Cidades

Entidades lutam por direitos e respeito à comunidade LGBTQI+

Sexta-feira (28), Dia Internacional do Orgulho LGBTQI+ (lésbicas, gays, bissexuais, travestis e intersexuais), data que marca a resistência e as lutas por direitos e respeito pela diversidade sexual. Apesar de certas conquistas, a violência ocasionada pela homofobia ainda é alarmante no Brasil e pode começar dentro de casa, assim como o menino de 13 anos que apanhou da mãe por causa de sua orientação sexual, em Várzea Grande.

Conforme dados informados pela Secretaria de Segurança Pública (Sesp-MT) em 2018 foram registradas 111 ocorrências cujo crimes tiveram motivações homofóbicas. No mesmo ano houve pelo menos 15 homicídios em todo o estado, pela mesma motivação.

Morgana Moura é presidente do Conselho Regional de Psicologia, em Cuiabá, e esclarece que a entidade atua na defesa dos direitos humanos e das políticas públicas. Uma das principais pautas da entidade é pensar nos direitos da população LGBTQI+ e na descaracterização da orientação sexual e a identidade de gênero como doença.

Ela explica que há resoluções do Conselho Federal de Psicologia que regulamentam que os profissionais da área devem realizar o atendimento voltado ao sofrimento da pessoa e a dor causada por conta da violência que ela poderá sofrer.  Psicólogos não podem patologizar comportamentos e práticas da comunidade LGBTQI+, praticar a reorientação sexual e colaborar com reforço de preconceitos, estigmas, estereótipos ou discriminações.

“O LGBT pode adoecer, mas não é por causa da orientação sexual, e sim por conta do conflito de ter que lidar com a sua orientação e com a sociedade que o julga e cobra”, diz a conselheira.

Quando citado o caso do garoto de 13 anos que apanhou da mãe e fugiu de casa, porque ela não aceita sua orientação sexual, Morgana conta que o processo de reconhecimento do desejo pelo outro e descobertas na pré-adolescência é delicado, inclusive aos heterossexuais.

A profissional observa que quando não há um apoio familiar, além da violência física que a pessoa pode sofrer, há outras formas de violência que o atinge de modo secundário. Há o sofrimento psíquico relacionado à rejeição. A saúde mental é afetada e começam os quadros de depressão e práticas contra a própria vida.

Os dados da Sesp apontam que 2013 e 2016 registraram dois casos de suicídio de pessoas LGBTQI+ em Mato Grosso, porém em 2018 esse número mais que dobrou. Foram sete casos.

“Ele já vai sofrer represália do mundo e se na família encontrar um ponto de apoio, já consegue lidar melhor com o que virá atacá-lo. E quando a família faz um suporte, tem que entender que também vai sofrer a represália que o filho ou a filha receberia”.

Mães Pela Diversidade

Pensando nisso, o Movimento Mães Pela Diversidade, que já existe em várias cidades do país, está ativo há cinco anos em Cuiabá e busca acolher pais e mães que tem filhos LGBTQI+ e orientar, fornecendo orientações, informações e até mesmo indicação de psicólogos e advogados que lutam na causa.

Josi Marconi é coordenadora do movimento há cinco anos e conta que o grupo é formado por mães que perceberam a necessidade de estarem juntas de seus filhos na luta por direitos e respeito pela orientação sexual. Elas decidiram criar uma rede de apoio.

“Nós percebemos que quando um LGBT é acolhido pela família ele tem mais força para estar na sociedade. Ele tem mais força, mais amor e fica mais seguro”, ressalta Josi.

A coordenadora explica que muitas famílias não estão preparadas para lidar com o tema. “Quando a minha filha se assumiu foi um choque. Mas, ao contrário da maioria, não houve violência. O caso desse menino de 13 anos não é um evento isolado, isso acontece diariamente. A primeira violência que o LGBT tem é na família. É o irmão que dá um soco na cara, é a mãe que da uma surra, é o pai que faz estupros coletivos e corretivos com lésbicas e é a tia que faz piada”.

Com o lema “Saiam da frente que estamos passando com o nosso amor”, o Movimento Mães Pela Diversidade auxilia e encaminham familiares e a própria população LGBTQI+ em casos de depressão, de violência, ou qualquer outra razão que a ajuda seja necessária. Basta entrar em contato através do telefone (65) 9 8138-9648, que qualquer mãe que estiver de plantão atende 24 horas.

Morgana indica que pessoas que pertençam a comunidade LGBTQI+ busquem seus pares. Ela fala sobre a importância de coletivos LGBTQI+, que lutam por políticas públicas e onde é possível encontrar força para lidar com situações de conflito.

Para pessoas que precisam buscar por acolhimento para a saúde mental, Morgana informa que há clínicas/escolas que oferecem atendimento psicológico, há profissionais da área que oferecem seu trabalho por um preço social e existe também o atendimento em policlínicas.

Há também o serviço do Centro de Valorização a Vida (CVV). Bastar ligar para o número 188 ou acessar o www.cvv.org.br. A entidade oferece apoio emocional de forma gratuita e sigilosa. É uma conversa sem julgamentos ou críticas. Os voluntários buscam respeitar o sentimento de quem os procura.

Breves relatos

“Eu já tive muitos medos quando o assunto é me assumir. O primeiro foi aquele de ser rejeitada e começar uma guerra em casa”, relata Kátia Santos*, 23 anos, uma universitária que ainda não assumiu sua orientação sexual para a família.

“Também vem aquela coisa de te afastar das pessoas ou de te proibir de fazer atividades que gosta, tudo para evitar que a sexualidade seja expressada. Depois, eu comecei a sentir medo que houvesse mudança em como eu era vista , como eles me veriam. O tratamento mudaria? E agora?”

Kátia observa que conforme o tempo vai passando e a independência vai aumentando essas questões passam a importar menos. “Difícil mesmo é quando a pessoa está na casa dos 16 anos. Como iria me sustentar? Como sobreviver? Toda vez isso pairava na minha mente”.

Ela diz que a cada dia que passa está mais perto de se assumir, mas que gostaria que nada mudasse, pois ela não mudou, é a mesma desde sempre. Kátia ressalta que ninguém gosta de lidar com a rejeição de quem ama e que a sua família é a sua base.

“Às vezes eu penso que é neura da minha cabeça e que tudo vai ficar bem, nada vai mudar e só vai ser um choque, mas ao mesmo tempo me enche de medo meus pais ficarem irracionais por causa disso. Não é fácil ter todos esses sentimentos dentro de você, sendo que a orientação sexual não é escolha e infelizmente o tabu ainda é grande e a violência ainda maior. Tudo isso só aumenta a insegurança de querer me assumir”.

Bruno Prado, 23 anos, também é universitário e relata que desde a infância ouviu repressões de familiares e sempre ouviu que certas coisas eram de meninas e outras de meninos.

“Entre outras frases machistas e homofóbicas eu fui crescendo ouvindo isso e era um fardo que carreguei por um longo tempo, até meus 17 anos”.

Bruno diz que foi difícil e que nunca se sabe o que realmente irá acontecer após se assumir e só conseguia sentir o medo.  “Esse fardo, com o passar do tempo, foi sumindo e alguns da minha família dizem que está tudo bem, mas ainda existe o preconceito que está enraizado culturalmente”.

Ao contrário de Kátia e Bruno, Priscila Campos não teve nenhum tipo e preparo psicológico para se assumir. Atualmente com 28 anos, a publicitária foi “jogada para fora do armário”, como ela mesma diz, por volta dos 18 anos de idade.

A jovem morava em Nobres (124 Km de Cuiabá) na casa dos avós. Seu avô era pastor da Igreja Assembleia de Deus e sua avó muito religiosa. Durante certo período, sua tia Maria*, que é preconceituosa, estava morando na mesma casa e tinha um pen drive igual ao de Priscila.

No pen drive da jovem havia fotos suas com a sua então namorada, inclusive se beijando. Certo dia, Maria pegou o pen drive da sobrinha e enquanto Priscila estava conversando com sua vó sobre uma possível viagem, interrompeu a conversa e disse: “Porque você não conta para a mãe a para o pai que você ama uma mulher”.

“Isso foi muito traumático. Eu não estava pronta e foi um baque, eu tive uma crise de pânico”, relata Priscila.

Seus avós nunca mais tocaram no assunto, mas a respeitam. A mãe de Priscila a defendeu: “Só o que eu posso fazer é te aceitar e te amar”.

Essa situação ocasionou traumas na jovem. Ela teve depressão e síndrome do pânico e há a possibilidades de que o caso possa ter contribuído para seu transtorno bipolar.

“Eu não quis me assumir, não era a minha hora, foi contra a minha vontade e foi péssimo para mim. Eu acho que já superei essa parte, mas a gente não esquece. Foram momentos muito tristes e dramáticos”.

 

*Nomes fícticios para proteger a identidade dos envolvidos.

Redação

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Reportagens realizada pelos colaboradores, em conjunto, ou com assessorias de imprensa.

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