Circuito Entrevista

‘Diminuir deputados é único jeito de equalizar estados’, afirma pré-candidata

A ex-juíza Selma Rosane Santos Arruda nasceu na cidade de Camaquã (RS) há 55 anos. Deu à luz três filhos (perdeu uma de 24 anos para o câncer), e segue na companhia de dois, um advogado e uma médica. É casada com Norberto Carlos Oliveira de Arruda, com quem começou a namorar há 38 anos. Formou-se em direito aos 22 anos, em 1985. Conhecida por ser uma magistrada de posicionamento firme em suas decisões na Vara de Execuções Penais, viveu boa parte de sua vida de juíza sob ameaças de morte, quando começou a lidar com casos de corrupção e chegou a ser obrigada a circular com um séquito de quase uma dezena de seguranças à sua volta. Com tudo isso, finalmente aposentada, decidiu dar um sonoro não a qualquer possibilidade de descanso, pois se diz preparada para a vida sob o jugo do escrutínio público constante de sua vida até então discreta no caso de ser eleita para o Congresso Nacional (ela é pré-candidata ao Senado, mas revelou ao Circuito Mato Grosso que pretende contribuir na política em qualquer cargo lá, não dispensa nem mesmo a Assembleia Legislativa, se for o caso). Em pouco mais de 15 minutos de conversa, ela discorreu sobre suas pretensões, Pedro Taques (PSDB), combate à corrupção, Jair Bolsonaro, campanha eleitoral e vários outros assuntos. Confira a íntegra do bate-papo com ela.

Circuito Mato Grosso – Sua vida hoje é mais calma do que no tempo em que era escoltada por nove seguranças?

Selma Arruda – Eu continuo escoltada, infelizmente, mas a vida é diferente, não é mais calma. Há muito menos estresse. Estou aprendendo a conhecer pessoas novas, assuntos novos. A gente, no Judiciário, fica muito isolada, o juiz é um ser muito solitário. Não tem amigos, não tem um relacionamento social grande, principalmente naquela área em que eu atuava, porque há muita ligação com política, né? Então se fica muito isolado. Mas agora estou conhecendo bastante gente, estou conversando, fazendo reunião. Está tudo muito bom.

Circuito Mato Grosso – É verdade que juízes recebem muitas ameaças, até pelo telefone?

Selma Arruda – Na vida de magistrada sim; depois que eu saí, graças a Deus, até agora não recebi nenhuma. Mas, poucos dias antes de eu sair da magistratura, recebi um recado de uma organização criminosa, então, isso era muito comum quando estava lá, muito comum.

Circuito Mato Grosso – A senhora é uma figura pública, mas sua vida não era devassada por imprensa e população. Isso vai acontecer caso seja eleita, está preparada para isso?

Selma Arruda – Estive conversando bastante com minha família sobre isso, por conta da exposição que a gente acaba dando não só à vida da gente, mas acaba expondo todo mundo. Eles foram bem solidários comigo, entendem que o propósito é maior, a ideia é maior. Então, eles estão de acordo; agora, essa coisa toda tem limite, a gente pode colocar a vida a ser devassada, mas não pode perder a privacidade completamente, né?

Circuito Mato Grosso – O que a senhora acha do Pedro Taques como governador?

Selma Arruda – (tomando fôlego) Olha, acho que esse mandato dele foi bem prejudicado. Acho que a crise geral foi um dos fatores que o prejudicou bastante, mas também acho que a gente só não entrou numa crise mais forte aqui porque o agronegócio levou o desenvolvimento. Pra Mato Grosso cair, tinha que ter quebrado muito estado no Brasil, por conta dessa questão. Então, vejo que o problema do atraso salarial não foi tão ruim, pois ele atrasou 10 dias, enquanto tem estado que atrasou meses e estado que está pagando até hoje parcelado, e isso sim é uma situação de penúria horrorosa, mas não se tem notícias de corrupção no governo dele, então, não foi uma administração de todo ruim. Acho que poderia ter sido melhor, porque não conseguimos andar pra frente, mas não tenho dados pra te dizer ou embasar uma crítica mais precisa.

Circuito Mato Grosso – Quais foram as maiores falhas dele?

Selma Arruda – Acho que ele tem uma certa dificuldade de se relacionar… ele não, a equipe dele tem uma certa dificuldade de relacionamento. A gente nota muito, por exemplo, o funcionalismo falar contra ele sobre o RGA. Ele já pagou o RGA, mas o funcionalismo continua falando mal dele, mas é pela forma como ele se relacionou com a categoria. Isso acaba antipatizando e estigmatizando as pessoas.

Circuito Mato Grosso – Ele foi uma decepção pra senhora?

Selma Arruda – Não tive, como cidadã, nenhum motivo pra me decepcionar, apenas tenho comigo que você não se deve tentar fazer aquilo que nunca fez. Algumas pessoas perguntam por que não quero ser candidata a governadora. Imagine. Seria uma honra muito grande. Tudo que se quer na vida é ocupar o maior cargo de um estado, mas eu tenho capacidade pra isso, eu já administrei alguma coisa? Minha casa e malemá (risos), ainda por cima. Então, talvez se ele tivesse continuado na carreira de senador, teria sido mais bem-sucedido.

Circuito Mato Grosso – A senhora tem ou já teve alguma relação com ele?

Selma Arruda – Conheço e tenho relação institucional. Me encontrei com ele várias vezes, por exemplo, uma vez fui receber uma homenagem da PM e ele estava lá. A gente se cumprimenta e conversa informalmente, mas é uma relação institucional.

Circuito Mato Grosso – Por que e em que a senhora vai ser diferente? Não é o que promete todo político?

Selma Arruda – Eu resolvi sair da magistratura porque percebi que as leis são feitas pras coisas não darem certo. Trabalhei 22 anos lá e nos últimos anos foi muito trabalho, com muito esforço, suor mesmo, e chega no final e percebe que todo um sistema de legislação é feito pra não funcionar, porque as pessoas que estão lá não querem que funcione. Então o que posso dizer que farei diferente é mudar, na medida do possível, óbvio, esse sistema de justiça, tentar fazer com que essa sensação de impunidade, que está deixando a gente numa violência sem fim, reféns de violência, de todo tipo de bandidagem, seja de colarinho branco ou de bandidagem violenta, fazer com que isso cesse. Tem algumas reformas na Constituição que precisam ser feitas, algumas no Código Penal, outras no Código de Processo Penal, mas também o que gostaria muito de me debruçar e contribuir é no sistema tributário. Acho que a gente paga muito imposto e não tem retorno nenhum. É uma vergonha, pagamos muito imposto e não temos nenhum retorno. Precisa mudar não só a forma como arrecada, mas a forma como o Estado devolve. Acaba que a União fica com uma grande fatia, e isso tudo se perde nos meandros da corrupção, tudo vira dinheiro para político e pouca coisa desce para o estado, menos ainda para o município, por isso estamos da forma como estamos.

Circuito Mato Grosso – Como a senhora vai separar o joio do trigo nas doações de campanha, já que elas podem ser anônimas?

Selma Arruda – Não. Acho que pelas normativas do Tribunal Regional Eleitoral (TRE), eles até deixam fazer a vaquinha, mas a pessoa tem que se identificar. Não tem condições de fazer anônimo não. E se a pessoa for dona de um empreendimento e quiser doar anonimamente, como vai cobrar a “propina”, o “compromisso” depois? (Risos).

Circuito Mato Grosso – Apoiar Bolsonaro pode ajudá-la a conquistar eleitores no interior do Estado, onde as pessoas costumam se identificar com um discurso mais conservador?

Selma Arruda – Exato. Bolsonaro é um homem de direita e eu resolvi entrar no PSL e apoiá-lo porque ele não tem histórico de corrupção. “Ah, mas Bolsonaro nunca aprovou projeto de lei”, ora, é difícil quando você é minoria no meio de 513, sozinho, querer colocar ordem na bagunça. Não vai aprovar mesmo. Por isso que eu falo, a chance que a gente tem é agora, porque se conseguir renovar lá, esses vícios, essas manhas e essas sacanagens acabam. Outra coisa que tem que acabar é esse número de deputados.

Circuito Mato Grosso – Isso seria proposto em sua legislatura caso se eleja?

Selma Arruda – Sim. Pra que e por que 513 deputados federais, me diz? E por que aqui em Mato Grosso, desses 513, a gente só pode ter oito? É pra não termos voz mesmo, ou seja, a gente produz muito, contribui muito com o país, mas na hora de ter voz, de reclamar, de tentar colocar nossas ideias em pauta, nossa bancada é pífia. Enquanto que no Senado são três por estado e pronto, todo mundo é igual. Dessa forma é muito mais justo e muito mais democrático. Então, essas coisas têm que acabar: primeiro diminuir o número de deputados, porque hoje é muito; segundo fazer com que todos os estados tenham a mesma força no Congresso. Aí sim, teremos democracia, senão, é brincadeira.

Circuito Mato Grosso – Ele tem mesmo toda essa força no interior?

Selma Arruda – Sim, o interior de Mato Grosso em peso é Bolsonaro. É impressionante, acho que isso também um pouco vem da revolta que as pessoas sentem com tudo que vem acontecendo no Brasil. Ele representa tudo que vem ao contrário, a indignação, inclusive com essas coisas de não poder mais nada, a imposição de práticas que não possam ferir fulano, nem beltrano: se eu te chamo de gordinho, eu sou gordofóbica, se tu me chama de loira, você é loirofóbico. Então, tudo é um escândalo que se faz. Essas políticas de tudo muito certinho, politicamente correto, acabaram virando uma ditadura nas pessoas, e ele é uma pessoa autêntica, espontânea. Fala muita coisa com as quais eu não concordo, mas dentre aquelas pessoas que estão ali, se predispondo, ele é o melhor.

Circuito Mato Grosso – É desejo antigo ser senadora de Mato Grosso?

Selma Arruda – Não (risos). Eu sempre negava que iria entrar pra política. No começo, eu tinha aversão, as pessoas perguntavam se era verdade que eu ia entrar na política ou não e eu ficava com muita raiva. Eu trabalhava com minhas mãos mexendo em toda aquela sujeira que a gente viu acontecer e tudo aquilo era exatamente o avesso do que tu pensa de um governo, né? Era como se você entrasse numa coisa horrorosa, nos intestinos do governo. Então, eu pensava: “meu Deus, esse trem é muito sujo e não tem como entrar numa coisa dessas”, mas aí alguém vem e fala: “olha, se deixar como está, vai continuar como está sempre. Se alguém não se levantar e não for lá, vai continuar como está”. Aí eu não sei, me deu uma coisa mesmo assim nos últimos meses de levar a sério a hipótese, não de Senado, mas de uma cadeira onde eu pudesse pelo menos fiscalizar a corrupção de outra forma. Se for pro Senado, posso fazer essas leis que estou me propondo; se não for, se for à Câmara Federal, também posso fazer projetos de lei e tomara que até lá o quadro e a paisagem geral tenham mudado, agora, se eu vier mesmo como deputada estadual, estarei fazendo o bem do mesmo jeito. Por quê? Porque estou fiscalizando as contas dos municípios, as contas do governo, e tudo é uma forma de contribuir. Só acho que a gente não pode é ficar sentado, “ah, entrou pra política, você é sujo”; não é assim, você pode entrar pra tentar limpar, caramba, porque se ninguém fizer isso vai continuar tudo como está.

Redação

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