O dólar tocou pontualmente o campo negativo à tarde, em movimento de ajuste após ter fechado no maior nível desde março de 2021 na véspera, mas o aguardo por medidas de contenção de gastos limitou o alívio. Fatores técnicos, como o fechamento da Ptax do mês amanhã e a revisão do índice MSCI Brasil na próxima quarta-feira, 6, também estão no radar local. Já no exterior, foco para uma agenda extensa com payroll, eleição americana e reunião do Federal Reserve (Fed, BC americano) nos próximos dias.
No segmento à vista, o dólar fechou a R$ 5,7634 (+0,03%). O contrato futuro para novembro rondava estabilidade (+0,04%), a R$ 5,76450, por volta das 17h23. Já o índice DXY, que mede o dólar contra seis divisas fortes teve queda de 0,31%, a 103,994 pontos.
Depois de ter tido o pior desempenho entre moedas emergentes na terça-feira e subir por toda a manhã, o real conseguiu fechar perto da estabilidade nesta quarta-feira. No exterior, o dólar recuou ante a maior parte dos pares fortes, apesar de ganhar terreno em relação ao peso mexicano, peso colombiano e peso chileno.
O economista-chefe da Monte Bravo, Luciano Costa, afirma que o real teve desvalorização bem contida que alguns pares emergentes por um ajuste, com entendimento de que os comentários feitos pelos ministros Fernando Haddad (Fazenda) e Rui Costa (Casa Civil) demonstraram convergência sobre reforço ao arcabouço fiscal: “parece um discurso mais alinhado, o que antes era um ponto de divergência”.
Contudo o consultor econômico da plataforma de transferências internacionais Remessa Online, André Galhardo, pondera que o desejo do mercado, de fato, é ver o esforço fiscal sendo materializado.
Já o ministro do Trabalho, Luiz Marinho, afirmou que nunca foi consultado por integrantes do governo sobre a agenda de revisão de gastos. Ainda assim, as falas não fizeram grande preço no mercado, que também se deparou com uma abertura líquida de 247.818 vagas de trabalho com carteira assinada em setembro no Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), acima da mediana das previsões de 225.080 do Projeções Broadcast, o que em tese ajudaria o real.
Costa, da Monte Bravo, pontua ainda que o payroll dos Estados Unidos na sexta-feira deve gerar alguma volatilidade. “Provavelmente mercado terá cautela com divulgação do dado, pois hoje saiu uma pesquisa da ADP mais forte do que o esperado”, avalia. Para ele, as eleições americanas na semana que vem também é evento importante, por mais que o resultado possa demorar por causa de uma apuração lenta, além de incertezas com o que o Fed deve decidir na quinta-feira, 7.
Ibovespa
A confiança manifestada hoje pelo ministro Fernando Haddad na sustentabilidade do arcabouço fiscal e na ancoragem das expectativas teve o efeito oposto a declarações do titular da Fazenda ontem, quando ele tinha indicado não haver data definida para o anúncio de cortes de gastos – pacote que o mercado esperava, anteriormente, que pudesse ser entregue tão logo encerrado o segundo turno das eleições municipais, no domingo. Assim, o dia ainda foi de avanço do dólar e da curva de juros doméstica em parte da sessão, mas em padrão mais discreto.
Na B3, o Ibovespa operou nesta quarta-feira em variação estreita, entre mínima de 130.472,60 e máxima de 131.026,92 pontos, saindo de abertura aos 130.729,93. O giro financeiro se manteve acomodado na sessão, a R$ 17,0 bilhões, e o índice de referência fechou bem perto da estabilidade (-0,07%), aos 130.639,33 pontos. Na semana, o Ibovespa mostra ganho de 0,69%, mas segue no negativo no mês (-0,89%), faltando a sessão de amanhã para o encerramento de outubro. No ano, cede 2,64%.
“Há conforto ainda do investidor com relação à renda fixa, considerando o nível atual da Selic – que deve voltar a subir na decisão do Copom na semana que vem. Um primeiro momento de retomada do interesse pela renda variável pode emergir quando vier a concretização de iniciativas favoráveis, como a redução de gastos públicos prometida pelo governo, com efeito na ponta longa da curva de juros, que tem se mantido pressionada”, observa Isabel Lemos, gestora de renda variável do Fator.
A mediana do mercado indica que haverá corte de R$ 25,50 bilhões nas despesas do governo, no âmbito das medidas de ajuste fiscal atualmente em discussão pelo Ministério da Fazenda, conforme levantamento dos jornalistas Daniel Tozzi Mendes, Gabriela Jucá e Anna Scabello, do Projeções Broadcast.
O volume de cortes previsto pelo mercado, porém, ainda deverá ficar aquém do necessário para o cumprimento das regras fiscais do ano que vem. A mediana do mercado indica necessidade de cortes de R$ 49,50 bilhões em 2025 para cumprimento dos limites de gastos definidos no novo arcabouço fiscal.
Para Lucas Moreira, especialista em investimentos do Grupo Fractal, “incertezas fiscais e inflação resiliente continuam pressionando o real”, e “a confiança na política monetária e na estabilidade fiscal será crucial para conter uma desvalorização mais acentuada da moeda”. Afora as questões domésticas, “a proximidade das eleições nos EUA e possíveis mudanças na política econômica americana podem aumentar a volatilidade cambial até o final do ano”, acrescenta. Nesta quarta-feira, o dólar à vista subiu 0,03%, a R$ 5,7634, com máxima na sessão perto dos R$ 5,80, a R$ 5,7927.
“Após divulgação do PIB dos EUA, que veio abaixo do esperado, investidores refazem projeções, com a possibilidade de um resultado menor para a atividade econômica estimular um corte de juros mais acentuado na próxima reunião do Federal Reserve”, na próxima semana, diz Robert Machado, analista da CM Capital.
Além dos desdobramentos em torno do cenário macroeconômico – o que envolve também a definição eleitoral nos Estados Unidos, também aguardada para a próxima semana -, Isabel, do Fator, destaca a temporada doméstica de resultados corporativos do terceiro trimestre, com foco em segmentos como os de bancos, construção civil e consumo discricionário, para os quais mantém perspectiva positiva. “O Ibovespa tem peso grande de bancos e commodities, e é importante olhar fora desses setores.”
Nesta quarta-feira, com a relativa estabilização da curva doméstica, parte do setor de consumo e construção, sensível a juros, mostrou recuperação. Na ponta ganhadora do Ibovespa, destaque para nomes como CVC (+4,35%), Magazine Luiza (+4,01%), Carrefour (+3,32%), MRV (+3,02%) e Cyrela (+3,01%). No lado oposto do índice, WEG (-5,16%), Embraer (-2,08%), IRB (-1,73%) e Rede D’Or (-1,69%).
Entre as blue chips, tanto Petrobras como Vale mostraram perdas no fechamento, em sessão mista para os grandes bancos – ao final, majoritariamente positiva -, com destaque para a recuperação parcial de Santander Brasil, que ontem havia cedido pouco mais de 5% e hoje subiu 2,04%, em ajustes posteriores ao balanço do terceiro trimestre, na abertura da temporada de resultados das maiores instituições financeiras. Petrobras ON e PN recuaram respectivamente 0,87% e 0,44% (mínima do dia no fechamento), na sessão de hoje, enquanto Vale ON cedeu 0,30%.
“Somente em julho e agosto registramos um leve fluxo positivo na Bolsa: o ano, no geral, tem sido de saída de capital, o que preocupa, considerando a necessidade de um fluxo estrangeiro consistente para expansão de negócios. Esse cenário é agravado por uma taxa de juros elevada, com os juros futuros em torno de 12,70% ao ano, em níveis vistos apenas em 2022 no contexto pós-pandemia”, aponta Anilson Moretti, head de câmbio da HCI Invest.
Juros
Os juros futuros perderam ímpeto de queda ao longo do dia, mas ainda fecharam a sessão com viés de baixa. A expectativa em relação ao pacote fiscal segue trazendo volatilidade e a curva só deve ter um rumo definido quando o governo divulgar a agenda de revisão aprovada pelo presidente Lula.
Os ministros Fernando Haddad (Fazenda), Simone Tebet (Planejamento) e Rui Costa (Casa Civil) tentaram aplacar a ansiedade dos agentes quanto às medidas, mas o efeito sobre os ativos foi limitado. O foco na questão fiscal deixou a agenda econômica em segundo plano e, no exterior, os juros globais do mesmo modo operaram sem tendência firme.
A taxa do contrato de Depósito Interfinanceiro (DI) para janeiro de 2026 encerrou em 12,73%, de 12,75% ontem no ajuste. A taxa do DI para janeiro de 2027 passou de 12,91% para 12,88% e a do DI para janeiro de 2029, de 12,95% para 12,89%.
O alívio visto na curva nesta quarta-feira se deu num ambiente de liquidez muito baixa – outro elemento que denota a pouca disposição do mercado em tomar posições contundentes. Enquanto não se tem ideia do que virá das medidas, o mercado tenta se posicionar, mas sem muita convicção.
Ontem, Lula, Haddad, Costa e o diretor de Política Monetária e futuro presidente do Banco Central, Gabriel Galípolo, além de outros integrantes da equipe econômica, estiveram reunidos por quatro horas no Palácio da Alvorada, reforçando a expectativa de que o anúncio não tardaria, mas ainda não foi dessa vez.
Haddad hoje disse entender a inquietação do mercado, mas ponderou que há muita especulação. Ele revelou que o governo está trabalhando numa “fórmula adequada” para o pacote, que abra caminho para a queda dos juros, do dólar e a ancoragem das expectativas. Já Costa reafirmou “o absoluto compromisso do governo com o equilíbrio fiscal”, durante a cerimônia da Nova Indústria Brasil, no Planalto.
Tebet disse que não há “pressa” na aprovação nem na “entrega” das ações, já que boa parte delas visa o cumprimento da regra fiscal em 2026, mas julga ser importante anunciar ainda em novembro. Segundo ela, Lula já tem ideia do montante de cortes e das medidas que o pacote incluirá. Mas o ministro do Trabalho, Luiz Marinho, buscou se descolar, afirmando que nunca foi consultado por integrantes do governo sobre a agenda e que não existe debate no Executivo sobre cortar recursos de benefícios como seguro-desemprego e abono salarial.
O analista de renda fixa da Connex Capital Gean Lima afirma que a casa tem posição atualmente neutra em prefixados, lembrando do ritmo forte da atividade, do nível de desancoragem das expectativas e a questão fiscal ainda em aberto. “Não há estímulo para ficar comprado, mas por outro lado a atratividade para aplicar depende do que o governo vai apresentar”, diz. Ele destaca que a curva de FRA aponta Selic de 13,5% no fim de 2025, o que aparentemente é exagerado, “mas quem vai dizer se isso é verdade ou não são as ações do governo”.
“Temos os juros reais em patamar bastante elevado, aproximadamente 1,2 ponto-base acima da inflação implícita, o que evidencia um nível alto de restritividade dos juros reais. Vemos as taxas atrativas para aplicar, sobretudo com hedge na compra de inflação implícita”, afirma.
A agenda do dia trouxe, entre outros indicadores, o saldo do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) referente a setembro, mas sem impacto nos preços, ainda que o resultado positivo de 247.818 vagas tenha superado o de agosto (239.113) e também a mediana das estimativas, de 225 mil.