Análise de amostras de líquido amniótico das gestantes foi feito em Laboratório de Flavivírus do Instituto Oswaldo Cruz (Foto: Gutemberg Brito/IOC/Fiocruz/Divulgação)
A descoberta feita pelo Laboratório de Flavivírus do Instituto Oswaldo Cruz (IOC-Fiocruz) de que o zika vírus é capaz de atravessar a barreira placentária e chegar até o líquido amniótico, fluido que envolve o feto durante a gravidez, é inédita na ciência mundial.
Resultados de testes feitos no líquido amniótico de duas gestantes que tiveram contato com o zika vírus e cujos bebês foram diagnosticados com microcefalia por exames de ultrassonografia foram divulgados nesta terça-feira (17) em coletiva de imprensa convocada pelo Ministério da Saúde. Na ocasião, representantes da pasta disseram que a expansão de casos de zika vírus é a "principal hipótese" para explicar aumento da ocorrência de microcefalia no Nordeste.
“Em termos científicos, a descoberta é extremamente relevante. Foi a primeira vez no mundo que se detectou a presença do zika em líquido amniótico”, diz Rodrigo Stabeli, vice-presidente de Pesquisa e Laboratórios de Referência da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz).
Ele explica que, como o vírus é muito novo em termos epidemiológicos (os primeiros casos no Brasil foram identificados em abril deste ano), ainda não se sabia se ele teria a capacidade de atravessar a barreira placentária durante a gestação. “A placenta é uma barreira natural que previne infecções por vírus e bactérias. Os testes mostraram que o zika tem a capacidade de atravessar essa barreira importante e se concentrar no ambiente gestacional no interior da placenta.”
Zika vírus e microcefalia
Com esse resultado, é possível afirmar que a microcefalia aconteceu concomitantemente à infecção do zika vírus no ambiente em que o feto está sendo gerado. “Como esse vírus tem uma manifestação importante no sistema nervoso, isso é uma forte evidência de que o vírus possa estar relacionado com a microcefalia, mas ainda é preciso olhar para mais casos e explorar novas correlações para confirmar esse achado", observa Stabeli.
Segundo Stabeli, a descoberta também ajuda na compreensão da biologia e do desenvolvimento do vírus e traz informações importantes que podem ser usadas no combate das infecções virais por zika.
Outro achado interessante foi que, nas duas gestantes, o vírus não estava mais presente em amostras de sangue e de urina, o que significa que o vírus, além de ter entrado no ambiente placentário, tinha conseguido permanecer neste ambiente enquanto já tinha sido eliminado no resto do organismo da gestante.
Método de detecção
Para confirmar a presença do zika no líquido amniótico, as amostras coletadas nas gestantes foram submetidas a um método chamado PCR (sigla para reação em cadeia da polimerase, em inglês). Essa técnica permite amplificar o material genético do vírus presente na amostra, para que ele se torne detectável. Em seguida, foi feito um sequenciamento parcial do genoma do vírus, o que permitiu identificar que trata-se do zika originário da Ásia, e não da África.
Um dos problemas a serem enfrentados em relação ao surgimento de casos de zika vírus no país é que, diferentemente do que ocorre com a dengue, por exemplo, ainda não há um teste padrão para diagnosticar a doença. “Como o zika é novo, não temos uma padronização nos testes. Para se ter certeza do diagnóstico, é preciso usar a técnica de PCR, que é complexa e não está disponível no mercado”, diz o pesquisador.
No Brasil, somente três unidades da Fiocruz, além do Instituto Evandro Chagas, órgão vinculado ao Ministério da Saúde no Pará, têm a capacidade de fazer esse exame.
“Esses laboratórios têm a missão de desenvolver um método melhor de diagnostico para suprir esse problema epidemiológico. A Fiocruz está preocupada em desenvolver metodologias que possam fazer testes mais confiáveis e menos complexos”, diz Stabeli
Fonte: G1