VIVAS AO SACI. OU MELHOR, VIVAS AOS SACIS
Foi no ano de 1965, durante o governo do presidente Humberto Castello Branco, um dos articuladores do golpe militar de 1964, que o Dia Nacional do Folclore, 22 de agosto, passou a integrar oficialmente as datas comemorativas brasileiras. Mário de Andrade, Renato Almeida, Luís da Câmara Cascudo, Florestan Fernandes, Pedro Teixeira, Ricardo Azevedo, Monteiro Lobato e sua sacizada e tantos outros que se dedicaram e se dedicam a disseminar o conceito de folclore e a cultura popular no Brasil. E, ao contrário do que se pensa, também é expressiva a presença de mulheres na dedicação aos estudos folclóricos: Alexina de Magalhães Pinto, Helena de Magalhães Castro, Dunga Rodrigues, Cecília Meireles, Clarice Lispector, Inezita Barroso, Stephana de Macedo, Maria de Lourdes Borges Ribeiro e tantas mais. Um caldeirão fervilhante de ideias, resultante da sabedoria dos povos indígenas, dos afrodescendentes, da portuguesa, sem esquecer das influências culturais de imigrantes de outras regiões do mundo.
Fonte: Escola Kids
Nada mais junto que no Dia Nacional do Folclore o Saci-Pererê chegue para representar os demais seres que compõem o universo sobrenatural. Isso porque, em qualquer canto do país, o Saci se faz presente, conforme apuração de Monteiro Lobato, ainda que diferenciados fisicamente, como por exemplo com duas pernas, como registrado nas narrativas dos povos indígenas. Curioso é que o Saci tem proteção e admiração no meio político, a lembrar do alagoano Aldo Rebelo que em 2003 levantou a bandeira do Dia do Saci, tendo em suas mãos uma carta da Sociedade dos Observadores do Saci, os apaixonados pelo Saci e suas traquinagens. O Dia do Saci, a ser comemorado no dia 31 de outubro, pretendia fazer frente ao Halloween, o Dia das Bruxas, importado dos Estados Unidos e países anglo-saxões, comemorado no Brasil com grande prestígio nesse mesmo dia. Somente em 2013, a Comissão de Educação e Cultura elaborou o Projeto de Lei Federal n.º 2.479, quando institui o 31 de outubro como sendo o Dia do Saci, proposto pelo Deputado Federal Chico Alencar e a Vereadora Ângela Guadagnin.
Huracán
Fonte: br.pinterest.com
Figuras semelhantes ao Saci-Pererê de uma perna são encontradas também fora do território brasileiro. O ser sobrenatural Huracán, aquele que tem uma perna, se faz presente entre os Maias, civilização mesoamericana. Divindade criadora do mundo e da humanidade, é o temido Deus dos ventos, das tempestades e do fogo. Com seus enormes braços, cria poderosas ventanias.
É inquestionável a diversidade de Sacis por este mundo afora. A rica fusão de culturas responsabiliza-se pelos aspectos do folclore brasileiro, a desenhar seres que fazem parte da identidade cultural e social do país. Identidade também delineada na obra crucial de Luís da Câmara Cascudo, no inquérito de Monteiro Lobato, na fantástica expedição de Mario de Andrade e nos inúmeros estudos que dão continuidade à divulgação da “ciência do povo” e sua contribuição à formação do Brasil.
Anna Maria Ribeiro Costa é etnóloga, escritora e filatelista na temática ‘Povos Indígenas nas Américas’.