Um escritório de advocacia de Sinop terá de pagar R$ 20 mil de compensação pelo dano moral causado por uma sócia da empresa que, usando de sua posição de chefia, agia de modo abusivo com uma trabalhadora.
Ficou comprovado que a empregada, que era estudante de Direito, era alvo frequente de comentários pejorativos, chamada de “incompetente” e “fraca” na frente dos demais advogados e de outros colegas do escritório. Ela também ouvia sempre que “não seria uma boa advogada”.
A condenação levou em conta ainda a conduta da advogada de tentar obrigar a estudante a utilizar seu e-mail particular para protocolar reclamação ao Poder Judiciário contra um magistrado e, assim, evitar que o escritório fosse vinculado às denúncias.
A Justiça do Trabalho também reconheceu o vínculo de emprego entre o escritório e a trabalhadora, na função de auxiliar administrativo. Embora contratada como estagiária, a relação não atendia as exigências da Lei de Estágio (11.788/2008), a exemplo da inexistência do termo de compromisso entre o educando e a instituição de ensino. Por outro lado, cumpria todos os requisitos para a caracterização da relação empregatícia. Nesse sentido, a empresa e a trabalhadora, inclusive, firmaram um contrato de emprego a título de experiência.
Ao julgar o caso na 1ª Vara do Trabalho de Sinop, o juiz Daniel Ricardo condenou o escritório a registrar a carteira de trabalho e a pagar o FGTS (acrescido de 40% pela dispensa sem justa causa), salário família e multa de um salário pelo atraso na quitação das verbas rescisórias, conforme prevê o artigo 477 da CLT.
Assédio moral
Conforme lembrou o magistrado, o assédio moral pressupõe conduta abusiva, repetitiva e prolongada pelo assediador, manifestada através de atos ou comportamentos hostis e que afetem negativamente na saúde psíquica e física da vítima. Elementos que ficaram demonstrados no caso da trabalhadora.
Além de tratada frequentemente aos gritos e ser alvo de comentários pejorativos, a estudante tinha seu trabalho como objeto de risadas e em tom de deboche na presença de toda a equipe, o que a levou a ser vista chorando no banheiro. Diante das provas, o juiz concluiu pela reiteração dos atos ilícitos no ambiente de trabalho, “situação esta que certamente violou seus direitos de personalidade, como intimidade, honra e dignidade” e determinou o pagamento, à trabalhadora, de R$ 20 mil de compensação por danos morais decorrentes do assédio moral.
O magistrado registrou, ainda, que a sociedade brasileira é regida por uma Constituição que preza pela dignidade da pessoa humana, honra e intimidade.
“Nesse contexto é inadmissível que comportamentos como este ainda se repitam no ambiente laboral, notadamente num escritório de advocacia, e perpetrado por uma operadora do direito, ativa na seara trabalhista, a qual se presume consciente dos seus deveres legais de respeito e preservação da dignidade de seus colaboradores”, pontuou.
Má-fé e ato contra à Justiça
O escritório foi condenado também a pagar multa por litigância de má-fé e por ato atentatório à dignidade da justiça após o juiz concluir que comportamentos que fogem à boa-fé e lealdade processual foram adotados durante a tramitação do processo.
De acordo com o magistrado, o escritório usou de comportamento condenável para alterar a verdade ao criar uma versão, reiterada em diferentes momentos do processo, para contestar o período do contrato com a trabalhadora. Mas diversos registros, inclusive conversas via aplicativo WhatsApp e trocas de e-mails, desmentem a alegação. Por isso, terá de pagar multa por litigância de má-fé, no importe de 9% do valor atribuído à causa.
Também terá de arcar com multa por ato atentatório à dignidade da Justiça, no importe de 20% do valor da causa, por faltar intencionalmente com a verdade ao dizer que desconhecia um determinado número de telefone, que depois ficou comprovado pertencer ao escritório. A manobra exigiu a expedição de ofícios para diversas companhias telefônicas e, com isso, atrasou o trâmite processual e retardou a decisão da Justiça.
Além de provado que a linha de telefone era utilizada nas atividades do escritório, revelou-se depois que o número era exatamente o informado pela sócia como seu contato profissional junto ao Cadastro Nacional de Advogados.
Processo na OAB
Por fim, o juiz determinou o envio de ofícios ao Tribunal de Ética da Ordem dos Advogados do Brasil em Mato Grosso (OAB-MT) para que se apure eventuais irregularidades decorrentes das condutas dos profissionais, bem como para o Ministério Público do Trabalho (MPT), em razão das informações constantes no processo dando conta da existência de assédio moral contra a generalidade dos trabalhadores do escritório. Pelo mesmo motivo, o magistrado ordenou que a Superintendência Regional do Trabalho (SRT) fosse comunicada para que proceda à fiscalização do caso.
O magistrado determinou, ainda, envio de ofício à Polícia Federal e ao Ministério Público Federal para que se apure a existência de prática de crime de fraude processual e, da mesma forma, para investigar a conduta da trabalhadora, que recebeu o benefício do seguro-desemprego, mesmo exercendo atividade remunerada para o escritório.