Mix diário

Dólar fecha no maior nível em quase 1 mês com cautela fiscal após queda de MP

O dólar acentuou o ritmo de alta ao longo da tarde desta quinta-feira, 9, em meio a um aumento dos ganhos da moeda norte-americana no exterior e ao recuo das cotações do petróleo, na esteira de acordo de paz na Faixa de Gaza. Com perdas mais acentuadas que pares como o peso mexicano e o rand sul-africano, o real apresentou um dos piores desempenhos entre divisas emergentes, abalado pela apreensão com as contas públicas após a derrubada na quarta-feira pela Câmara dos Deputados da Medida Provisória (MP) alternativa ao aumento do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF).

Depois atingir máxima de R$ 5,3796, o dólar à vista encerrou a sessão desta quinta-feira, 9, em alta de 0,58%, a R$ 5,3750 – maior valor de fechamento desde 11 de setembro (R$ 5,3922). A moeda americana acumula ganhos de 0,72% na semana e de 0,98% nos sete primeiros pregões de outubro. No ano, as perdas são de 13,03%.

Para o economista-chefe da corretora Monte Bravo, Luciano Costa, as preocupações com o quadro fiscal doméstico, que ficaram em segundo plano na dinâmica da formação da taxa de câmbio ao longo do ano, parecem estar por trás do desempenho inferior do real em relação a pares emergentes nos últimos dias.

“A gente sempre imaginou que em algum momento o mercado voltaria a olhar para o fiscal. Parece que isso está acontecendo com a apreensão gerada pela questão específica da MP”, afirma Costa, ressaltando a dificuldade do governo para executar o orçamento e cumprir a meta fiscal de 2026. “Contando a perda de receita de uns R$ 20 bilhões com a derrubada da MP mais R$ 10 bilhões em despesas, com o programa Pé-de-Meia, o desafio total é de R$ 30 bilhões para o ano que vem. Isso com um orçamento com receitas já superestimadas.”

Apesar da leitura benigna do IPCA de setembro, que confirma a tendência de perda de força da inflação, a expectativa da maioria dos economistas é a de que o Banco Central vai esperar, pelo menos, até janeiro para iniciar um ciclo de corte da taxa Selic. Por ora, a avaliação é a de que o juro básico no nível atual reduz o apetite por posições em dólar, limitando movimentos de depreciação do real.

Em evento em São Paulo, o diretor de política monetária do Banco Central, Nilton David, disse que o comportamento da taxa de câmbio neste ano é quase “um espelho” do movimento de 2024, quando o real experimentou uma forte desvalorização.

“O dólar perdeu o valor contra o planeta e o real parece ter ganhado o valor contra o planeta. Ele reverteu o movimento que aconteceu no ano passado. Foi um grande ruído de volatilidade e o retorno agora”, afirmou Nilton, reiterando que o BC não busca definir um nível para a taxa de câmbio e intervém apenas em momentos de “disfuncionalidade”.

Termômetro do comportamento do dólar em relação a uma cesta de seis divisas fortes, o índice DXY voltou a subir e rompeu o nível dos 99,000 pontos, com máxima aos 99,505 pontos. O Dollar Index avança mais de 1,70% na semana, com o abalo do euro e do iene por questões políticas, além da incerteza provocada pelo shutdown nos EUA, que já entra em seu nono dia. Nesta quinta, senadores democratas bloquearam, pela sétima vez, tentativa do Partido Republicano de reabrir o governo. No ano, o DXY ainda cai mais de 8%.

À tarde, o diretor do Federal Reserve (Fed, o banco central norte-americano) Michael Barr defendeu “cautela” na condução da política monetária, dada “a grande incerteza quanto ao rumo da economia” e o risco de que cortes de juros possam promover alta da inflação. “Se não houvesse preocupações com o mercado de trabalho, não teríamos precisado cortar os juros no mês passado”, disse Barr.

Costa, da Monte Bravo, observa que grande parte do enfraquecimento do dólar no ano era amparada pela tese de desaceleração da economia americana, que teria uma piora relativa de desempenho na comparação com outros países desenvolvidos, e na expectativa de cortes de juros pelo Fed.

“A economia americana não está desacelerando como se esperava. As revisões do PIB estão surpreendendo para cima. E o diferencial de juros entre os EUA e outros países desenvolvidos já está dado. O mercado já precificou mais dois cortes de 25 pontos-base pelo Fed neste ano”, diz Costa. “Talvez estejamos vendo uma reversão do consenso que havia se formado de que o dólar seguiria se enfraquecendo até o fim do ano.”

Bolsa

A derrota do governo na votação da medida provisória que buscava alternativas à alta do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) – a qual sequer foi submetida à votação, ao se aprovar um requerimento que a retirou de pauta, na quarta à noite – resultou em uma sessão mais volátil do que a anterior na Bolsa, nesta quinta-feira, em que o Ibovespa oscilou entre as casas de 141 mil e de 143 mil pontos nos extremos do dia. Por um lado, há a percepção de que “menos” para o governo Lula pode significar “mais” para o mercado, ao não receber um cheque do Congresso para alavancar gastos em ano eleitoral, o que afetaria as chances de renovação do mandato presidencial em 2026 e favoreceria um ajuste fiscal em 2027.

Por outro lado, negativo, o governo precisará encontrar uma “alternativa à alternativa” ao ter a MP rejeitada. E aí surge outra percepção: a de que a solução pode ser a alteração das metas fiscais para este ano e o próximo, o que desagrada ao mercado, já cauteloso quanto à situação das contas públicas.

Entre as opções, estaria a de o governo propor elevação de outras alíquotas de tributação, como observa o economista-chefe da Western Asset, Adauto Lima.

“Do ponto de vista estrutural, a derrubada traz um problema, o do buraco nas contas públicas, que precisa ser endereçado. Mas a aprovação da MP também seria ruim, do ponto de vista alocativo”, diz Lima.

Agora, acrescenta ele, “há risco de o governo optar por mudar a meta fiscal, tanto deste ano como a do próximo, o que traria efeito muito negativo sobre os preços dos ativos”.

“O governo parece não ter aprendido que o Congresso é contra aumento de impostos, e que precisa cortar gastos. O mercado já tinha subido ontem, colocando no preço essa derrota do governo. Como se antecipou tal movimento ontem, o efeito na Bolsa acabou sendo outro, hoje, sem tanto impacto”, diz Luiz Roberto Monteiro, operador da mesa institucional da Renascença.

Pelo lado mais favorável à precificação dos ativos financeiros, “há a leitura de que a derrota da MP reforça a percepção de que a reeleição do governo em 2026 pode vir a ser mais difícil com menos acesso a gastos, o que induz também a chance de algum ajuste de despesas”, avalia Bruna Centeno, economista e sócia na Blue3 Investimentos. “Propostas do governo para tentar ampliar a arrecadação não têm ido para frente”, acrescenta.

Para Tiago Sbardelotto, economista da XP, “o governo pode optar por novo aumento do IOF, restabelecendo grande parte do Decreto nº 12.467/25, mas excluindo operações como antecipação a fornecedores (risco sacado), cuja tributação pelo IOF foi considerada inconstitucional pelo STF por não estar prevista em lei”.

“Todo o conteúdo da MP expirada pode ser realocado em um projeto de lei. No entanto, dada a resistência a algumas mudanças, acreditamos que o governo poderia focar em medidas com maior potencial arrecadatório – como as relacionadas à limitação de compensações tributárias – e em medidas de despesa, fundamentais para manter o teto de gastos”, acrescenta, em relatório do Macro Research da XP.

Na sessão desta quinta, em que o Ibovespa refletiu pouco a leitura relativamente benigna do IPCA em setembro, o índice da B3 fechou em leve baixa de 0,31%, aos 141.708,19 pontos, entre mínima de 141.603,17 e máxima de 143.212,02, saindo de abertura aos 142.148,06 pontos. Moderado, o giro ficou em R$ 18,0 bilhões, após ter mostrado recuperação nas duas sessões anteriores, chegando à faixa de R$ 24 bilhões, na terça-feira. Na semana, o Ibovespa cede 1,73% e, no mês, recua 3,10%. No ano, sobe 17,81%.

Camilo Cavalcanti, sócio e gestor de portfólio na OBY Capital, aponta que o destaque na leitura abaixo do esperado para o IPCA no mês foi uma certa desaceleração de itens ligados a serviços. “Por se tratar de um setor que sofre mais influência da política monetária, e que tem demonstrado um nível ainda alto e incômodo para o Banco Central, a surpresa é um fator positivo, que pode indicar que o juro está começando a fazer mais efeito na economia”, acrescenta.

“O resultado de setembro reforça o avanço do processo de desinflação e pode levar o Banco Central a atenuar gradualmente o discurso de necessidade de manter a Selic elevada por período prolongado”, diz Marcos Vinícius Oliveira, economista e analista sênior da ZIIN Investimentos. “Embora o cenário ainda exija cautela, especialmente diante da persistência dos serviços e das incertezas fiscais, a sequência de leituras mais benignas reduz a urgência de um tom tão restritivo, abrindo espaço para uma postura de vigilância menos dura nas próximas comunicações”, acrescenta, em nota.

No quadro mais amplo, o “início de outubro tem sido bem mais difícil do que o final de setembro para a Bolsa, com ruídos agora, mais uma vez, vindo do lado fiscal, e afetando os preços dos ativos”, diz Matheus Spiess, analista da Empiricus Research. “Dia foi também de realização de lucros no exterior”, acrescenta o analista, referindo-se a leves perdas para os principais índices de ações em Nova York, como S&P 500 e Nasdaq, que vêm de máximas históricas. Por lá, no fechamento, Dow Jones -0,52%, S&P 500 -0,28% e Nasdaq -0,08%.

O petróleo cedeu nesta quinta mais de 1,5% em Londres e Nova York, o que manteve as ações de Petrobras (ON -1,35%, PN -1,44%) na contramão de outras blue chips da B3 nesta quinta-feira. Ao fim, a principal ação da carteira, Vale ON, também oscilou para baixo (-0,15%, na mínima do dia no fechamento), tirando suporte do Ibovespa. As ações dos maiores bancos, à exceção de Itaú (PN -0,16%) no encerramento, avançaram na sessão, com destaque para Santander (Unit +1,32%). Na ponta ganhadora do Ibovespa, WEG (+4,79%), Auren (+3,47%) e Porto Seguro (+1,73%). No lado oposto, Brava (-5,09%), Raízen (-4,35%) e MBRF (-4,27%).

“Apesar de uma abertura mais positiva na B3, no que foi considerado uma vitória do Congresso sobre o governo na questão dos gastos públicos, na noite anterior, a sessão de hoje voltou a ser de realização na Bolsa, com foco no que o governo fará para ajustar as contas, em especial se vier mais uma tentativa de solução pelo lado da arrecadação – o que o Congresso tem rejeitado. Mercado segue atento ao fiscal”, diz Rodrigo Moliterno, head de renda variável da Veedha Investimentos.

“Foi mais uma grande derrota para o governo, que contava com medidas de arrecadação da MP para fechar o Orçamento de 2026. Mas os juros futuros caíram na sessão, ajudados também por IPCA mais brando”, diz João Paulo Fonseca, head de renda variável da HCI Advisors.

Juros

A surpresa baixista com o IPCA de setembro manteve os juros futuros negociados na B3 em firme queda no pregão desta quinta-feira, apesar do ganho de fôlego do dólar e do aumento no retorno dos Treasuries. O fracasso da Medida Provisória (MP) 1.303, que apresentava alternativas ao aumento do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), foi um motivo adicional ao alívio dos DIs hoje.

A leitura é a de que o sepultamento da MP, além de indicar maior organização da oposição ao governo e enfraquecimento do Executivo, é positivo porque evita mudanças que poderiam aumentar distorções nos mercados, como a uniformização da alíquota do Imposto de Renda (IR) para títulos de renda fixa públicos e privados em 18%.

No fechamento, a taxa do contrato de Depósito Interfinanceiro (DI) para janeiro de 2027 cedeu de 14,098% no ajuste de ontem a 14,027%. O DI para janeiro de 2028 diminuiu de 13,500% no ajuste precedente a 13,395%. O DI para janeiro de 2029 ficou em 13,340% de 13,440% no ajuste anterior. O DI para janeiro de 2031 caiu de 13,667% no ajuste a 13,595%.

Divulgado nesta quinta pelo IBGE, o IPCA deixou deflação de 0 11% em agosto e aumentou 0,48% em setembro, reversão já esperada devido ao fim do efeito do desconto pontual do bônus de Itaipu nas tarifas de eletricidade residencial. O índice cheio, no entanto, ficou aquém da mediana de estimativas do Projeções Broadcast, de 0,52%, com melhora na dinâmica de produtos industriais, favorecidos pela valorização do câmbio no período recente, e também na parte de serviços – o que foi visto com bons olhos pelo mercado.

O grupo, que tem maior ligação com o mercado de trabalho e é considerado crucial na definição dos próximos passos da política monetária pelo BC, desacelerou de 0,39% para 0,13% na passagem mensal. O núcleo de serviços subjacentes, que inclui itens mais correlacionados à atividade, também perdeu ímpeto, ao subir apenas 0,03% no mês passado, ante 0,34% em agosto. Em 12 meses, porém, a inflação “cheia” de serviços e seu núcleo permanecem em níveis desconfortáveis, em 6,14% e 6,76%, respectivamente.

“Tanto os serviços subjacentes quanto os serviços intensivos em mão de obra vieram abaixo das expectativas no mês”, destaca Flávio Serrano, economista-chefe do banco BMG. Esse último segmento reduziu a alta de 0,65% em agosto a 0,35% no último mês. Em 12 meses, passou de 6,28% a 6,30%. Para Serrano, a melhora na parte qualitativa do IPCA explica a mudança na precificação da curva de juros, que passou a indicar 55% de chance de corte de 0,25 ponto porcentual da Selic em janeiro de 2026. Ontem, esse porcentual era de 48%. Já a taxa final projetada para o fim do próximo ano passou de 13,05% para 12 90%.

Carlos Lopes, economista do BV, também destaca a descompressão mostrada pelos bens industriais, que aumentaram apenas 0,06% na leitura atual do IPCA, vindo de 0,20% em agosto, e também a parte de alimentação e bebidas, que recuou 0,26% na medição atual – segunda deflação consecutiva. Em 5,17% no acumulado em 12 meses, o IPCA ainda está em patamar elevado e que não dá conforto ao BC para cortar juros ainda este ano, avalia Lopes. Mas os números de hoje reforçam que há um processo de convergência à meta em curso. “Se tudo caminhar conforme o previsto, a desinflação vai permitir um corte de juros no início do primeiro trimestre de 2026”, afirmou.

Além do qualitativo “bem melhor” do dado de inflação mais recente, Andrea Damico, economista-chefe e fundadora da Buysidebrazil, observa que também houve influência da derrubada da MP 1.303 na descompressão dos juros futuros mais longos hoje. O mercado considerou favorável a queda da unificação da alíquota de títulos de renda fixa, afirma Andrea, mas também há um componente político por trás da reação positiva. “Há uma percepção de vitória e organização da oposição”, disse.

Estadão Conteudo

About Author

Deixar um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.

Você também pode se interessar

Mix diário

Brasil defende reforma da OMC e apoia sistema multilateral justo e eficaz, diz Alckmin

O Brasil voltou a defender a reforma da Organização Mundial do Comércio (OMC) em um fórum internacional. Desta vez, o
Mix diário

Inflação global continua a cair, mas ainda precisa atingir meta, diz diretora-gerente do FMI

A diretora-gerente do Fundo Monetário Internacional (FMI), Kristalina Georgieva disse que a inflação global continua a cair, mas que deve