O dólar emendou nesta quarta-feira, 19, o sétimo pregão consecutivo de queda no mercado local, na contramão do sinal predominante de alta da moeda americana no exterior, e encerrou no menor nível desde meados de outubro.
O real apresentou o melhor desempenho entre as divisas mais relevantes, em meio a relatos de continuidade desmonte de posições defensivas por parte de investidores estrangeiros à espera de nova alta da taxa Selic em 1 ponto porcentual pelo Comitê de Política Monetária (Copom) no período da noite.
Em leve baixa desde o início da tarde, o dólar renovou mínimas na casa de R$ 5,63 após a decisão de política monetária do Federal Reserve (Fed, o banco central norte-americano), seguida por entrevista coletiva do presidente da instituição, Jerome Powell.
Como esperado, o BC dos EUA manteve a taxa básica no nível entre 4,25% e 4,50%. A surpresa ficou por conta da diminuição do ritmo de redução do balanço do Fed, o que na prática significa drenar menos liquidez do mercado.
Chamaram a atenção dos analistas também o anúncio da diminuição das projeções para o crescimento, em ambiente de alta incerteza em razão da política tarifária de Donald Trump, e o fato de nove dirigentes do Fed projetarem taxas de juros 50 pontos-base menores no fim deste ano.
Com mínima a R$ 5,6325, o dólar fechou em queda de 0,42%, a R$ 5,6480 – menor nível desde 14 de outubro (R$ 5,5827).
A divisa já acumula perdas de 1,66% na semana e de 4,53% em março – o que leva a desvalorização em 2025 a 8,61%.
“O corte expressivo na estimativa para o crescimento confere um tom dovish ao comunicado do Fed”, afirma o economista-chefe da Ativa Investimentos, Étore Sanchez, em referência à redução da projeção de alta do PIB dos EUA neste ano de 2,1% para 1,7%.
Powell reiterou em coletiva de impressa que a política monetária está bem posicionada para lidar com o duplo mandato da instituição (inflação na meta e máximo emprego) e que não há pressa em alterá-la, ainda mais com o nível de incerteza “incomumente elevado”.
O presidente do Fed ressaltou que é prematuro avaliar o impacto das políticas de Trump para comércio e imigração sobre os índices de preços, mas resgatou uma expressão utilizada à época da pandemia ao dizer que o cenário-base é de inflação “transitória”.
No exterior, as bolsas em Nova York renovaram máximas ao longo da tarde, enquanto as taxas dos Treasuries acentuaram a queda. Termômetro do comportamento do dólar em relação a uma cesta de seis divisas fortes, o índice DXY reduziu levemente o ritmo de alta.
“Na minha opinião, o Fed veio com um discurso mais dovish, apesar de Powell dizer que vai esperar para ver a reação da inflação e da atividade ao governo Trump”, afirma o chefe da mesa de câmbio da EQI Investimentos, Alexandre Viotto. “Nove integrantes do Fed veem dois cortes de 25 pontos-base neste ano. Isso animou o mercado.”
Ferramenta de monitoramento do CME Group mostra que as maiores chances são de queda acumulada de 50 pontos-base na taxa americana neste ano, com probabilidade maior (acima de 60%) de corte inicial em junho. Houve um ligeiro aumento da possibilidade de redução total de 75 pontos-base.
Com a perspectiva de queda de juros nos EUA e a possível alta adicional da taxa Selic após a decisão do Copom, o real se torna mais atraente para operações de carry trade. Outra consequência do aperto monetário local é o aumento do custo de carregamento de posições compradas em dólar.
Dados da B3 compilados pela Warren Investimentos mostram que apenas na terça-feira os estrangeiros reduziram as posições compradas em US$ 1,9 bilhão. Do fim do ano para cá, o não residente diminuiu o estoque em derivativos cambiais (dólar futuro, mini contratos, swaps cambial e cupom cambial) de cerca de US$ 70 bilhões para pouco mais US$ 40 bilhões.
Viotto, da EQI, observa que seria natural esperar que o real se apreciasse com a elevação da taxa Selic e o potencial aumento do diferencial de juros interno e externo.
Ele considera, contudo, que o desempenho da moeda brasileira no ano possa estar ligado também uma antecipação do calendário eleitoral, que pode resultar em ascensão de um nome da direita, em tese mais ligado à pauta de austeridade fiscal.
“É difícil entender o otimismo com o Brasil sem pensar no cenário eleitoral, até com as apostas se aglutinando em torno do nome do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas”, afirma Viotto.
Ibovespa
Em linha com a acentuação de ganhos em Nova York a partir do meio da tarde – com a decisão sobre juros do Fed, novas projeções do BC dos Estados Unidos e a entrevista coletiva de seu presidente, Jerome Powell -, o Ibovespa ganhou ímpeto e encerrou a sessão em alta de 0,79%, aos 132.508,45 pontos, tendo se aproximado dos 133 mil pontos na máxima do dia, aos 132.984,25 – o nível de 133 mil não é visto desde 3 de outubro, durante sessões.
O giro financeiro foi a R$ 25,6 bilhões nesta quarta-feira de decisão também sobre juros no Brasil, à noite. Hoje, o Ibovespa renovou a máxima de fechamento do ano pela quarta sessão seguida – o que o coloca, agora, no maior nível desde o encerramento de 2 de outubro.
Entre as blue chips, Vale (ON -0,17%) destoou da progressão vista na sessão, em que o Ibovespa emendou o sexto ganho diário, um pouco mais perto da sequência de oito altas da primeira quinzena de agosto passado, mês em que o índice da B3 registrou sua mais recente máxima histórica, na casa dos 137 mil. Na semana, acumula ganho de 2,75%, elevando o do mês a 7,91% e o do ano a 10,16%.
Saindo da casa dos 123 mil pontos, no primeiro fechamento do mês, para buscar os 132 mil ainda dentro de março, o Ibovespa tem contado com o aumento do fluxo de investimento estrangeiro: no mês, o saldo está em torno de R$ 4,5 bilhões e, no ano, supera R$ 13 bilhões em termos líquidos, ressalta João Paulo Fonseca, head de Renda Variável da HCI Advisors. “Brasil tem aproveitado bem a migração de capital dos Estados Unidos onde os preços doas ativos em Bolsa estavam muito esticados para outros mercados, como os emergentes, e também os da Europa”, acrescenta Pedro Moreira, sócio da One Investimentos.
Na B3, em direção ao fechamento, Petrobras chegou a ensaiar direção única, mas encerrou o dia com a ON ainda em alta de 0,48% e com a PN pouco abaixo da estabilidade (-0,08%). Em Nova York como em Londres, houve avanço para as cotações da commodity em meio a aumento das tensões no Oriente Médio e à retomada de ataques entre Rússia e Ucrânia, no leste europeu. Entre os grandes bancos, destaque para Santander (Unit +1,01%) e Bradesco (ON +1,16%, PN +0,89%), enquanto Banco do Brasil encerrou na mínima da sessão, em baixa de 0,39%.
Na ponta ganhadora do Ibovespa, ações associadas ao ciclo doméstico, favorecidas pela retração da curva do DI, como Vivara (+7,57%), LWSA (+6,15%), Vamos (+5,39%) e CVC (+5,13%) – e também pelo projeto de isenção do IR para contribuintes com renda mensal de até R$ 5 mil, o que deve disponibilizar mais dinheiro para consumo em uma parte da classe média, observa Fonseca, da HCI. No lado oposto nesta quarta-feira, Hapvida (-4,24%), SLC Agrícola (-3,52%) e Telefônica Brasil (-1,40%).
Destaque da agenda global na tarde de hoje, as projeções do Federal Reserve indicaram a possibilidade de dois cortes nos juros de referência dos Estados Unidos em 2025, “embora haja divergências entre os membros sobre o real espaço para flexibilização da política monetária, considerando que o custo do crédito ainda pressiona o consumo e a atividade econômica” no país, ressalta Willian Andrade, CIO da Kaya Asset Management.
Conforme esperado, o Fed decidiu manter a taxa de juros de referência na faixa de 4,25% a 4,50% ao ano, “destacando o aumento da incerteza econômica e o impacto do aperto monetário sobre as famílias americanas”, diz Andrade.
Passado o Fed, o mercado aguarda a decisão desta noite do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central, para a qual precifica nova alta de 100 pontos-base na Selic, o que a elevaria a 14,25% ao ano. Com consenso para o grau de ajuste da política monetária, a atenção se volta para os passos seguintes da instituição, que poderão ser entrevistos nos termos do comunicado sobre a decisão.
“No caso brasileiro, a dúvida é como o BC vai se portar para o futuro, se contratará na reunião um forward guidance de novos aumentos, ainda que com menor magnitude – duas elevações de meio ponto porcentual, por exemplo – ou se vai seguir o parágrafo sétimo da ata e esperar que a desaceleração da atividade aconteça”, avalia Roberto Simioni, economista-chefe da Blue3 Investimentos.
“A grande expectativa do mercado é como vai ser a sinalização desse novo banco central com Gabriel Galípolo na presidência desde janeiro. Lembrando que, no meio de dezembro, chegou-se a precificar uma Selic de quase 17,5% ao ano”, diz Jonas Chen, gestor da B.Side Investimentos.
Juros
As taxas dos contratos de Depósito Interfinanceiro (DI) passaram a cair, acompanhando os juros dos Treasuries após a decisão do Federal Reserve, e fecharam o pregão em baixa. O foco dos investidores agora se desloca para a decisão do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central, que deve elevar a Selic de 13,25% para 14,25%, e para eventuais sinalizações sobre a trajetória da taxa básica brasileira.
O banco central americano manteve os juros intactos, como esperado, mas em comunicado ressaltou a incerteza econômica e decidiu enxugar mais devagar a liquidez injetada no sistema financeiro. Além disso, a instituição reduziu a previsão de crescimento dos Estados Unidos, e a maioria dos membros do comitê de política monetária indicou que espera diminuição nos juros no decorrer deste ano, mesmo diante dos sinais de pressão inflacionária crescente.
Para a economista-chefe da CM Capital, Carla Argenta, o conjunto de elementos da decisão do Fed faz prevalecer a expectativa de juros mais baixos nos Estados Unidos, ainda que o presidente Jerome Powell tenha reforçado que a instituição não terá pressa para ajustar a taxa dos Fed Funds.
Gustavo Sung, economista-chefe da Suno Research, ressalta que o fato de os membros do comitê de política monetária do Fed ainda verem chances de cortes nos juros, mesmo sob o cenário que se desenha, justifica a queda das taxas de Treasuries – e, por tabela, dos DIs.
Passada a decisão do Fed, os investidores se preparam para a decisão do Copom, a partir das 18h30. O mercado espera que o colegiado cumpra o prometido e eleve a Selic em 1 ponto porcentual, mas estará atento à avaliação das autoridades sobre os riscos à economia e a sinalizações sobre os próximos níveis da taxa básica.
Argenta afirma que a interpretação do Copom sobre os sinais de desaquecimento da economia serão um ponto relevante a se observar no comunicado. Sung espera que o Copom mantenha em aberto a magnitude das próximas altas da Selic, mas reforce no comunicado que ainda deve apertar a política monetária.
A taxa do contrato de DI para janeiro de 2026 caiu a 14,720%, de 14,73% no ajuste anterior. A taxa para janeiro de 2027 diminuiu a 14,400%, de 14,424%, e a taxa para janeiro de 2029 recuou a 14,110%, de 14,188%.