Cidades

Empresários e governo de MT brigam por dívida de ICMS

Em Mato Grosso, empresários e governo entraram em disputa jurídica para a negociação de R$ 1 bilhão do Imposto sobre Circulação de Mercadoria e Serviços (ICMS) de dívidas de 30 mil contribuintes. A quantia estimada pela Federação de Comércio, Bens, Turismo e Serviços de Mato Grosso (Fecomércio-MT) corresponde a cobranças que vinham sendo recolhidas de forma diferenciada por meio do Fundo de Desenvolvimento de Mato Grosso (Funeds).

O Funeds foi criado por meio do decreto526/2011 para integrar empresários, dos mais diversos ramos de atividades, que possuem dívidas do ICMS. Segundo o advogado da Fecomércio-MT, Homero Marchezan, foram negociados pagamentos com até 60% de desconto para viabilizar a legalização com o Fisco.

No entanto, o fundo foi declarado inconstitucional em 2014 pela Justiça estadual e a partir da primeira semana deste mês a Secretaria de Fazenda (Sefaz) passou a cobrar integralmente os valores para quitação em parcela única.

“Agora, há o risco de dívidas já pagas serem cobradas novamente. O governo diz que está abatendo os valores já pagos, mas nós não sabemos como está a situação, visto que as cobranças estão sendo feitas retroativamente. Além disso, os empresários não foram avisados de que os valores seriam cobrados com a extinção do fundo. Os empresários foram pegos de surpresa no dia 4 de setembro (data em que a Sefaz começou a fazer cobranças) quando apareceu em seu cadastro a cobrança do que fora negociado pelo Funeds”, diz.

Segundo ele, a decisão do Tribunal de Justiça de invalidar o fundo não determina que o Estado faça a cobrança sem renegociação com os empresários. “Até por que não houve nenhum prejuízo para o Estado com a suspensão do Funeds, não acarretou implicações fiscais. Foi uma decisão de cunho jurídico, ou seja, a Sefaz pode procurar os empresários participantes do fundo para renegociar as dívidas, mas isso não foi realizado”, comenta.

Para impedir prejuízos financeiros, a Fecomércio-MT ingressou uma impugnação administrativa contra a Sefaz. O recurso visa suspender as cobranças até que um novo modelo de taxação seja negociado com os empresários. Conforme Marchezan, a entidade também prepara um mandado de segurança que tentará barrar o efeito retroativo da anulação do fundo. A decisão do Judiciário passaria a valer para os acordos firmados a partir data do julgamento de inconstitucionalidade, em julho de 2015.

“Além disso, é preciso considerar a medida legal de que após cinco anos de existência a dívida prescreve, ou seja, não tem mais validade jurídica. Isso coloca as dívidas dos contribuintes com data de 2011 para trás fora das cobranças do Fisco”, explica.

Manifesto

A Fecomércio-MT também protocolou, no dia 13 de setembro, na Sefaz-MT e no Gabinete do Governador, um manifesto formal e administrativo contra a cobrança dos débitos dos contribuintes negociados junto ao governo por meio da Lei. O documento cobra também a apreciação imediata quanto ao pedido de audiência com o Governador e Secretário de Fazenda.

O presidente da Fecomércio-MT, Hermes Martins, afirmou que todas as medidas possíveis estão sendo tomadas no sentido de evitar os prejuízos que essa cobrança vai trazer para a classe empresarial. “Nosso setor jurídico elaborou a defesa e disponibilizou gratuitamente ao contribuinte que é o principal prejudicado nisso tudo. Agora cabe a cada empresário agir. Por parte da Federação, já está agindo como entidade representante de interesse coletivo, agindo política e judicialmente”, pontuou o presidente.

Rondonópolis

A Associação Comercial e Empresarial de Rondonópolis (ACIR) também trabalha para bloquear a cobrança iniciada pela Sefaz. Em nota publicada, o presidente da entidade, José Luiz Gonçales, diz ter participado de reunião com o Conselho Regional de Contabilistas de Mato Grosso (CRC-MT) para encontrar medidas que impeçam a cobrança. A associação também pede que o governo não cobre os créditos residuais referentes a dívidas anteriores a 2010.

Comércio teme falência e exclusão de programas fiscais

Na segunda-feira (12), comerciantes no centro de Cuiabá não abriram as portas em manifestação contra as cobranças do ICMS, ITCD e IPVA, iniciadas pelo governo estadual. Eles dizem que a medida irá causar mais prejuízos entre micro e pequenos empresários, que participaram do Funeds. A dívida gerada pelo lançamento dos débitos em conta corrente pode levar à falência as empresas sem recurso para cobrir as despesas.

Outra consequência para os empresários de pequeno porte é a possibilidade de exclusão do Simples Nacional devido às cifras geradas pelo lançamento da dívida em conta.  “Fomos pegos de surpresa com essa bomba. A gente soube na semana passada que a cobrança poderia ser feita, mas foi isso. E no começo desta semana já identificamos o débito na conta corrente”, disse um comerciante João Antônio.

O consultor financeiro da indústria Pão de Casa, Evandro Flores, diz que teve uma dívida R$ 850 mil renegociada, por meio do Funeds, para R$ 380 mil divididos em 14 parcelas, que foram pagas até a suspensão do fundo há dois anos. Hoje, a Sefaz cobra cerca de R$ 400 mil.

“Houve divulgação do lançamento da cobrança no site da Sefaz, mas não fomos procurados para tentar renegociar a dívida, simplesmente o valor foi jogado na nossa conta corrente, e se não houver renegociação tememos até mesmo pelo emprego dos 100 funcionários, que estão no quadro da empresa hoje”, conta.

A Câmara de Dirigentes Lojistas (CDL) de Cuiabá aponta três erros na ação da Sefaz. O primeiro, a prescrição de dívidas com mais de cinco anos de existência, prazo limite para a cobrança judicial. Também ocorre a infração à boa-fé dos comerciantes incluídos no Funeds.

Conforme a CDL, uma vez que houve acordo para renegociação das dívidas, os beneficiados têm o direito de garantia das medidas combinadas. O desrespeito aos dois dispositivos gera a insegurança jurídica, também uma infração à lei.

Fundo foi invalidado por desvio de função do Executivo

O Funeds se tornou inconstitucional após ação do Ministério Público Estadual (MPE), que questionou a competência do Executivo em criar medidas de caráter legislativo. O programa entrou em vigor por meio do decreto do governo 526/2011 com base na lei 9.481 do ano anterior.

Conforme a norma, o fundo tinha o objetivo de erradicar a pobreza e desenvolver políticas de inclusão; fazer investimento em infraestrutura pública e social; ações sociais essenciais à segurança e dar acesso “ao mínimo existencial necessário à pessoa humana”. Para realizar as metas, seriam desenvolvidas ações emergenciais como o resgate de créditos trabalhistas ou passivos vinculados a servidores públicos.

O Ministério Público Estadual disse que não está no âmbito de serviços do Poder Executivo promulgar medidas que estabeleçam novas medidas legislativas ou alterem as já existentes. Essa função cabe ao Poder Legislativo.  

Além disso, em 2011, o órgão instaurou um inquérito civil público para investigar se esse modelo do Funeds se confrontava com a Lei de Responsabilidade Fiscal por alterar a arrecadação de impostos, causando danos aos cofres públicos. O recurso para suspensão do fundo é de 2013.

Sefaz prevê resgate de R$ 50 milhões de 24 mil contribuintes

A Sefaz informou por meio de nota que não infringe nenhuma lei com a cobrança das dívidas renegociadas pelo Funeds. Disse que, pelo contrário, cumpre as decisões judiciais que extinguiram o programa, que concedeu reduções de até 60% no valor do imposto, além de desconto de até 100% nas multas e nos juros, para débitos gerados até 31 de dezembro de 2012. A Fecomércio-MT diz que esse argumento é uma “falácia”.

A secretaria também disse ser menor o número de contribuintes integrantes do fundo e do valor a ser recuperado. A cobrança está sendo feita a 24 mil empresários com dívidas referentes ao ICMS, Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação, de quaisquer Bens ou Direitos (ITCD) e Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores (IPVA).

“Para mitigar o problema, os contribuintes que tiverem saldo devedor a pagar poderão recorrer ao Programa de Recuperação de Créditos do Estado de Mato Grosso (Refis/MT), cujo projeto de lei está sendo finalizado para ser enviado à Assembleia Legislativa”, informou a secretaria.

Quanto ao valor em aberto, a Sefaz disse que a previsão é de reaver aproximadamente R$ 50 milhões até o final deste ano. Disse ainda que trabalha para a recomposição dos valores dos débitos dos contribuintes atingidos com a declaração de inconstitucionalidade do Funeds.

“O trabalho é minucioso e complexo porque demanda retomar o valor inicial da dívida, abater o que foi efetivamente recolhido pelo contribuinte e demonstrar o novo saldo devedor atualizado”.

 

Reinaldo Fernandes

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