Jurídico

DPMT recorre de decisão que nega adrenalina autoinjetável a menor alérgica

A Defensoria Pública de Mato Grosso aguarda avaliação da Turma Recursal para que o Supremo Tribunal Federal (STF) julgue recurso extraordinário, no qual o órgão pede que o Estado forneça, pelo Sistema Único de Saúde (SUS), adrenalina autoinjetável a uma adolescente de 16 anos de Alto Paraguai, 218 km de Cuiabá. Ela tem alergia a trigo e o medicamento, de uso emergencial, previne mortes por choque anafilático.

A caneta de adrenalina (Epinefrina) autoinjetável é importada e a sua comercialização em farmácia é proibida no Brasil. Porém, o país tem um acordo com a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) que permite a importação diante da recomendação de um especialista e do preenchimento de um protocolo.

No pedido inicial, a Defensoria Pública solicitou, com base em receita médica, dois dispositivos de adrenalina autoinjetável, de 0,30 mg, para que a adolescente M. G. A., estando longe da rede pública de saúde e em situação de emergência, pudesse prevenir a anafilaxia. Porém, o pedido foi negado em Mato Grosso.

No recurso extraordinário, o defensor público de segunda instância, Estevam Vaz Curvo Filho, pede a reforma do acórdão com base nos artigos 196 e 198 da Constituição Federal (CF) e fundamenta o pedido com base em decisões de tribunais de outros estados como o do Acre, Rio de Janeiro e São Paulo. Em julgamentos similares, esses tribunais garantiram o acesso de carentes à medicação.

“A anafilaxia pode evoluir para um desfecho fatal para o paciente e em atenção ao princípio da dignidade humana, à preservação da vida, bem indisponível, e à garantia do acesso à saúde, é que se busca a reforma da decisão colegiada pela via excepcional”, explica o defensor.

O pai da adolescente, Deusdeth Mendes de Arruda, conta que descobriram a alergia anafilática da filha em maio de 2019, quando a menina comeu um produto com glúten, passou mal e foi socorrida na UPA. “A alergista de Cuiabá, Ana Carolina, disse que se a médica não tivesse acertado os procedimentos, nossa filha teria morrido. Ela nos falou da caneta, disse que era importada, mas, só eu trabalho, ganho pouco, não tenho condições. É muito sofrimento”, disse o pai.

Arruda conta que conseguiu toda a documentação e procurou a Defensoria Pública, mas, com a pandemia, tudo ficou parado e o processo teve que ser refeito, meses depois. “A alergia dela é a trigo, agora pensa, é uma labuta: pobre não poder comer glúten! Às vezes a gente chora com ela, porque não temos condições de comprar comida diferente e nem a caneta. Por isso, nem ela, nem nós podemos sair de casa, ficamos reféns da insegurança”, contou o pai.

Carta Magna – O artigo 196 da CF estabelece que a saúde é direito de todos, dever do Estado e deve ser garantida por meio de políticas sociais e econômicas que reduzam risco de doença e outros agravos. O Estado deve garantir acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação. 

E o artigo 198, assegura que as ações e serviços públicos de saúde integram uma rede regionalizada e hierarquizada e constituem um sistema único, organizado de acordo com diretriz, entre elas, a de prestar atendimento integral, com prioridade para as atividades preventivas, sem prejuízo dos serviços assistenciais. No recurso, o defensor afirma que ambos os artigos foram violados com as decisões do TJMT.

Prevenção

O defensor traz para o processo o entendimento da Associação Brasileira de Alergia e Imunologia (ASBAI) que, numa Chamada da Anvisa, afirmou: “anafilaxia é uma emergência médica e quanto mais rápido o tratamento, melhor a evolução. A adrenalina é, sem a menor dúvida, a droga de maior importância no tratamento e deve ser aplicada aos primeiros sintomas da crise anafilática para evitar mortes”. 

Vaz Curvo Filho lembra, no entanto, que: “o medicamento fornecido pelo SUS é aplicado apenas nas redes de saúde pública e o que a família dessa adolescente está pedindo é que ela possa portar a medicação e estando onde estiver, possa evitar um quadro grave de choque anafilático, que pode levá-la à morte, caso não chegue a tempo num dos pontos da rede pública de saúde”.

E reforça que em decisão recente, divulgada no Tema 1161, o Tribunal de Justiça de Mato Grosso estabeleceu que: “É dever do Estado fornecer medicamento que, embora não possua registro na Anvisa, tem a sua importação autorizada pela agência de vigilância sanitária”.

Negativa

O pedido da família foi negado, em primeira e segunda instância, com a alegação de que um dos requisitos estabelecidos para o fornecimento de medicamentos que não constam na lista do SUS, não foi cumprido. O item seria um laudo médico fundamentado e circunstanciado expedido pelo profissional que acompanha a paciente, indicando a imprescindibilidade ou necessidade do medicamento, assim como a ineficácia, para o tratamento da doença, da medicação fornecida pelo SUS.

O defensor lembra que ainda que o medicamento tem utilização eventual, em situações imprevisíveis, não sendo assim, de uso contínuo. E que seu efeito pode ser comparado ao do soro antiofídico. O recurso foi protocolado na primeira quinzena de março.

Redação

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