco.
CMT: Existe a opinião de que em locais com instalação de facções criminosas os crimes reduzem por ação dos próprios bandidos. Essa ideia tem reflexo em Mato Grosso?
AB: Eu não acredito que elas estejam estão organizadas assim em Mato Grosso. Acho que a presença da polícia é muito maior que a presença deles [criminosos ligados a facções]. Não tivemos enfrentamento com isso ainda no Estado [desde janeiro de 2019], dentro do sistema carcerário nós temos um controle muito grande. Eles não conseguem colocar bandeira falar “esse presídio é meu, esse presídio é daquele”. Eu sei o que o Estado consegue fazer controle muito, frente a isso a gente consegue vitórias em batalhas. Na semana passada, apreendemos celulares dentro do feijão e também um freezer cheio de celulares. Ou seja, eles não estão tão organizados que não possamos fazer enfrentamento.
CMT: Mas as facções são um assunto que preocupa ao ponto de instalação de grupo policial específico para estuda-las?
AB: É um ponto focal que precisa ser tomado de conta, mas não é a cereja do bolo. A cereja do bolo é a segurança, não o crime.
CMT: Nos últimos três anos ocorreram ações coordenadas por facções no Estado. O senhor acredita que sejam casos pontuais?
AB: A postura da atual gestão na área de segurança não abre brecha para nenhuma discussão com ninguém. O crime organizado e nem ninguém tem interesse de fazer enfrentamento com a segurança com o trabalho que vem sendo feito. Aos enfretamentos que ocorreram foram dados o devido remédio, no tempo certo. Não tem controle facções em Mato Grosso. O Estado controla hoje as ruas, as cadeias, controla tudo.
CMT: Mas, as facções atuam com controle de alguns bairros?
AB: Eu não posso negar a presença delas. É igual disco voador; eu não vou negar a existência de disco voador porque eu não vi. Eu não atuação das facções em lugar nenhum, não vi bandeira delas, e toda vez que elas têm uma provável ação a gente chega primeiro.
CMT: E como está o andamento do plano para fechamento de delegacias?
AB: A suspensão das atividades de 16 delegacias é mera e exclusivamente por falta de pessoal. Não adianta colocar apenas um policial para fazer trabalho numa cidade – na maioria das cidades onde haverá fechamento há um policial full time, 24 horas por dias, trinta dias no mês, 365 dias no ano -, que não vai trabalhar em investigação. O exemplo o qual eu pareio a isso é Polícia Federal, ela não está em todos os municípios, mas atua em todos os municípios. O trabalho da Polícia Civil é investigação, presença, é da PM (Polícia Militar). À Polícia Civil cabe investigar prevenção e repressão aos crimes. A gente que fortalecer algumas unidades com o pessoal que está saindo das 16 delegacias. A policial que não investiga e nem volta para a delegacia é guarda patrimonial, o que foge do papel constitucional da Polícia Civil.
CMT: As cidades onde as delegacias estão sendo fechadas não ficarão sem investigação?
AB: É o contrário. A partir desse momento ela passa a ter mais investigação, porque o profissional que era guarda patrimonial vai pra outra unidade, possivelmente fazer investigação naquela cidade. E outra coisa, os policiais não vão sair da regional em que eles estão. Eles vão pra cidade mais próxima para juntar força com outros colegas para investigar na cidade que estava antes.
CMT: De onde as delegacias estão saindo serão colocados mais militares nas ruas?
AB: Não, não temos quadro pra isso. Para fazer isso teríamos que fazer um novo concurso e não temos condição. A Secretaria de Segurança está limitada pela Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). O Estado não pode contratar enquanto não resolver o problema do comprometimento da folha salarial no Orçamento.
CMT: Deputados ligados à segurança pública criticaram a decisão de fechamento das delegacias. Eles não concordam com a ideia sobre atuação dos investigadores?
AB: É muito importante saber de que lado da mesa você está sentando. O delegado Claudinei é um grande amigo e quando ele delegado na regional de Rondonópolis pediu o fechamento de várias delegacias, inclusive dessas que estão sendo fechadas, com as mesmas justificativas. Agora que ele virou deputado acha que não devem ser fechadas. Depende do lado da mesa que você está sentado que você tomada uma decisão adequada. O fechamento dessas delegacias é simples. É problema de falta de segurança nem orçamentária nessas regiões. É humanamente para um policial investigar e tomar conta do prédio.
CMT: O senhor acha que a retirada de delegacias gera a percepção de vulnerabilidade?
AB: Não gera. Acontece que estamos acostumados, especialmente a municípios pequenos, que cada órgão estadual, federal que vão pra ele dá um tom de crescimento do município, e realmente ganha porque são profissionais que vão trabalhar, comprar casa, se alimentar, participar do município. A redução dá a sensação que estamos perdendo espaço no cenário estadual. A nossa intenção não é essa; é técnica. Eu não posso deixar um policial trabalhando sozinho numa unidade que tem armamento. Se chegam dois bandidos, vão tomar a arma dele e bater nele. Tem município em que ocorreu um homicídio no ano, e o número de roubo e furto é quase insignificante.
CMT: Quanto aos presídios. Em Várzea Grande havia previsão para inauguração no fim do ano passado e ainda não foi.
AB: Estamos esforço muito grande de terminar dois grandes presídios, e o de Peixoto de Azevedo, que deve entrar em obra no mês de julho, e o de Várzea Grande, que já está em obra e deve ser inauguração em setembro, mais ou menos.
CMT: Há previsão de novas unidades?
AB: Sim, temos orçamento federal para novas unidades. Mas, estamos analisando a capacidade que o Estado tem de colocar profissionais para tomar conta. Talvez, adotemos a estratégia de diminuir algumas cadeias pequenas no interior para juntar nas maiores. Por exemplo, a unidade de Várzea Grande vai ter mais de mil vagas, e cadeias no interior têm trinta, 40 vagas. O que eu faço? Tiro o pessoal dessas unidades e o centralizo nas maiores.
CMT: O aperto financeiro que o governo reclama tem travado ações da segurança?
AB: Tem um monte de processos que estão andando em paralelo à escassez do Estado. Temos uma parceria, por exemplo, para o sistema de comunicação, que hoje é analógica e qualquer um pode copiar os canais. Desde 2013, tem tentativa de convênio rodando que ficou parado um tempo e quando cheguei em janeiro consegui destravar. É convênio para fazer comunicação criptografada na faixa de fronteira na Baixada Cuiabana. Acredito que até agosto deste ano vamos ter comunicação criptografada de Comodoro a Cáceres, de Cáceres até Cuiabá.
CMT: O governo federal não vai assumir a patrulha da fronteira?
AB: Nós temos 900 km de fronteira, 700 deles são de faixa seca, e 130 homens do Gefron (Grupo Especial de Segurança na Fronteira) para tomar conta. É muito pouco. Nós temos o Pantanal abandonado, ninguém toma conta e ele faz fronteira com a Bolívia. Cadê a Marinha? Eu via intervenção do Rio de Janeiro pelo Exército, mas se a gente não tomar conta das fronteiras do Brasil não vamos resolver os problemas das favelas do Rio de Janeiro nem de São Paulo. A gente não produz cocaína no Rio ou em São Paulo, ela vem da fronteira. Não temos nenhuma fábrica de armamento pesado, ela vem da fronteira. Ou o governo federal assume a responsabilidade constitucional de tomar conta da fronteira ou nunca vamos conseguir resolver o problema do crime organizado, envolvido com droga e armamento, nos grandes centros.
CMT: Qual é o foco da sua gestão?
AB: Tecnologia e inteligência. A nossa ideia é adotar o Estado de muita tecnologia, sistema de vídeo monitoramento e comunicação, trazer a tecnologia para a presença da segurança para utilizar no trabalho de homem de rua, embarcar tecnologia com segurança – câmeras, Big Data (sistema para análise de grande volume de dados). Se conseguirmos fazer isso, vamos dar um upgrade muito grande. Nos grandes centros do mundo, o uso de câmeras é contumaz, em cada esquina tem uma câmara. No Brasil, não temos isso. Se não fizermos isso, não vamos ficar com números assustadores de criminalidade.