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Dólar fecha em leve alta com cautela fiscal e ‘shutdown’ nos EUA

Após romper o piso de R$ 5,30 pela manhã, quando registrou mínima de R$ 5,2945, o dólar à vista ganhou fôlego à tarde e encerrou a sessão desta quarta-feira, 1º de outubro, em alta de 0,11%, cotado a R$ 5,3286. Operadores afirmam que o ambiente local de cautela, diante das incertezas sobre o desfecho da votação pela Câmara dos Deputados do projeto que amplia a isenção do Imposto de Renda, limitou o apetite pelo real.

Parte da formação da taxa de câmbio também refletiu o comportamento do dólar no exterior, em dia marcado pelo início de uma paralisação parcial do governo dos Estados Unidos (EUA), o chamado “shutdown”, provocada pelo impasse orçamentário no Congresso norte-americano.

O dólar operou abaixo de R$ 5,30 justamente quando o Índice DXY – que mede o desempenho da moeda americana ante uma cesta de seis divisas fortes – tocou mínima no exterior, aos 97,462 pontos, sob impacto de dados fracos do mercado de trabalho nos EUA. No fim da tarde, o DXY, que chegou a ensaiar um alta modesta, mas operava em ligeira queda, na casa dos 97,700 pontos.

Para a economista-chefe do Ouribank, Cristiane Quartaroli, o mercado de câmbio teve um dia “bem atípico”, influenciado pelo “shutdown” e pela cautela local diante do receio de que a Câmara dos Deputados aprove a ampliação da isenção do IR sem compensações para a perda de receita.

Embora dados fracos do mercado de trabalho nos EUA reforcem a expectativa de mais cortes de juros pelo Federal Reserve (Fed, o banco central norte-americano), persiste a apreensão de que uma paralisação prolongada do governo americano torne o mercado de moedas mais arisco.

“O real acompanhou em grande parte o cenário externo, mas sofreu um pouco também com um menor apetite por risco com as dúvidas sobre como será aprovado o projeto de isenção do Imposto de Renda”, afirma Quartaroli.

Indicador mais aguardado do dia, o relatório ADP mostrou que o setor privado dos Estados Unidos cortou 32 mil empregos em setembro, contrariando as estimativas de criação de 50 mil vagas. O levantamento também revisou o resultado de agosto, de geração de 54 mil empregos para contração de 3 mil.

No início da tarde, a agência de estatísticas dos EUA anunciou a suspensão da divulgação de dados econômicos até que o impasse orçamentário seja resolvido. Há grandes chances de adiamento do relatório oficial de emprego (payroll), previsto para sexta-feira, 3.

O economista-chefe do Banco Master, Paulo Gala, observa que a paralisação do governo dos EUA “não é uma novidade” para os investidores, mas “sempre adiciona ruído político e aumenta a percepção de risco”.

“A duração do ‘shutdown’ é incerta. Pode se arrastar por semanas dependendo das negociações no Congresso dos EUA. Isso pode atrasar a divulgação de indicadores cruciais para a avaliação do Federal Reserve”, afirma Gala. “Setembro terminou de forma muito positiva para os ativos brasileiros. O momento segue favorável, mas a volatilidade internacional ainda pode trazer impactos”.

À tarde, o vice-presidente dos EUA, JD Vance, disse acreditar que a paralisação não será “tão longa”. O republicano afirmou que a Casa Branca está disposta a dialogar e relatou que democratas mais moderados estão “cedendo um pouco” nas negociações.

O especialista Davi Lelis, sócio da Valor Investimentos, avalia que o eventual atraso na divulgação de indicadores como o payroll pode elevar a aversão ao risco e, assim, limitar a queda do dólar mesmo com a perspectiva de corte de juros nos EUA.

Bolsa

Nesta abertura de outubro, o Ibovespa fez o que não fazia há quase um mês: emendar dois dias negativos, ainda que de ajuste bem leve. Após ter fechado setembro pouco abaixo da estabilidade (-0,07%), e com ganho de 3,40% no intervalo (no que foi seu melhor desempenho para o mês desde 2019), o índice da B3 caiu nesta quarta-feira 0,49%, aos 145.517,35 pontos, com giro financeiro a R$ 23,3 bilhões neste meio de semana.

Da mínima à máxima do dia, oscilou dos 145.193,28 aos 146.879,33 pontos, tendo saído de abertura aos 146.236,87 pontos. Na semana, ainda sobe 0,05%, com ganho no ano a 20,98%. Desde 8 e 9 de setembro, o Ibovespa não encadeava duas perdas diárias.

As ações Petrobras ON e PN, que chegaram a esboçar reação no início da tarde na contramão do petróleo, voltaram a cair levemente no fechamento, acompanhando também a moderação do ajuste da commodity, com a ON em baixa de 0,12% no fechamento e a PN, em retração de 0,25%. Sobre o petróleo, pesou o fato de os estoques do insumo nos Estados Unidos terem subido muito além do esperado na semana passada, segundo o Departamento de Energia (DoE, na sigla em inglês).

Investidores na commodity também ponderaram a incerteza gerada pela paralisação do governo dos EUA e a possibilidade de a Organização dos Países Exportadores de Petróleo e aliados (Opep+) aumentar a produção novamente em novembro.

Por outro lado, Vale ON mostrava alta de 1,27% no encerramento, mesmo sem a referência do minério na sessão, com os mercados da China fechados, em feriado. Entre os maiores bancos, por sua vez, as baixas chegaram a se acentuar ao longo da tarde, mas perderam um pouco do ímpeto de ajuste no fechamento, com destaque ainda para Bradesco (ON -1,97%, PN -1,70%). Itaú PN, a principal ação do setor financeiro, caiu 1,79%.

Na ponta perdedora do Ibovespa, Vamos (-4,06%), CVC (-3,59%) e Ultrapar (-3,46%). No lado oposto, Pão de Açúcar (+5,28%), Braskem (+4,57%) e CSN (+3,92%).

“Em relação ao cenário internacional, tivemos um dia de maior incerteza e cautela. Na sexta-feira, teríamos a divulgação de um dado importante, que é o payroll, e que agora não deve sair em função da paralisação nos EUA. Então, sem dúvida, é um dia de incerteza para os mercados”, afetando também os emergentes, destaca Marcelo Bolzan, sócio da The Hill Capital. Ainda assim, os principais índices de ações em Nova York fecharam o dia no campo positivo, com o Dow Jones em alta de 0,09%, o S&P 500, de 0,34%, e o Nasdaq, de 0,42%.

O Bureau of Economic Analysis (BEA), agência de estatísticas dos EUA ligada ao Departamento do Comércio, informou hoje que manterá suas operações suspensas “até que o Congresso aprove o financiamento para este ano fiscal”. Segundo o BEA, isso inclui “suspensão de qualquer divulgação de dados econômicos que estava programada para ocorrer enquanto o governo federal estiver paralisado”.

Em comunicado no começo da tarde, o BEA afirmou, neste caso, que um novo cronograma de divulgação de dados será emitido “assim que possível”. Dentre os dados divulgados pelo BEA estão os de PIB e consumo e renda. Nesta quarta, não foram divulgados os dados previstos de investimentos em construção, que ficam sob responsabilidade do Census Bureau, também relacionado ao Departamento do Comércio.

“O shutdown pesou hoje na Bolsa brasileira, com a percepção de que a paralisação de serviços, que afeta diretamente a divulgação de dados econômicos nos Estados Unidos, pode se estender a meados de outubro”, diz Rubens Cittadin, operador de renda variável da Manchester Investimentos, acrescentando que parte dos investidores em ações buscou proteção, nesta quarta-feira, em papéis de empresas com receitas em dólar, como as exportadoras.

Em entrevista exclusiva à correspondente da Broadcast (sistema de notícias em tempo real do Grupo Estado) em Nova York, Aline Bronzati, o economista-chefe do Santander para os Estados Unidos, Stephen Stanley, descarta uma paralisação longa da máquina pública americana. Por isso, os impactos para a maior economia do mundo tendem a ser mínimos, prevê. “O risco é que o governo de Donald Trump possa demitir milhares de trabalhadores”, avalia o economista.

Juros

Sob um jogo de forças entre o alívio proporcionado pelo exterior e a maior apreensão sobre o quadro fiscal doméstico, os juros futuros exibiram alta modesta no pregão desta quarta-feira. Os vencimentos intermediários e longos registraram elevação um pouco maior, chegando a tocar máximas intradiárias nos vértices a partir de janeiro de 2031 na segunda etapa da sessão, enquanto os trechos mais curtos operaram praticamente estáveis.

As preocupações em relação ao risco fiscal, que voltaram à cena com a votação do projeto de reforma do Imposto de Renda no Congresso, ditaram a dinâmica da curva a termo na sessão. O mercado local de renda fixa caminhou na contramão da firme queda dos rendimentos dos Treasuries, após dados que mostraram enfraquecimento do mercado de trabalho americano e tendo como pano de fundo o primeiro dia de shutdown do governo dos EUA.

Encerrados os negócios, a taxa do contrato de Depósito Interfinanceiro (DI) para janeiro de 2027 oscilou de 14,044% no ajuste anterior a 14,050%. O DI para janeiro de 2028 subiu de 13 339% no ajuste de terça-feira para 13,375%. O DI para janeiro de 2029 marcou 13,255%, vindo de 13,215% no ajuste de ontem. O DI para janeiro de 2031 avançou de 13,416% no ajuste precedente para 13,440%.

“Sem esses fatores domésticos, estaríamos vendo as taxas futuras recuando aqui. Estamos na contramão do movimento externo, onde os Treasuries mostraram recuo até importante”, avalia Luciano Rostagno, estrategista-chefe da EPS Investimentos. O mercado, diz Rostagno, está receoso de que o legislativo não aprove medidas de compensação para contrabalançar a ampliação da isenção do IR para aqueles que ganham até R$ 5 mil. A falta de medidas que traz perspectiva de piora para as contas públicas, diz Rostagno.

“Uma pesquisa do PoderData mostrou aumento na taxa de aprovação do governo Lula, o que também traz um pouco de preocupação para os investidores”, acrescenta Rostagno, devido à perspectiva de que a dívida pública siga em trajetória de elevação em eventual reeleição do presidente em 2026.

Do lado dos indicadores, foi divulgado hoje o Índice de Gerentes de Compras (PMI, na sigla em inglês) da indústria de transformação, que caiu de 47,7 pontos em agosto para 46,5 pontos em setembro, segundo a S&P Global. Leituras inferiores a 50 pontos sinalizam declínio na atividade.

Já o Índice de Confiança Empresarial (ICE) subiu 0,5 ponto em setembro, para 89,9 pontos, na série com ajuste sazonal, após três meses de quedas. Calculado pelo FGV/Ibre, o indicador agrega os resultados dos setores da indústria, construção, comércio e serviços. Para os economistas Gabriel Couto e Rodolfo Pavan, do Santander, apesar do desempenho positivo, o número atual não apagou totalmente a tendência negativa observada nas leituras anteriores. O saldo negativo dos últimos quatro meses reflete o efeito do aperto monetário e é consistente com desaceleração do crescimento no segundo semestre de 2025, avaliam.

Em relatório publicado hoje, os economistas do Banco Bilbao Vizcaya Argentaria (BBVA) apontam que a perda de fôlego da atividade, a convergência da inflação à meta e uma taxa de câmbio mais valorizada devem permitir que a Selic seja reduzida a 11% até o fim de 2026. Mas os cortes começariam apenas no primeiro trimestre do próximo ano.

Segundo Rostagno, da EPS, o mercado segue operando sob a percepção de que o Banco Central vai manter a Selic em 15% por período prolongado após a ata do Copom e o Relatório de Política Monetária , o que confere certa rigidez às taxas curtas.

Estadão Conteudo

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