O dólar avançou com força pelo segundo pregão consecutivo no mercado local nesta segunda-feira, 7, e fechou acima de R$ 5,90 pela primeira vez desde fins de fevereiro. O dia foi marcado por nova rodada de fortalecimento da moeda norte-americana no exterior, em especial na comparação com divisas emergentes, diante de sinais de acirramento da guerra comercial.
O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, subiu o tom em relação à China no início da tarde, ao ameaçar com tarifa adicional de 50% aos produtos chineses a partir de 9 de abril, caso o gigante asiático não recue da tarifa retaliatória de 34% adotada em resposta ao tarifaço dos EUA na semana passada.
A ameaça de Trump provou uma piora generalizada dos ativos de risco, o que levou o dólar a ultrapassar a linha de R$ 5,93 e registrar máxima a R$ 5,9324. Houve uma diminuição dos ganhos da moeda nas últimas horas do pregão, com as bolsas norte-americanas mostrando algum fôlego e até tocando pontualmente terreno positivo.
No fim da tarde, o presidente dos EUA jogou panos quentes ao dizer que tem uma ótima relação com o líder chinês Xi Jinping. Pouco antes, o porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da China, Lin Jian, acusou os Estados Unidos de unilateralismo, protecionismo e intimidação econômica com tarifas.
Após rondar os R$ 5,90 na reta final dos negócios, o dólar à vista encerrou o dia em alta de 1,30%, cotado a R$ 5,9106 – maior valor de fechamento desde 28 de fevereiro (R$ 5,9163). A divisa acumula valorização de 3,60% nos cinco primeiros pregões de abril. As perdas do dólar no ano, que chegaram a superar 8%, agora estão em 4,36%.
O economista-chefe da Frente Corretora, Fabrizio Velloni, observa que os ativos de risco, incluindo as moedas emergentes, sofreram menos nesta segunda que na sexta-feira, o que reflete o mercado já atento a eventuais exageros e tentando buscar um parâmetro de preço que reflita o atual estágio da guerra comercial.
“O mercado ainda tenta entender efetivamente o que vai entrar em vigor nessa questão das tarifas. A China retaliou, e os EUA ameaçaram hoje aumentar ainda mais a tarifa, o que parece até um movimento desesperado, porque esperavam trazer os chineses para a mesa de negociação”, afirma Velloni, acrescentando que, por ora, o quadro externo é o que mais pesa sobre o comportamento da taxa de câmbio.
Termômetro do comportamento do dólar em relação a uma cesta de seis divisas fortes, o índice DXY subia por volta de 0,30% no fim da tarde, ao redor dos 103,240 pontos, após máxima aos 103,511 pontos. Em relação a pares, o dólar caiu apenas na comparação com o franco suíço, tradicional refúgio ao risco.
Com na sexta-feira, as moedas latino-americanas – ao lado do dólar australiano e do rand sul-africano – amargaram as piores perdas. As cotações do petróleo, que já acumulavam queda de dois dígitos no mês no fechamento de sexta-feira, voltaram a recuar, com queda de mais de 2% do contrato do Brent para outubro.
O diretor de Pesquisa Econômica do Pine, Cristiano Oliveira, observa que a guerra comercial deflagrada pelo tarifaço de Trump é negativa tanto para a economia americana quanto pela global, uma vez que pressiona a inflação e leva a uma desaceleração da atividade.
“A preocupação com uma recessão tende a se intensificar nos próximos meses, à medida que os efeitos defasados dos choques recentes comecem a se refletir mais diretamente na economia real”, afirma Oliveira, acrescentando que alguns indicadores já mostram aumento da probabilidade de retração da atividade nos EUA.
O real sofreu menos que seus principais pares, à exceção do peso chileno. Além de o Brasil ter sido tarifado pelos EUA com a menor alíquota (10%), a moeda brasileira é amparada pela taxa de juros local elevada, que encarece carregamento de posições compradas em dólar.
Em evento nesta segunda em São Paulo, o diretor de Política Econômica do Banco Central, Diogo Guillen, reforçou o desconforto com a desancoragem das expectativas de inflação. Economistas veem pelo menos mais um alta da taxa Selic em maio e manutenção de política monetária restritiva por período prolongado.
Ibovespa
O desconforto com a política tarifária dos Estados Unidos continuou no período da tarde desta segunda-feira, 7, respaldado tanto pela tese de que traria consequências nocivas para a economia global quanto pelo alto grau de incerteza que ainda permeia o assunto. Investidores comentam que o mercado parece estar “à deriva” e negociando em torno de ruídos, sendo que por ora a aversão a risco predominou e o Ibovespa caiu pelo terceiro pregão consecutivo.
Segunda ação com mais peso na carteira teórica, Petrobras fechou em queda de 5,57% (ON) e 3,97% (PN).
A estatal perdeu R$ 23 bilhões em valor de mercado com a queda do barril de petróleo e após notícia da CNN Brasil de que Silveira teria apresentado à Petrobras argumentos para reduzir o preço dos combustíveis, em especial do diesel, jogando novamente luz ao risco de interferência do governo na companhia.
A informação foi confirmada pelo Broadcast (sistema de notícias em tempo real do Grupo Estado), cujas fontes mencionaram que “com respeito à governança da Petrobras, o governo avalia viabilidade para redução de preços”.
O principal índice da B3 fechou em queda de 1,31%, aos 125.588,09 pontos, após grande volatilidade: mínima aos 123.876,24 pontos (-2,66%) e máxima aos 128.410,57 pontos (+0,91%). O giro financeiro foi acima da média, a R$ 43,7 bilhões.
“A volatilidade, mesmo com um volume financeiro alto, é porque o mercado ainda tem dúvidas. É difícil conseguir desenhar qualquer cenário, porque ainda tem possibilidade de renegociações sobre as tarifas. A impressão é de que todo mundo está meio à deriva: não tem um direcionamento de para onde vai. O mercado está refém de notícias”, avalia o analista de ativos da corretora Monte Bravo, Bruno Benassi.
A alta pontual esboçada pelo Ibovespa veio na esteira do rumor de que o governo americano suspenderia por 90 dias as tarifas de importação para todos os países, com exceção da China. Mas logo em seguida a Casa Branca negou e, assim, o índice se firmou no negativo desde o começo da tarde.
Considerando a negativa da Casa Branca, o mercado entende que no cenário de curtíssimo prazo a política tarifária será aplicada, segundo o head de Renda Variável na W1 Capital, Tales Barros. “Com a imposição de tarifas, a expectativa é de que o crescimento da economia global será potencialmente menor, com risco de uma reação em cadeia dos 185 países taxados, e a inflação será maior. Então tudo isso tem servido a uma movimentação de aversão a risco global”, explica.
Juros
Os juros futuros fecharam de lado até os vencimentos intermediários e com alta moderada nos longos, com ganho de inclinação para a curva. Os receios sobre os impactos do tarifaço nos EUA sobre a economia global continuaram ditando o comportamento dos ativos e hoje o debate sobre a possibilidade de queda dos preços dos combustíveis ganhou fôlego, em mais um dia de recuo nas cotações do petróleo.
A taxa do contrato de Depósito Interfinanceiro (DI) para janeiro de 2026 fechou em 14,700%, de 14,690% no ajuste de sexta-feira, e a o DI para janeiro de 2027 caiu de 14,23% para 14,21%. O DI para janeiro de 2029 terminou com taxa de 14,16%, de 14,07% no ajuste anterior. A curva local conseguiu se descolar parcialmente da abertura dos rendimentos dos Treasuries. A taxa da T-Note de 10 anos subia para além dos 4,20% no fim da tarde.
O dia começou tenso a partir do acionamento do circuit breaker na Bolsa de Tóquio e novos capítulos da novela das tarifas. O cenário aversão ao risco que penalizava o real e o Ibovespa chegou a se reverter pontualmente com relatos de que Trump estava considerando pausar as taxas por 90 dias, que foram desmentidos posteriormente pela Casa Branca. O dólar chegou a virar para baixo, com mínima na casa de R$ 5,81, mas depois voltou a subir, fechando aos R$ 5,9106, mas distanciando-se da máxima de R$ 5,9324.
Mais tarde, Trump ameaçou aplicar taxação adicional a 50% a produtos chineses caso Pequim não remova até amanhã as tarifas retaliatórias de 34% contra os EUA. O porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da China, Lin Jian, por sua vez, rebateu dizendo que “pressão e ameaças não são a maneira de lidar com o país” e que a China protegerá firmemente “seus direitos e interesses legítimos”.
O aumento agressivo das tarifas levou o Goldman Sachs a aumentar a probabilidade de recessão nos EUA nos próximos 12 meses de 35% para 45%, citando ainda a “incerteza política em níveis muito acima do pico da última guerra comercial”.
Sob a ponderação de que hoje é apenas a terceira sessão pós-anúncio das tarifas, o estrategista-chefe da BGC Liquidez, Daniel Cunha, diz que o dólar deve se enfraquecer no mundo todo se o tarifaço levar a economia americana à recessão, o que teria repercussão na dinâmica global. “Por motivos ruins, essa combinação desinflacionária deve vir a calhar para o Brasil, que é um país que ainda está subindo juros (de 10,5% para 14,25%)”, afirma.
Nesse cenário, a desinflação poderia vir tanto pelo canal do câmbio quanto da desaceleração da atividade, que já vem dando sinais de arrefecimento. “Outro canal de transmissão do ambiente externo seriam os preços de combustíveis, que têm impacto na veia”, afirma. O tombo do petróleo nos últimos dias teria levado o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, a apresentar à Petrobras argumento para ajuste nos preços, alegando ainda a perspectiva do aumento da produção pelos países da Opep+.
Diante desse contexto, Cunha afirma que está sob revisão sua projeção de Selic terminal de 15,5% em junho, com aumento da probabilidade de que o Copom sancione apenas mais um aperto na taxa básica, de 50 pontos-base na reunião de maio, o que levaria a taxa para 14,75%.