Mix diário

Dólar recua 1,32% e fecha a R$ 5,60, no menor nível desde outubro de 2024; Ibovespa sobe 1,76%

O dólar apresentou queda de mais de 1% e ameaçou romper o piso de R$ 5,60 no fechamento, encerrando a sessão desta terça-feira no menor valor desde meados de outubro. O dia foi marcado por uma onda global da queda da moeda americana, em especial na comparação com divisas emergentes e de países exportadores de commodities.

Leitura comportada da inflação ao consumidor americano em abril reforçou a aposta em um corte de ao menos 50 pontos-base pelo Federal Reserve neste ano, dado que a economia dos EUA deve desacelerar nos próximos meses. Ontem, o acordo comercial provisório entre China e EUA havia mitigado, por ora, os riscos de uma recessão americana, estimulando o apetite ao risco.

“O comportamento do mercado de câmbio está muito ligado à inflação ao consumidor americano hoje. Uma parcela do mercado acredita que o Federal Reserve vai ter espaço para cortar os juros neste ano, o que acabou enfraquecendo o dólar”, afirma a economista-chefe da Ouribank, Cristiane Quartaroli.

Com um ambiente externo mais propenso ao risco, operadores afirmam que há fluxo para a bolsa local, em dia de alta de mais de 2% do petróleo, e também para a renda fixa. A ata do encontro do Copom da semana passada reforçou a leitura de que, mesmo que já tenha encerrado o ciclo de alta da Selic, o comitê pretende manter a política monetária contracionista por período prolongado, o que estimula o carry trade.

Em queda firme pela manhã, o dólar acentuou o ritmo de baixa à tarde, em sintonia com o exterior, e registrou mínima a R$ 5,5958. A moeda americana encerrou a sessão em queda de 1,32%, a R$ 5,6087 – abaixo dos R$ 5,6281 em 3 de abril, dia seguinte ao tarifaço de Trump, e no menor nível de fechamento desde 14 de outubro (R$ 5,5827).

O diretor de Pesquisa Econômica do Banco Pine, Cristiano Oliveira, prevê que o real se aprecie ainda mais daqui para frente, com o dólar descendo até R$ 5,40 ainda neste ano. Oliveira destaca que o Brasil é um dos beneficiados pelo ambiente externo gerado pela administração Trump, uma vez que é um grande exportador de commodities agrícolas, sobretudo para a China, que ele vê claramente como “vencedora” da queda de braço com os EUA.

“Nesse ambiente de queda global do dólar, alguns emergentes, como o Brasil, se beneficiam mais. Do lado interno, a percepção, reforçada pela hoje pela ata do Copom, é de que o aperto monetário está próximo do fim. Temos ao mesmo tempo entrada de recursos para a B3 com valorização de commodities e a perspectiva de um carry ainda elevado, que favorece o real”, afirma Oliveira.

Dados da B3 divulgados hoje mostram que em maio, até o 9, houve ingresso líquido de R$ 6,042 bilhões na bolsa doméstica por parte dos investidores estrangeiros. No acumulado do ano, o saldo do capital externo na B3 é positivo em R$ 16,55 bilhões.

No exterior, o índice DXY – que mede o comportamento do dólar em relação a uma cesta de seis divisas fortes, em especial o euro e o iene – recuava cerca de 0,80% no fim da tarde, ao redor dos 100,965 pontos, bem perto da mínima da sessão, aos 100,939 pontos.

Entre e países exportadores de commodities, os maiores ganhos foram do dólar australiano e do neozelandês, seguidos pelo real e o peso mexicano. Os preços do petróleo subiram mais de 2% ainda refletindo a trégua comercial, mas também com o acordo de investimentos de US$ 600 bilhões por parte da Arábia Saudita nos EUA.

O índice de preços ao consumidor (CPI, na sigla em inglês) e seu núcleo subiram 0,2% em abril, ambos abaixo da mediana de Projeções Broadcast (0,3%). Na comparação anual, o avanço do índice cheio foi de 2,3%, também inferior às expectativas (2,4%).

Analistas ponderam que os efeitos da política tarifária de Trump devem se traduzir em inflação mais elevada nos próximos meses. Por ora, a leitura é que o Fed tende a manter uma postura cautelosa, mas que pode haver espaço para redução de juros a partir do segundo semestre. Monitoramento do CME Group mostra que a principal aposta dos investidores é de corte acumulado do 50 pontos na taxa básica americana até dezembro, com início mais provável em setembro.

“A nossa percepção é que o mercado estava exagerando antes ao ver espaço para um corte de 100 pontos pelo Fed neste ano. Pode haver duas quedas, somando 50 pontos, ou até mesmo nenhum corte. Os EUA contrataram uma inflação maior com o Liberation Day de Trump”, afirma Oliveira, do Pine, relembrando que a trégua nas chamadas tarifas recíprocas é temporária e ainda há muita incerteza em relação à economia americana.

Ibovespa

Com o alívio em torno da leitura sobre a inflação americana em abril, e de visão benigna do mercado sobre a ata do Copom, o Ibovespa renovou máximas históricas intradia e de fechamento nesta terça-feira, em que tocou a casa dos 139 mil pontos pela primeira vez. Ao fim, o índice da B3 mostrava alta de 1,76%, aos 138.963,11 pontos, quebrando o recorde que vigorava desde 28 de agosto passado, então aos 137.343,96 pontos naquele fechamento. No intradia, aos 139.418,97 (+2,09%), superou também a marca de 137.634,57 vista na última quinta-feira, dia 8. Foi a quarta alta consecutiva para o índice de referência da B3.

“Comportamento hoje foi de 85% das empresas do índice em alta, com o Ibovespa renovando recordes. Havia muita expectativa para o dado de inflação ao consumidor nos EUA em abril, divulgado de manhã, e o que se viu foi uma taxa mais acomodada, mesmo com o receio que se tinha com relação a possível efeito do tarifaço americano. Abre espaço para a percepção de que se venha a ter taxa de juros mais baixa nos Estados Unidos”, diz Felipe Paletta, estrategista da EQI Research.

Ele acrescenta que a ata do Copom, também divulgada nesta manhã, corroborou o tom do comunicado da semana passada, com aumento da probabilidade de fim de ciclo de alta da Selic, hoje a 14,75% ao ano. “Essa expectativa se renovou hoje, sem sinal de potenciais aumentos, ainda que a taxa de referência, pelo tom duro do BC, venha a se manter alta por tempo longo.”

“O movimento de hoje na Bolsa refletiu uma clareza maior com relação ao futuro”, diz Lucas Sigu Souza, sócio-fundador da Ciano Investimentos. “Muitas empresas estavam bastante descontadas, mas havia muita incerteza com relação a inflação e juros, além dos efeitos da tarifas comerciais adotadas pelo governo Trump no começo de abril. Houve arrefecimento dessa preocupação em relação a Estados Unidos e China, principalmente, e também há uma tranquilidade maior com relação até onde a Selic poderá ir, o que destrava valor na Bolsa”, acrescenta.

Para Rubens Cittadin, operador de renda variável da Manchester Investimentos, o alinhamento de Petrobras (ON +0,59%, PN +1,52%) à tarde com as demais blue chips deu firmeza ao avanço do Ibovespa no dia seguinte ao balanço da estatal, com a convergência de fatores externos (inflação americana, distensão entre EUA e China) e internos (ata do Copom) que resultou, também, em queda do dólar frente ao real. No fechamento, a moeda americana era cotada a R$ 5,6087, em baixa de 1,32%.

“Os níveis tarifários entre EUA e China começam a entrar no que é praticável, e as bolsas em todo o mundo têm reagido bem. Antes, o que se tinha era praticamente um embargo comercial”, resume Daniel Teles, especialista da Valor Investimentos.

Com base em um simulador de tarifas do Observatório de Complexidade Econômica – uma plataforma de visualização de dados econômicos originada de projeto de pesquisa no MIT, o Instituto de Tecnologia de Massachusetts -, relatório do Itaú aponta que tarifas de importação entre 50% e 60%, no intercâmbio entre Estados Unidos e China, são o limiar a partir do qual cessa, praticamente, o fluxo comercial entre as duas maiores economias do globo.

“A trégua tarifária entre EUA e China e a revisão para cima das projeções de crescimento do país asiático ajudam a reduzir a aversão a risco. Isso, somado a um índice VIX abaixo de 20, reforça o apetite por ativos de países emergentes e favorece o Brasil”, diz Lucas Almeida, sócio da AVG Capital, referindo-se ao índice de volatilidade de Wall Street, considerado uma espécie de termômetro do medo – e que costuma disparar em momentos de maior tensão e incerteza global.

“Essa melhora de percepção global tem destravado valor na Bolsa brasileira, com ativos que vinham depreciados. O acerto entre Estados Unidos e China trouxe alívio, e temos observado muito fluxo de estrangeiro nos últimos dias, com ingresso de mais de R$ 6 bilhões na B3 neste começo de maio”, diz Rodrigo Moliterno, head de renda variável da Veedha Investimentos, acrescentando que o fluxo estrangeiro, no ano, está positivo em R$ 16,5 bilhões, o que dá suporte à progressão do índice.

Nesse contexto mais favorável ao apetite por risco, a principal ação do Ibovespa, Vale ON, subiu hoje 1,64%, e entre os grandes bancos a alta do dia ficou entre 1,23% (Itaú PN) e 2,15% (Bradesco PN). Na ponta ganhadora do Ibovespa, destaque para Hapvida (+11,30%), Azul (+10,85%) e CVC (+9,29%). No lado oposto, Yduqs (-8,48%), JBS (-2,48%) e Brava (-2,35%). O giro financeiro foi hoje a R$ 27,7 bilhões. Na semana, o Ibovespa sobe 1,80% e, no mês, ganha 2,88% – em 2025, a alta chega agora a 15,53%.

Juros

Os juros futuros zeraram o movimento de queda no começo da tarde e fecharam em alta nos vencimentos longos, enquanto as demais taxas ficaram próximas aos ajustes de ontem. A reação da curva à ata do Comitê de Política Monetária (Copom) foi moderada e limitada ao período da manhã, com o mercado depois deslocando o foco para o exterior, espelhando o “steepening” (ganho de inclinação) da curva americana, apesar do dólar ter acelerado a queda e furado a marca de R$ 5,60 no intraday.

A taxa do contrato de Depósito Interfinanceiro (DI) para janeiro de 2026 terminou em 14,780%, de 14,797% ontem no ajuste, e a do DI para janeiro de 2027 passou de 14,03% para 14,01%. O DI para janeiro de 2029 fechou com taxa de 13,51% (13,46% ontem).

Pela manhã, a ata do Copom e os dados de inflação americana melhores do que o esperado trouxeram alívio e recuo às taxas, mas de forma contida, com muitos players considerando o tom neutro em relação ao que já trazia o comunicado. De maneira geral, prevaleceu a leitura de que o ciclo de alta da Selic terminou com a taxa em 14,75% e o Copom demonstrando confiança na eficácia dos canais de transmissão da política monetária. Para os três principais bancos privados brasileiros – Santander, Itaú e Bradesco -, o aperto em maio foi o último do ciclo.

“O Banco Central reforçou que, apesar de a atividade econômica e o mercado de trabalho ainda estarem fortes, dados mais recentes indicam uma moderação em alguns indicadores, o que é positivo em termos de perspectiva de inflação. Esses pontos, em conjunto, reduziram os prêmios nas curvas de juros”, afirma o head de renda fixa da Faz Capital, Filipe Arend.

Na ata, o Copom repetiu que o cenário de “elevada incerteza” exige cautela adicional e flexibilidade para calibrar a Selic no seu próximo encontro. Porém, na avaliação do mercado, a expectativa de corte no curto prazo ainda fica em aberto, dadas as incertezas do cenário e porque o colegiado reforçou a necessidade de política monetária em patamar “significativamente contracionista por período prolongado” para assegurar a convergência da inflação à meta.

“O impacto da ata em si acabou sendo muito tímido, ratificando o que já estava no comunicado, ou seja, a ideia de parar e manter o nível de taxa alta por mais tempo”, resumiu o gestor de renda fixa da Porto Asset, Gustavo Okuyama.

Após os ajustes à ata, o mercado passou a olhar o exterior. “Houve uma abertura relevante de juros lá fora e o Brasil acabou seguindo esse tom. Aquela performance muito positiva da manhã acabou se revertendo”, observa o gestor, a despeito do bom desempenho do real. O dólar à vista fechou em R$ 5,6087, menor cotação desde 14 de outubro de 2024. O impacto do índice de preços ao consumidor (CPI, em inglês) sobre os Treasuries durou pouco e o apetite ao risco voltou a estimular a migração de fluxo para as bolsas, puxando os yields para cima.

Estadão Conteudo

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