Palácio Guanabara, sede do governo do estado do Rio (Foto: Divulgação/Palácio Guanabara )
Obras paradas, salários atrasados, fornecedores sem receber, uma absoluta incerteza quanto ao futuro e quase nenhuma perspectiva de melhora. A frase soa pessimista – e é. A situação financeira do Estado do Rio de Janeiro não dá margem a uma perspectiva otimista – pelo menos não a curto prazo. A máquina estadual entrará em 2017 com um rombo de R$ 17,5 bilhões no orçamento e a previsão é de um déficit de R$ 52 bilhões até dezembro de 2018.
O quadro dramático levou o governo a decretar estado de calamidade e a anunciar, na sexta-feira (4), um pacote de medidas radicais para tentar equilibrar as finanças. Entre elas, estão o aumento do desconto previdenciário de 11% para 14%; o reajuste da tarifa do Bilhete Único de R$ 6,50 para R$ 7,50; o desconto de 30% do salário de aposentados; e a redução de 20 para 12 secretarias.
"São medidas que estamos tomando para não demitir funcionários e respeitar a lei de responsabilidade fiscal", explicou o governador Luiz Fernando Pezão. "Podemos atravessar a turbulência", completou.
Algumas ações serão feitas por decretos, alguns já publicados no Diário Oficial. Outras, por projetos de lei, dependem de aprovação de deputados. Além da votação na Assembleia Legislativa (Alerj), terão que superar também possíveis processos na Justiça, já prometidos por setores que serão afetados pelas medidas.
Motivos da crise
O primeiro – e talvez mais conhecido – fator que levou à crise foi a queda brusca do preço do barril de petróleo no mercado internacional. Apenas em 2015, o Estado do Rio deixou de arrecadar quase R$ 1 bilhão em royalties, segundo dados da Agência Nacional do Petróleo.
Uma política agressiva de isenção de impostos, com vistas a atrair mais empresas para o estado, também comprometeu as finanças do Rio de Janeiro.
"Nos últimos anos, o Rio deixou de arrecadar quase R$ 200 bilhões em impostos. Empresas vieram para cá e empregos foram gerados, é verdade. Mas é absurdo o montante que se perdeu na arrecadação", disse o presidente da Comissão de Tributação da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro, deputado Luiz Paulo Correa da Rocha (PSDB) – a Alerj ratificou o estado de calamidade em projeto de lei votado nesta no dia 1º de novembro.
"Além disso, o Estado não controla quais empresas recebem esses benefícios. Junte isso ao inchaço da máquina pública fluminense nos anos mais recentes e à queda brusca do barril do petróleo e você terá a receita do caos preparada. Esse desastre se consolidou quando o governo decretou estado de calamidade, no dia 17 de junho", completa Rocha.
Segundo levantamento feito pela Associação de Empresas de Engenharia do Rio de Janeiro (Aeerj), pelo menos 29 obras estaduais estão paralisadas por conta da crise. O caso mais emblemático é o da estação Gávea do metrô, que deveria ser concluída até o ano que vem, mas que só deve mesmo se tornar realidade em 2018.
Pagamentos atrasados
O desastre das contas estaduais comprometeu, também, o pagamento do funcionalismo. Entre 2015 e 2016, houve atrasos para todas as categorias. Primeiro em dezembro de 2015 – na ocasião, o pagamento de novembro foi feito em duas etapas. O 13º daquele ano também chegou atrasado no bolso dos funcionários e a Secretaria de Fazenda admitiu que não há como estipular uma data para o depósito do benefício este ano.
Em 2016, houve parcelamentos em março e maio. O governo também trocou a data do pagamento em duas ocasiões. Desde o pagamento de julho, no entanto, a Justiça obriga o Estado a fazer o depósito até o terceiro dia útil do mês subsequente.
As forças de segurança, como se poderia esperar, também não saíram ilesas. Além dos salários atrasados, os policiais passaram a lidar com a ausência de materiais básicos e essenciais ao trabalho diário, como papel para registrar ocorrências nas delegacias.
As operações em áreas de risco também foram prejudicadas pela impossibilidade de uso de veículos fundamentais nesse tipo de situação: dois dos três helicópteros da Polícia Civil estão fora de operação e dos cinco blindados da corporação, apenas um está em condições de funcionamento.
Apesar das medidas anunciadas na sexta-feira (5), o secretário de Fazenda do Rio, Gustavo Barbosa, prevê um quadro ainda pior em 2017. "Será um ano mais difícil do que 2016. Isso eu queria deixar muito claro", explicou.
O pacote pacote de combate à crise promete um aumento de receita de R$ 13 bilhões, em 2017, e cerca de R$ 14,6 bilhões, em 2018, caso todas as medidas sejam aprovadas. Segundo o próprio secretário de Fazenda, só vai haver equilíbrio fiscal em 2022 ou 2023.
Perdendo credibilidade
Com a perda do grau de investimento do Brasil, os estados que também são avaliados por agências internacionais de risco foram consequentemente rebaixados. Entre os estados avaliados, o Rio de Janeiro é o que tem a pior nota de crédito. Quanto pior a nota, mais caro é para o estado se financiar.
Pela agência Fitch, o estado recebe a nota "C", já dentro da categoria de alto risco de inadimplência. "A receita cresce menos que o esperado e as despesas não param de avançar. Falta dinheiro para pagar dívida e fornecedor", diz Paulo Fugulin, analista da agência. "O estado não tem capacidade de honrar seus compromissos financeiros."
Pela Standard&Poor’s (S&P), o Rio de Janeiro era o estado com a pior nota até setembro (CCC-, também na categoria de risco alto de inadimplência). Porém, em outubro a agência informou que retiraria todos as notas do estado do Rio por “insuficiência de informações de qualidade satisfatórias”.
"A situação no Rio é diferente", disse ao G1 Daniela Brandazza, diretora sênior da área de ratings soberanos e de governos regionais e locais da S&P. Ela aponta que a relação entre despesas e receitas do estado vem se deteriorando fortemente. "Os déficits operacionais fiscais mudaram consistentemente para pior nos últimos 2 ou 3 anos."
Fonte: G1