O Sicomércio 2023, encontro promovido pela Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC) para o compartilhamento de conhecimentos e boas práticas com as federações e sindicatos que integram sua base, entrou em seu segundo dia com novos temas em discussão. Logo após a primeira palestra, feita pelo vice-presidente da República, Geraldo Alckmin, subiu ao palco o ministro do Tribunal Superior do Trabalho (TST) Douglas Alencar Rodrigues. Ele falou sobre a negociação coletiva e a flexibilização das regras para cumprimento das cotas de aprendizagem e de pessoas com deficiência. Para o ministro, a primeira preocupação da fiscalização trabalhista deve ser orientativa e não punitivista.
“Ainda estamos sob a influência de um modelo jurídico das relações capital e trabalho pensado nos anos 30 do século passado”, disse Douglas Alencar, ao contextualizar o atual momento de transição na área do Direito e da legislação. “Romper com o que é conhecido não é fácil, mas há todo um campo novo que precisa ser explorado com responsabilidade, que é o da negociação coletiva.”
Segundo o ministro, o modelo pensado na Constituição de 1988 confere à livre-iniciativa um papel proeminente na geração de riquezas, que precisa ser exercido sem perder de vista o compromisso com a função social das empresas. “O mundo do trabalho entra agora em nova fase, em que as classes econômicas e profissionais estão sendo convidadas a assumir sua própria responsabilidade na condução de seus destinos”, afirmou.
Importância da função social da empresa
Para Douglas Alencar, a ordem econômica não pode ser lida e interpretada de forma dissociada da ordem social. “Nenhum de nós quer viver em sociedades com tanta desigualdade, problemas graves de distribuição de renda e guetificadas. Por isso, é preciso que se reconheça a importância da função social da empresa. Só se pode falar em avanço se empresários, trabalhadores e governos desempenharem cada um o seu papel nas relações sociais”, enfatizou o ministro.
No entanto, pontuou Douglas Alencar, apesar dos bons propósitos dos legisladores, nem sempre é possível cumprir todas as exigências. Depois de fazer um breve histórico da evolução da legislação voltada à inclusão e à diversidade, o ministro destacou grandes avanços nas questões da igualdade e respeito aos direitos das pessoas com deficiência (PCDs). A questão da política de cotas, no entanto, ainda gera pontos de esclarecimento.
“Há casos em que, simplesmente, as empresas não conseguem recrutar e cumprir a cota, apesar do comprovado empenho, por questões alheias à sua vontade. É razoável punir quem tenta cumprir a lei e não consegue por aspectos que escapam ao seu controle?”, pergunta o ministro do TST, para responder em seguida: “Obviamente que não. Mas, mesmo assim, nós observamos a propositura de ações civis públicas, ações por danos morais coletivos, com aplicação de multas pesadas”, constata Douglas Alencar, para, imediatamente, situar o papel dos tribunais. “O debate fica com o Judiciário que, felizmente, é composto por pessoas que querem julgar de forma imparcial, considerando os fatos comprovados no processo”, completou.
Ao analisar os autos de infração, lavrados pela fiscalização do trabalho, explicou o ministro do TST, muitas vezes não se comprova o comportamento doloso da empresa no descumprimento da medida legal. “Nesses casos, a melhor solução é não punir, não sancionar. Esse poder de polícia trabalhista que os fiscais exercem deve ser cumprido preventivamente, com uma função pedagógica. O Estado não é inimigo do empresário. O Estado deve criar as condições necessárias para que o empresário possa exercer a sua atividade, orientando-o sobre como proceder em situações como essas”, esclareceu Douglas Alencar.