Mix diário

Dólar volta subir e renova pico histórico com exterior e fiscal; Ibovespa sobe 0,22% na semana

Após três pregões seguidos de queda, o dólar não apenas voltou a subir no mercado doméstico nesta sexta-feira, 6, como renovou novo pico histórico nominal no fechamento. Além de ajustes de prêmios de risco associados à incerteza fiscal, diante de receios crescentes de desidratação do pacote de contenção de gastos do governo no Congresso, a queda do real está ligada à valorização global da moeda americana e ao tombo das commodities, em especial do petróleo e do minério de ferro.

Dados do relatório de emprego (payroll) nos EUA em novembro vieram mistos, com geração de vagas acima do previsto, mas aumento da taxa de desemprego. Já os números preliminares da confiança do consumidor americano subiram para nível superior às expectativas na passagem de novembro para dezembro. Embora tenham aumentado hoje as apostas de que o Federal Reserve vai promover nova redução da taxa básica americana em 25 pontos-base neste mês, há receio de que haja menos espaço para afrouxamento monetário ao longo de 2025.

Com máxima a R$ 6,0925 à tarde, em sintonia com o exterior, o dólar à vista fechou em alta de 1,02%, a R$ 6,0708, maior valor nominal de fechamento da história do real, após os R$ 6,0680 no último dia 2. A moeda encerrou a primeira semana de negócios em dezembro com valorização de 1,16%, após ter subido 3,81% em novembro. No ano, o dólar tem ganhos de 25,54% em relação ao real.

Lá fora, o índice DXY, termômetro do comportamento da moeda americana em relação a uma cesta de seis divisas fortes, voltou a superar os 106,100 pontos, com máxima aos 106,121 pontos à tarde, sobretudo em razão de ganhos frente ao euro. Parte dos analistas aposta em enfraquecimento ainda maior da moeda europeia, dado o dinamismo da economia americana e a perspectiva de cortes maiores de juros pelo Banco Central Europeu (BCE). Entre divisas emergentes e de exportadores de commodities, as maiores perdas foram do real e do dólar australiano e neozelandês.

O economista-chefe da Nova Futura Investimentos, Nicolas Borsoi, pondera que, apesar dos fatores globais desfavoráveis, o real sofreu mais que pares hoje com a busca de posições mais defensivas à medida que se aproxima a decisão do Comitê de Política Monetária (Copom), na próxima quarta-feira, 11. Ele chama a atenção para a possibilidade de o relatório Focus, que sai na segunda-feira, 9, trazer revisão significativa para cima do IPCA de 2025.

“Parte do mercado já espera 100 pontos-base de alta da Selic na semana que vem. Vejo já um movimento de investidores tentando se proteger do risco de o comitê entregar menos do que precisa para estancar a desancoragem das expectativas em momento de aumento da incerteza fiscal”, afirma Borsoi, acrescentando que parecem crescer as chances de desidratação do pacote de corte de gastos, “que já não era ideal”, durante a tramitação das medidas no Congresso.

Deputados ouvidos pelo Estadão, em especial do PT, admitiram resistência a aprovar regras que endurecem o acesso de idosos e pessoas com deficiência de baixa renda ao Benefício de Prestação Continuada. Alterações no BPC constam tanto no projeto de lei complementar (PLP) que revê programas sociais quanto na Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que traz as medidas fiscais. O governo espera economizar R$ 2 bilhões por ano com a revisão no BPC e R$ 12 bilhões ao longo de seis anos.

“Os desdobramentos do pacote de corte de despesas continuam influenciando os mercados, com impacto possivelmente menor que o estimado pelo governo. A resistência a pontos específicos, como os ajustes do BPC, indica uma possível desidratação do projeto inicial, contribuindo para a piora dos ativos domésticos”, afirma a economista-chefe da Armor Capital, Andrea Damico, ressaltando que o real termina a semana com desempenho pior em comparação com o seus pares.

Ibovespa

O Ibovespa conseguiu preservar leve ganho de 0,22% na semana, ao fim de sessão que se mostrou o inverso da anterior. Hoje, o índice da B3 devolveu a alta de 1,40% registrada ontem, em baixa de 1,50%, aos 125.945,67 pontos, entre mínima de 125.833,31 e máxima de 127.871,80 nesta sexta-feira, em que saiu de abertura aos 127.856,01 pontos. Dessa forma, manteve o padrão de alternar ganhos e perdas diários desde 28 de novembro, quando mergulhou 2,40% na reação inicial ao pacote de ajuste fiscal, detalhado pela equipe econômica na manhã daquela quinta-feira.

Enquanto a sexta-feira foi de ganhos para os principais índices de Nova York – com destaque para o Nasdaq, em alta de 0,81%, e assim como o S&P 500 em nível recorde de fechamento -, a cautela voltou a prevalecer na B3, ante a retomada de pressão na curva de juros, especialmente em vencimentos como os de janeiro de 2027 e 2029, e de elevação do dólar frente ao real. Na máxima do dia, a moeda americana foi negociada à vista a R$ 6,09 e, no encerramento, mostrava alta de 1,02%, a R$ 6,0708, com avanço de 1,16% nesta primeira semana de dezembro. No ano, o Ibovespa recua agora 6,14%. O giro financeiro desta sexta-feira foi a R$ 23,4 bilhões.

O desempenho desta semana inicial de dezembro, contudo, pode ser visto como uma relativa acomodação após a retração de 2,68% vista no último intervalo de novembro, então sob a pesada influência da má recepção ao escopo – tido como insuficiente e pouco exequível – do pacote fiscal. Nesta semana, as atenções se voltaram à tramitação no Congresso, com expectativa de alguma celeridade e de ajustes a princípio benignos à proposta encaminhada pelo governo – os mais recentes desdobramentos, porém, sugerem que em vez de melhorar o pacote, parlamentares de oposição e da situação possam diluí-lo ainda mais, o que se refletiu hoje, principalmente, no comportamento do câmbio e dos juros futuros.

Neste contexto, apesar de um relativo alívio na semana, os investidores optaram hoje por colocar a recuperação do dia anterior no bolso, com os papéis de maior liquidez e peso no índice, como os de commodities e bancos, devolvendo a alta de ontem, que havia sido bem distribuída na sessão. Hoje, Vale ON caiu 1,71%, enquanto Petrobras ON e PN mostraram perdas de 2,07% e 1,54% no fechamento.

Entre os grandes bancos, as ações chegaram ao fim do dia com variação entre -1,05% (Santander Unit) e -2,94% (BB ON). Na ponta perdedora do Ibovespa, nomes associados ao ciclo doméstico como CVC (-11,59%) e Magazine Luiza (-7,07%), sensíveis a juros ou a câmbio, bem como Pão de Açúcar (-8,14%) e Azul (-7,22%). No lado oposto, Embraer (+1,70%), B3 (+1,53%) e WEG (+1,22%). Apenas 12 dos 86 papéis da carteira Ibovespa conseguiram fechar a sessão com algum ganho.

“Dia negativo para os ativos brasileiros, com alta no dólar e muito prêmio ainda na curva de juros doméstica, que já sinaliza Selic terminal a 15% no atual ciclo monetário, por conta da desancoragem provocada pelo governo”, diz Matheus Spiess, analista da Empiricus Research, referindo-se à “comunicação errada” de um “pacote insuficiente”, que resulta em “frustração contínua” do mercado com relação ao “comprometimento e a responsabilidade fiscal” do governo. “Por melhor que tenha sido a notícia, o anúncio do acordo comercial entre Mercosul e União Europeia acabou escanteado” na sessão, ante a aversão a risco que ainda prevalece.

Dessa forma, “o rali de final de ano”, que começa a ser observado em mercados do exterior, acaba não se espraiando para as ações brasileiras, mantendo assim o Ibovespa na contramão do otimismo com que se vê outros índices, globalmente. “Sentimento para a B3 continua pesado, tendo em vista as preocupações e a perspectiva para o fiscal, mesmo com a promessa que chegou a ser sinalizada de endurecimento” na proposta do governo durante a tramitação pelo Congresso, acrescenta o analista. “Há ainda possibilidade de minimização de danos, mas o governo perdeu o benefício da dúvida”, diz Spiess, em referência à crise de credibilidade fiscal.

Para Bruna Centeno, sócia e advisor da Blue3 Investimentos, a luta ao fim perdida do Ibovespa para sustentar os 126 mil pontos na sessão reflete também a dinâmica da valorização do dólar e a expectativa pela decisão do Federal Reserve, na próxima semana, sobre os juros dos Estados Unidos – em sexta-feira de dados mistos sobre a economia americana, que não se sabe bem, ainda, como serão interpretados pelo Fed na deliberação da quarta-feira, 11. “Mercado daqui refletiu hoje também o externo, especialmente o relatório oficial sobre o mercado de trabalho, o payroll, além das questões fiscais domésticas”, aponta.

Destaque da agenda internacional nesta sexta-feira, o payroll de novembro, divulgado pela manhã, apontou a criação de 227 mil vagas de trabalho nos Estados Unidos, em leitura acima da expectativa de consenso para o mês. Houve também revisões em alta para os dois meses anteriores, que adicionaram 56 mil vagas ao intervalo, observa Gustavo Sung, economista-chefe da Suno Research. Ele acrescenta que, para novembro, já se esperava uma retomada do mercado de trabalho nos EUA, em relação aos efeitos transitórios do furacão Milton e de greves no setor industrial, como na Boeing, que haviam afetado o resultado de outubro.

No Brasil, as expectativas do mercado financeiro quanto ao desempenho das ações no curtíssimo prazo estão mais equilibradas no Termômetro Broadcast Bolsa desta sexta-feira. Entre os participantes, a percepção de alta e a de estabilidade têm agora fatia de 40%, cada, enquanto para 20% a semana que vem será de perdas para o Ibovespa. Na pesquisa anterior, a projeção majoritária, com 50%, era de estabilidade para o índice na atual semana, contra 33,33% que esperavam avanço e 16,67% que previam baixa.

Juros

Os juros futuros aceleraram o ritmo de alta à tarde, chegando a avançar mais de 40 pontos-base na ponta longa no pico do estresse, com o mercado ampliando posições de hedge ante a deterioração do cenário fiscal. A escalada do dólar também contribuiu para pressionar a curva.

A taxa do contrato de Depósito Interfinanceiro (DI) para janeiro de 2026 subiu a 14,35%, de 14,19% ontem no ajuste, e a do DI para janeiro de 2027 saltou a 14,69%, de 14,43%. O DI para janeiro de 2029 encerrou com taxa de 14,37% (de 14,12%). Na semana, a curva toda avançou, com ganho de inclinação.

Nas mesas de renda fixa, a avaliação é de que o comportamento das taxas não teve hoje qualquer racionalidade e falava-se em aumento da disfuncionalidade. Nem o payroll dos EUA nem o histórico fechamento do acordo entre o Mercosul e a União Europeia foram capazes de mobilizar o mercado, que, mesmo sem novidades no noticiário sobre as medidas fiscais, ficou ruminando durante toda a sessão o risco de desidratação do pacote que foi encaminhado pelo Executivo, já considerado fraco.

Há relatos de resistência, por deputados da oposição e da situação, a mudanças no Benefício de Prestação Continuada (BPC) que constam tanto no projeto de lei complementar (PLP) que revê programas sociais quanto na Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que esmiúça as medidas fiscais. O BPC bateu novo recorde de gastos nos últimos 12 meses até outubro, com R$ 110 bilhões em despesas, segundo dados do Tesouro, um crescimento de 16,8% em relação a igual período de 2023.

Nos últimos dias o mercado vinha apostando no Congresso como fiador do pacote, depois da aprovação do pedido de urgência de tramitação na Câmara, com o presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), falando em colocar para votar nesta ou na próxima semana.

Carlos Kawall, sócio-fundador da Oriz Partners, diz não estar surpreso com o desempenho dos ativos. “Não me surpreende, depois que o governo passou a atacar o mercado, anunciou que vai fazer propaganda da isenção de R$ 5 mil e há resistências ao pacote no Congresso e Judiciário”, resumiu o ex-secretário do Tesouro.

Para o CEO da Azimut Brasil Wealth Management, Wilson Barcellos, o mercado passou a depositar suas fichas no Congresso para salvar o plano fiscal, “uma vez que parece que o Executivo está dobrando a aposta”, referindo-se ao expansionismo fiscal que, segundo ele, tem sustentado o forte crescimento do PIB. Assim, acabou “sobrando” para o Banco Central o papel de endurecer a política monetária para conter a deterioração das expectativas. Resta saber se a estratégia do Copom será a de aplicar um choque de juros com aumento de 1 ponto na Selic na reunião de dezembro e sinalização da mesma dose para a próxima, ou ir no compasso de 0,75 ponto com discurso “hawkish”, diz.

A alta do dólar, que chegou novamente perto dos R$ 6,10 nas máximas do dia, também desestimulou o apetite pelo risco, na medida em que vai crescendo a preocupação com o impacto sobre os preços. A cotação renovou máxima nominal histórica, encerrando em R$ 6,0708.

“A gente deve ver uma revisão altista significativa do IPCA de 2025 no Focus e, com a curva já cravando 100 pontos, o mercado já discute se o Copom não precisa partir pra terapia de choque”, afirma o economista-chefe da Nova Futura Investimentos, Nicolas Borsoi, afirmando que já tem quem defenda elevação de 1,5 ponto.

Nesta tarde, os DIs não só projetavam integralmente a aposta de aumento de 1 ponto da Selic para dezembro, como taxa terminal de 15,75%. Nas opções digitas da B3, a chance de alta de 1 ponto para a próxima semana subiu de 40,00% ontem para 58,00% e a de 0,75 caiu de 50% para 31%.

Estadão Conteudo

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