Os deputados estaduais custaram mais de R$ 34 milhões por mês ao Estado com despesas de salários, verba indenizatória, salários de funcionários de gabinetes, verba extra para gabinete e combustível em 2017.
A quantia disponível para cada deputado está distribuída em verba indenizatória (VI) de R$ 65 mil, R$ 6 mil extras para despesas de escritório pra cada chefe de gabinete e mais mil litros de gasolina liberados mensalmente para viagens para o interior de Mato Grosso e circulação dentro de Cuiabá.
A soma das duas primeiras verbas é de R$ 71 mil, que tem pouca variação, considerando as correções orçamentárias de fim de ano da Assembleia Legislativa. Já o preço da gasolina tem variações constantes. Se considerado o preço médio de R$ R$ 3,78 desta semana, divulgado pela ANP (Agência Nacional do Petróleo), cada deputado custa mensalmente R$ 3,78 mil apenas com combustível. O que eleva a verba de assistência para o custo mínimo de R$ 74 mil.
Essa soma se acrescenta ao salário de deputado estadual hoje em R$ 25,3 mil, puxando as despesas para o Estado para R$ 99,3 mil. Mas se considerar os salários de funcionários de gabinete aos quais cada parlamentar tem direito, a despesa fica bem maior.
Sondagem feita pelo Circuito Mato Grosso, em novembro, identificou que cada deputado tem média de dez contratados de confiança em funções auxiliares ao trabalho principal de apresentação de leis.
Os cargos vão de recepcionista de gabinete, assessor parlamentar e de imprensa a auxiliar legislativo. Portaria publicada em junho deste ano pela Mesa Diretora da Assembleia Legislativa indica o ganho de funcionários da Casa, e os salários pagos a servidor de gabinete chega a R$ 11,342. É o caso do gestor de gabinete da presidência e da primeira-secretaria.
Logo abaixo aparece o salário chefe de gabinete da primeira e da segunda vice-presidência, com ganho de R$ 7,6 mil cada. O mesmo salário é pago para chefe de gabinete da segunda, terceira e quarta secretarias e para os contratados ao cargo em gabinete de deputados sem cargo na Mesa Diretora.
No segundo grupo, está o assessor jurídico de gabinete também com salário de R$ 7,6 mil, assessor de imprensa com salário de R$ 5,5 mil. Na sequência estão assistência da presidência com renda salário de R$ 2,6 mil, assistente de gabinete da primeira secretaria, R$ 2,6 mil. A soma desse patamar de despesas eleva os gastos mensais para R$ 144 mil com cada deputado.
Assembleia não fiscaliza verba de R$ 64 mil
A Assembleia Legislativa não dispõe de mecanismo de fiscalização de gastos dos deputados estaduais com verba indenizatória. A rubrica com maior volume em dinheiro disponível para os parlamentares é liberada sem a exigência de especificação de tipo de serviços autorizados a serem cobertos e a apresentação de notas que certifiquem os gastos.
A assessoria de imprensa da Assembleia Legislativa informou que não existe nenhum tipo de restrição para a liberação de R$ 64 mil mensalmente aos deputados, mas afirma que cada deputado tem contabilidade individual das despesas cobertas pela verba indenizatória.
“Um levantamento de quanto é gasto mensalmente com a verba indenizatória teria que ser feito individualmente com cada deputado, porque a Assembleia não tem exigência de comprovantes de gastos para liberar o resultado, exceto o limite de R$ 64 mil por mês”, disse Flávio Garcia, assessor da Casa.
Os exemplos citados de despesas do dinheiro, no entanto, mostram a extrapolação das atividades da função de deputado estadual. O dinheiro, comumente, é usado para promover atividades executivas dos parlamentares, além de cobrir diárias, alimentação e hospedagem em viagem de pessoal de gabinete.
“Se uma comunidade pleiteia a construção de um centro comunitário em determinada área, o deputado usa a verba indenizatória para ajudar na construção do centro. Além disso, cobre despesas de diárias, hospedagem e alimentação, por exemplo, de funcionários de gabinetes, despesas que não são cobertas pela Assembleia”.
Essas despesas também não são cobertas pelos R$ 6 mil liberados mensalmente para os chefes de gabinetes. Essa quantia serve para cobrir despesas com material de escritório (papel A4, clipes, grampos etc.) e outros gastos relacionados às atividades internas de gabinete.
Falta de transparência turva gastos do Poder Público
Cientista político João Edisom
O cientista político João Edisom afirma que gastos com pouca transparência ocorrem em vários órgãos do Poder Público, tanto no Judiciário quanto no Legislativo e Executivo. Situação que aumenta a desconfiança da opinião pública sobre as atividades de gestores.
“Ainda existe muito pouca transparência do que é feito tanto no Legislativo quanto no Judiciário e no Executivo. Apesar de se ter lei que obrigue a publicação de gastos, isso ainda é feito com muita restrição, e nunca se sabe qual é a situação real”.
Ele afirma que a falta de transparência joga contra os órgãos públicos, ocorrem projeções seguidas do aumento dos gastos da gestão pública e o retorno para a sociedade parece cada vez mais ineficiente.
“O questionamento principal é quanto ao salário dos deputados, por exemplo, e da verba indenizatória, uma quantia considerável liberada sem se saber para onde vai. Como dizer se 65 mil reais é quantia muito alta para indenização senão sabemos com que é gasto? A relação custo-benefício parece mais e mais pouco proveitosa, pois a sensação é que pode ter um número reduzido de deputados para fazer o que os de hoje fazem”.
João Edisom afirma que parte da situação está vinculada à falência do sistema político brasileiro. O cientista afirma que modelo proporcional está defasado por falta de boa distribuição da representatividade político em cargos eletivos, o que pode leva à concentração de políticos em apenas uma região, que pode ser a menos a carente.
“Temos um exemplo disso em Mato Grosso. Temos três senadores e todos eles são de Rondonópolis. Outras regiões que são mais carentes não têm representação no Senado”.
Verba a deputados é três vezes maior que renda per capita
Pesquisa publicada pela ONG Transparência Brasil mostra Mato Grosso como o segundo Estado brasileiro com maior diferença entre verba recebida por deputados estaduais e renda per capita. Em 2015, cada parlamentar recebia até R$ 90 mil em verbas enquanto o ganho de cada morador do Estado tinha um teto de aproximadamente R$ 30 mil, valor três vezes menor.
Essa discrepância só é maior em Roraima, onde para cada R$ 95 mil disponíveis para deputados estaduais o habitante tinha renda aproximada de R$ 20 mil.
A Transparência Brasil dividiu estados e capitais em grupos de maiores e menores PIBs (Produto Interno Bruto) per capita e confrontou os tamanhos das economias com os gastos com parlamentares – que incluem salários, verbas e auxílios diversos a deputados estaduais e vereadores.
O resultado foi que os estados mais pobres gastam em média 20% a mais do que os ricos com despesas de agentes políticos; capitais mais pobres, 16% a mais. O Pará, por exemplo, que tem um terço do PIB per capita de São Paulo, gasta 30% a mais por deputado estadual. As verbas de 12 Assembleias Legislativas foram analisadas.
Enquanto a base média do PIB per capita é de R$ 11.873, seus gastos com salários e verbas são 20% mais altos do que os dos 12 estados do topo – que têm R$ 28.686 de PIB per capita. Em média, são R$ 61.556 mensais gastos com verbas parlamentares nas economias pobres contra R$ 51.318 dos Estados mais abastados.
A pesquisa apontou também que Mato Grosso tinha a maior verba indenizatória do país. Em 2015, os deputados estaduais tinham acesso a cerca de R$ 65 mil, bem acima do Estado que ficou em segundo lugar, Roraima, que cedia menos de R$ 50 mil para indenização a deputados.
A média brasileira no ano era de R$ 35 mil. Conforme a Transparência Brasil, Mato Grosso tinha a situação “mais absurda” na distribuição da verba. O pagamento deixou de ser indenizatório. Os R$ 65 mil são depositados automaticamente na conta do parlamentar, sem a obrigação de apresentar recibos ou faturas de despesas.
“Mato Grosso tem o caso mais absurdo: além de ter a Assembleia Legislativa com a cota mais alta do país, os parlamentares não precisam mais apresentar comprovantes fiscais antes de receber o dinheiro”.