Dalva Campos é cadeirante há mais de 30 anos, mas antes de adquirir a deficiência ela levava uma vida normal. O que tirou os movimentos da perna de Dalva foi a artrite reumatoide (AR), doença inflamatória crônica que afeta as pequenas articulações das mãos e dos pés.
Hoje ela tem cuidadoras 24 horas por dia para ajudá-la em todas as atividades diárias. Com sua cadeira de rodas motorizada, Dalva tenta se locomover na cidade. Mas enfrenta a mesma dificuldade de outras pessoas com problema motor: a falta de acessibilidade.
“Apesar de a cadeira ser motorizada, as rampas e ruas da capital não são acessíveis para ninguém nessas condições. Se com a minha cadeira já é difícil subir as rampas, imagina para quem precisa de ajuda com a cadeira? É difícil”, pontuou.
Moradora do bairro CPA III, em Cuiabá, Dalva já deixou de ir a vários lugares e também passou por situações de bastante constrangimento, como no dia em que precisou ir a uma loja e não pôde entrar, pois só havia degraus.
“Eu não pude entrar e fui obrigada a procurar outra loja do mesmo departamento para poder realizar minhas compras. Foi muito ruim, pois a pessoa que é deficiente pensa assim: como não se lembraram da gente? Não só do cadeirante, dos idosos, de outras pessoas que têm necessidades. Então eles não estão lembrando-se da gente, estamos esquecidos nessa parte”, lamentou.
André Luiz e o pai Argentino Souza Abreu tentavam junto à AMDE que o garoto conseguisse fazer parte do projeto Buscar. Ele seria de grande ajuda, para que André passasse a ir a um curso do Senai. Não confiante, o pai disse que ainda não sabe se o filho conseguirá se profissionalizar para conseguir ser inserido no mercado de trabalho.
“A gente ouviu que nem sempre funciona direito. Eles chegam atrasados para buscá-lo e já disseram que o André não pode chegar atrasado ao curso. Como vou fazer? Eu não posso ficar levando e buscando porque também preciso trabalhar, se não como vou sustentá-lo? É difícil, sabe? Acho que ele nem vai conseguir estudar, porque não confio nesse meio de locomoção que é um direito dele”, desabafou o pai.
Quando sofreu o acidente, André Luiz tinha 16 anos e não terminou os estudos. Ele foi atropelado e ficou paraplégico. Só depois de um tempo, voltou a estudar e deve se formar este ano no ensino médio.
Seu pai relata que a família veio de Campo Grande (MS) no começo deste ano. Aqui chegando, descobriu que e a possibilidade de deixar o filho se locomover sozinho pelas ruas da capital é zero. Segundo o pai, a falta de acessibilidade gera o risco de que o filho se machuque novamente.
“Não o deixo andar sozinho aqui nunca. Não tem calçados apropriadas, nem condições de nós que andamos passar, quem dirá meu filho. E andar na rua não dá, tem muito quebra-molas, os motoristas de carros não respeitam e a falta de segurança não me deixa confiar nele sozinho aqui”, comenta.
Em busca de uma qualidade de vida melhor para o filho, Argentino conta que esperava encontrar aqui em Cuiabá uma forma de ajudar André com tratamentos médico e inseri-lo no mercado de trabalho.
“Mas vamos acabar voltando para Campo Grande. Não dá para ficar aqui se meu filho não consegue se locomover, nem se profissionalizar porque não dá para confiar no transporte que deveria levá-lo até a escola. É difícil, mas vivemos em função dele e prezamos o bem-estar do André acima de qualquer coisa”, pontuou o pai, que ainda não conseguiu acessar o serviço Buscar.
Palácio Paiaguás foi edificado sem acesso para PCDs
Inaugurado em 1975, o Palácio Paiaguás, sede do governo de Mato Grosso, ainda não dispõe de equipamento para acessibilidade de pessoas com deficiência (PCDs). Inaugurado há 42 anos, tem um único elevador, que é de uso privativo do governador.
Ao Circuito Mato Grosso, o secretário adjunto de Promoção dos Direitos da Pessoa com Deficiência, Marcione Mendes de Pinho, avalia que o palácio é, sim, um grande exemplo de inacessibilidade, mas que apesar disso têm havido transformações na área externa. Ele reconhece, no entanto, que é preciso mais: “O governador criou essa secretaria justamente para buscar caminhos e criar políticas públicas para pessoas com deficiência do Estado de Mato Grosso. E nós queremos muito mais, não é somente a área externa. A área externa nos dá acesso a chegar até a porta”.
Segundo Marcione, o próximo passo é que todos os órgãos públicos se adequem. No caso do palácio, existem banheiros acessíveis, mas o elevador para o segundo andar nunca existiu.
“A previsão é de que o projeto comece a sair do papel ainda este ano, no mais tardar em novembro a licitação do elevador deverá ser realizada. Houve toda uma questão aqui dentro por conta da parte de patrimônio, de tombamentos, porque queríamos um elevador maior para atender a oito pessoas, mas não foi possível, porque o telhado já foi tombado”, explica Marcione.
Por esse motivo, um novo projeto teve que ser feito para que um elevador menor contemplasse as pessoas com deficiência. Agora o governo se prepara para a licitação de um elevador com capacidade para duas cadeiras de rodas ou quatro pessoas em pé. Orçada em R$ 320 mil, a obra vem sendo planejada desde o início da atual gestão.
O projeto básico de execução foi aprovado depois de ser analisado e conferido pela Superintendência de Projetos e Orçamentos da Secretaria de Estado de Cidades (Secid).
Para ser realizada a licitação, resta apenas que a proposta passe pelo Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social (Condes), ligado à Secretaria de Estado de Fazenda (Sefaz).
O governo do Estado também está em vias de contratar intérpretes para pessoas com deficiência auditiva.
Obra de adequação de calçadas custou R$ 3,1 milhões
Em janeiro deste ano, o governo do Estado iniciou o projeto de adequação e acessibilidade das calçadas do Centro Político Administrativo de Cuiabá, orçado em R$ 3,140 milhões.
O projeto em questão contemplava a implantação de 15 mil metros quadrados de passeio público de 7 cm de espessura e 1,074 mil metros quadrados de 10 cm.
A parte interna da calçada tem revestimento com piso tátil, que atende pessoas com deficiência visual. Esse tipo de piso tem textura e cor que diferem do pavimento ao redor, justamente para direcionar e orientar o trajeto.
AMDE diz que não foi convidada para opinar sobre obras
Ao Circuito Mato Grosso, a presidente da Associação Mato-grossense de Deficientes, Mariley Auxiliadora de Jesus disse que a associação não foi convidada realmente para ver a questão de acessibilidade no palácio. Disse que eles sabem dos projetos, têm consciência das obras que estão sendo realizadas no CPA, mas não foram convidados a ajudar no projeto.
“Nós não fomos convidados para estar junto, para dizer se aquela forma que estão fazendo se é a ideal. Porque muitas vezes os profissionais vão lá, chamam o pessoal do Crea (isto é, quando chamam), acham que estão fazendo o melhor, mas não consultam a gente. Tem um ditado que diz: nada para nós sem nós”, pontuou.
Segundo ela, quando se fala de obras para facilitar o acesso à pessoa com deficiência é preciso chamá-los para estarem junto. “Não somos entendedores de tudo, mas podemos ajudar. Queremos ser parceiros”, argumentou Mariley.
Ela salientou que há um avanço com relação às obras, como a colocação do piso tátil e a possível instalação do elevador. Mas que além da acessibilidade física, que é um direito de todos, é preciso também mudança de atitude, principalmente por parte dos gestores.
Segundo ela, é preciso que as lideranças os escutem, escutem suas necessidades, seus pedidos, que ouçam o que eles querem, como, por exemplo, vagas no mercado de trabalho, entre outros. Só assim as pessoas com deficiência serão valorizadas como pessoas.
“A mudança de atitude é fundamental, porque quando os gestores têm mudança de atitude ela com certeza muda tudo. Desde o porteiro que recebe, até a secretária, todos estarão valorizando a pessoa com deficiência. Aí sim, não irá ficar nenhum cidadão para trás. Mas a mudança de atitude é que está esperando”.