Após quatro pregões consecutivos de queda, em que acumulou desvalorização de 1,81%, o dólar subiu nesta terça-feira, 21, alinhado ao comportamento da moeda americana no exterior. Investidores adotaram postura mais cautelosa diante das incertezas em torno das negociações comerciais entre China e Estados Unidos e da continuidade do shutdown do governo norte-americano.
Pela manhã, a taxa de câmbio chegou a tocar o nível de R$ 5,40, mas moderou o ritmo de alta ao longo da tarde, com ajustes e movimentos de realização de lucros intradia, e chegou a operar pontualmente em ligeira baixa. Com mínima de R$ 5,3706 e máxima de R$ 5,4050, fechou a R$ 5,3906, avanço de 0,37%. Os ganhos em outubro são de 1,27%. No ano, a moeda americana recua 12,78% em relação ao real, que exibe o melhor desempenho entre as divisas latino-americanas no período.
Em evento na Casa Branca, o presidente dos EUA, Donald Trump, adotou falas contraditórias sobre seu encontro com o presidente da China, Xi Jinping, com quem reafirmou ter uma “ótima relação” Após ter reiterado que se encontraria com o chinês em duas semanas, na Coreia do Sul, Trump voltou atrás e não garantiu a realização da reunião bilateral. “Nos daremos bem nas negociações com a China”, disse o americano, acrescentando que as “tarifas são uma questão de segurança nacional”.
O economista-chefe da Western Asset, Adauto Lima, não identifica um gatilho específico para a alta do dólar nesta terça, mas ressalta que o ambiente global é marcado por incertezas cada vez maiores, o que tende a deixar os ativos mais voláteis. Ele observa que qualquer episódio de estresse que envolva a China tende a castigar mais as divisas latino-americanas. Foi assim no último dia 10, quando Trump ameaçou impor tarifas de 100% aos chineses a partir de 1º de novembro.
“O real está até se comportando bem hoje, provavelmente por conta do diferencial de juros interno e externo. O quadro fiscal doméstico é ruim, mas não vejo questões idiossincráticas afetando o câmbio, que está mais ligado à dinâmica global”, afirma Lima.
Operadores viram influência reduzida de declarações do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, à tarde sobre a formação da taxa de câmbio. Em entrevista à GloboNews, Haddad revelou que a Casa Civil encaminhará ainda nesta terça dois projetos ao Congresso para a derrubada da Medida Provisória (MP) alternativa à alta do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF).
Um dos projetos trará revisão de despesas, com impacto estimado em mais de R$ 15 bilhões, enquanto o outro será voltado ao aumento de arrecadação. Os projetos devem abranger volta de ao menos parte da alta do IOF, regras mais rígidas para concessão de seguro defeso, limitação para compensações tributárias, taxação de bets e elevação da Contribuição Social sobre Lucro Líquido (CSLL) para fintechs.
Termômetro do comportamento do dólar em relação a uma cesta de seis moedas fortes, o índice DXY subia cerca de 0,40% no fim do dia, aos 98,960 mil pontos, com máxima aos 98,979 pontos. O iene amargou queda de mais de 0,80% em relação ao dólar, abalado pela eleição da ultraconservadora Sanae Takaichi como primeira-ministra.
A alta do dólar lá fora se deu em meio a um tombo de mais de 5% do ouro, a primeira queda de tal magnitude em um único pregão em 12 anos. Investidores parecem ter optado por uma realização de lucros após o rali recente do metal, recompondo parcialmente posições na moeda americana e nos Treasuries, cujas taxas recuaram.
Lima, da Western Asset, afirma que o “apagão” de dados nos EUA, em razão do shutdown, torna difícil avaliar as condições da economia americana e deixa os investidores em compasso de espera por sinais de dirigentes do Federal Reserve. Embora a leitura da inflação ao consumidor americano em setembro, que será divulgada no dia 24 (apesar do shutdown), deva ser ruim, Lima acredita que o Fed vai optar por novo corte de 25 pontos-base na taxa básica de juros dos EUA no fim do mês.
“A visão um pouco mais dovish dentro do Fed deve prevalecer. Vão seguir neste mês com o plano de reduzir os juros agora e depois avaliar se será possível ter uma sequência de cortes à frente”, afirma Lima, ressaltando que, por ora, há uma benevolência dos investidores com outras moedas. “No caso do real, ainda temos a Selic em 15%.”
Bolsa
Após dois dias de moderada recuperação que o recolocaram durante a sessão da segunda-feira – mas não no fechamento – a 145 mil pontos, em nível do começo de outubro, o Ibovespa voltou a fazer uma pausa nesta terça-feira, ainda acomodado aos 144 mil Nesta terça, da mínima à máxima da sessão, oscilou dos 143 829,26 aos 144.795,18 pontos, saindo de abertura aos 144.509,27 pontos. Ao fim, marcava 144.085,15 pontos, em leve baixa de 0,29%, com giro enfraquecido a R$ 15,7 bilhões. Na semana, ainda sobe 0,48% no agregado de duas sessões, limitando a perda do mês a 1,47%. No ano, o ganho acumulado se mantém perto de 20%, a 19,79%.
Após as blue chips terem mostrado, na maioria, fôlego na sessão anterior, voltaram ao campo negativo nesta terça-feira, com destaque entre os bancos para BB (ON -1,11%), Bradesco (ON -0,98%; PN -1,33%, mínima do dia no fechamento) e Itaú (PN -0,94%). Entre os carros-chefes das commodities, Petrobras permaneceu enfraquecida como na sessão da segunda (nesta terça, ON -1,05%, PN -0,81%) e Vale ON, a principal ação da carteira Ibovespa, oscilou um pouco para baixo (-0,16% no encerramento). Na ponta ganhadora do índice, Vamos (+6,90%), Embraer (+5,12%) e Raízen (+4,35%). No lado oposto, Brava (-5,84%), Pão de Açúcar (-3,24%) e B3 (-2,61%).
“As ações da Petrobras recuaram mesmo após a licença do Ibama para a Margem Equatorial: o corte no preço da gasolina anunciado ontem pela estatal e a queda do petróleo no mercado internacional reduzem as margens e pressionam o setor de energia”, diz José Áureo Viana Júnior, sócio da Blue3 Investimentos. “Vale também operou em leve baixa, com cautela antes da divulgação de números operacionais após o fechamento de hoje”, apesar do avanço do minério de ferro na China nesta terça-feira.
Em contrapartida, diz ele, alguns papéis do setor de varejo têm mostrado avanço, com a perspectiva de melhora do consumo doméstico, ante o possível alívio no preço dos combustíveis na ponta final, o que favorece também projeções de inflação ainda mais baixas – as quais já vêm caindo, repetidamente, nas projeções semanais do Boletim Focus. O especialista destaca, na sessão, o desempenho de nomes do setor como Natura (+0,82%), Lojas Renner (+2,31%) e Magazine Luiza (+0,24%), na contramão do Ibovespa nesta terça-feira.
“O clima global é de leve otimismo com a possibilidade de um acordo comercial entre EUA e China, após sinalizações de trégua tarifária por Donald Trump. No campo geopolítico, seguem as tensões no Oriente Médio, e há rumores de uma possível reunião entre Trump e Putin em Budapeste”, diz Gustavo Trotta, especialista e sócio da Valor Investimentos.
“Houve distensão importante no cenário externo nos últimos dias, embora permaneçam algumas incertezas com relação ao quadro comercial. Vale e bancos, que haviam subido ontem, hoje passaram por ajuste, antes dos dados de produção da mineradora. Há devolução de prêmio ainda na curva de juros, mas por mais que operem em queda os contratos de DI, o dólar subiu hoje”, o que interfere no apetite por ações, observa Matheus Spiess, analista da Empiricus Research. No fechamento, a moeda norte-americana mostrava alta de 0,37%, a R$ 5,3906.
Juros
Em meio às idas e vindas nas declarações do presidente norte-americano Donald Trump e autoridades americanas em relação à China, os investidores mostraram maior apetite por ativos de renda fixa e a queda dos Treasuries foi ampliada, o que forneceu alívio aos juros futuros negociados na B3 no pregão desta terça-feira, 21, a despeito do fortalecimento global do dólar.
A sessão foi de baixa liquidez nos negócios e agenda de indicadores esvaziada, mas as taxas encontraram espaço adicional para recuar, em grande medida apoiadas pela movimentação no ambiente externo.
Encerrados os negócios, a taxa do contrato de Depósito Interfinanceiro (DI) para janeiro de 2027 diminuiu de 13,967% no ajuste de segunda-feira para 13,940%. O DI para janeiro de 2028 cedeu de 13,282% no ajuste a 13,255%. O DI para janeiro de 2029 marcou 13,220%, vindo de 13,239% no ajuste antecedente. O DI para janeiro de 2031 caiu de 13,522% no ajuste a 13,495%.
No início da tarde, Trump voltou atrás e disse que uma reunião com seu homólogo chinês Xi Jinping daqui a duas semanas na Coreia do Sul, conforme previsto, “talvez não aconteça”. Mas reiterou que tem uma ótima relação com Xi e que espera que o presidente chinês faça um ótimo acordo para o país asiático, que também seja positivo para os americanos.
Estrategista de renda fixa da Daycoval Corretora, Paulo Henrique Oliveira observa que a liquidez foi reduzida na sessão também nos mercados globais, o que deixa o desempenho dos ativos em geral mais suscetíveis ao fluxo de notícias. “Trump está causando bastante incerteza com suas falas sobre Xi Ji Ping. Mas achamos que o mercado global está ligeiramente mais otimista com uma reunião entre os dois”, afirma.
Como evidência dessa visão mais favorável, mesmo com o tom errático do republicano, Oliveira menciona que o índice VIX, espécie de termômetro do medo em Wall Street, recuava cerca de 3% enquanto Trump falava sobre a China por volta das 14h00 e, pouco mais de uma hora depois, cedia mais de 4%. “Isso reforça a ideia de que o mercado, embora existam dúvidas, tem aposta muito positiva sobre a redução das tarifas para a China, o que resulta em maior crescimento global”, aponta o estrategista, para quem o principal vetor da queda dos DIs hoje veio do exterior.
Por aqui, sem publicação de dados para guiar os negócios, os investidores continuaram atentos a notícias que podem impactar o quadro fiscal. Pela manhã, a Broadcast (sistema de notícias em tempo real do Grupo Estado) informou que Ministério da Fazenda e Casa Civil estão preparando uma resposta à derrota da Medida Provisória (MP) 1.303, que apresentava alternativas ao aumento do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) e foi derrubada pela Câmara.
Segundo fontes próximas do tema, as compensações serão compostas por revisão de despesas e aumento de receitas, ainda que esta segunda parte esteja em aberto. Em entrevista concedida à GloboNews, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, reafirmou que o governo deseja que o Congresso “se debruce” sobre bets e outras possíveis fontes de receitas para fazer frente à perda de arrecadação com a derrota da MP.
Outra sinalização considerada positiva pelo mercado foi a revisão, divulgada ontem pelo Estadão, feita pela Consultoria de Orçamento do Senado Federal (Conorf) para a estimativa do déficit gerado pelo projeto de reforma do Imposto de Renda (IR). Em cenário conservador, a Conorf prevê agora perda de R$ 12,3 bilhões com a isenção do IR para aqueles que ganham até R$ 5 mil entre 2026 e 2028, ante R$ 16,2 bilhões anteriormente.
“O governo reafirmou seu plano de implementar novos impostos sobre bancos e apostas online para compensar as perdas de receita após recentes derrotas no Congresso. Enquanto isso, a consultoria do Senado revisou para baixo o déficit projetado do novo projeto de lei do Imposto de Renda, aliviando ligeiramente as preocupações fiscais”, destaca a equipe econômica da BuysideBrazil em relatório.