O dólar firmou alta no período da tarde desta quinta-feira, 31, após volatilidade com disputa técnica pela taxa Ptax pela manhã, com o real apresentando em julho o seu pior desempenho mensal de 2025, mais especificamente desde novembro de 2024. Há relatos de saída de recursos estrangeiros após entendimento do mercado desde a quarta-feira de que o Federal Reserve (Fed, o banco central norte-americano) pode manter os juros no mesmo nível por mais tempo, enquanto por aqui dados do setor público consolidado mostraram uma piora na dinâmica da dívida. Ainda que desidratado, o tarifaço dos Estados Unidos ao Brasil e as sanções ao ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes, seguem adicionando cautela.
A queda das commodities e pesquisa AtlasIntel/Bloomberg mostrando que a aprovação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva atinge 50,2%, superando a desaprovação pela primeira vez em 2025, e liderando os cenários da disputa eleitoral de 2026 contra a direita podem ter pressionado o real, segundo operadores.
O dólar à vista oscilou entre R$ 5,5633 e R$ 5,6243 nesta quinta-feira, fechando em alta de 0,21%, a R$ 5,6008, encerrando julho com uma valorização de 3,07% – a maior desde novembro de 2024. O contrato futuro para setembro, por sua vez, avançava 0,66%, a R$ 5,6440 às 17h17, com giro considerável de mais de US$ 11,5 bilhões.
A gestora de câmbio da Fair Corretora, Glaucy Rosa Lima, destaca que no fim do mês há um aumento natural de operações cambiais por uma série de motivos operacionais e financeiros.
Para a economista-chefe do Ouribank, Cristiane Quartaroli, o “movimento de pressão na nossa taxa de câmbio foi motivada pela interpretação do mercado de que o tom do discurso do presidente do Fed foi mais duro, sinalizando que os juros americanos devem permanecer nesse nível ainda na decisão de setembro. Então isso acabou fortalecendo o dólar de forma geral hoje, inclusive no Brasil”, afirma.
Lima, da Fair Corretora, acrescenta que a tensão política entre o Brasil e os EUA por conta da aplicação da Lei Magnitsky contra Alexandre de Moraes também pesa.
O superintendente da Mesa de Derivativos do BS2, Ricardo Chiumento, menciona que apesar da lista de exceções de quase 700 produtos, as tarifas de 50% dos Estados Unidos ao Brasil (que devem entrar em vigor a partir de 6 de agosto) ainda abordam produtos-chave para o País, mexendo com a balança comercial. Ele acrescenta que investidores estrangeiros estão retirando recursos do Brasil nesta quinta porque a dívida pública está em seu pior nível em termos porcentuais contra o Produto Interno Bruto (PIB).
O real teve a pior performance mensal desde novembro de 2024, mas ainda assim a oscilação não foi destoante em relação a pares emergentes e de exportadores de commodities, destaca o gestor de fundos multimercado da AZ Quest, Eduardo Aun.
Bolsa
Em baixa de 4,17% no mês, o Ibovespa colheu sua maior perda desde dezembro (-4,28%), interrompendo sequência positiva entre março e junho, quando o impulso assegurado pelo fluxo estrangeiro à B3 levou o índice a renovar máxima histórica, aos 141 mil pontos, já em 4 de julho. De lá para cá, o fluxo externo passou a ser, predominantemente, de saída da Bolsa, tendência que se mostrou mais nítida depois de 9 de julho, sob a ameaça do governo Trump de impor a tarifa de 50% às importações desde o Brasil. Na quarta-feira, veio o relativo alívio do prazo estendido a 6 de agosto para a efetivação do tarifaço, também em parte mitigado pela ampla lista de exceções que isentou aviões, minério, alimentos e petróleo, mas não favoreceu, por exemplo, café e carnes.
Dessa forma, após a percepção inicial de que o pior cenário foi evitado, o ajuste de fim de mês ainda foi negativo, com o índice nesta quinta-feira em baixa de 0,69%, aos 133.071,05 pontos – pouco acima dos 132 mil, nível de dois dos quatro últimos fechamentos e que não era visto, até então, desde 23 de abril.
Na sessão desta quinta, oscilou dos 132.096,29 aos 133.987,26 pontos, na máxima correspondente ao nível de abertura. Após a recuperação vista na quarta, o giro seguiu nesta quinta-feira a R$ 21,3 bilhões. Na semana, o Ibovespa acumula perda de 0,34% – no ano, sobe 10,63%.
Para Felipe Tavares, economista-chefe da BGC Liquidez, um conjunto de fatores pesam na Bolsa no momento, o que justifica o ajuste negativo neste fim de mês, após um primeiro semestre que foi o melhor para o Ibovespa desde 2016. Os investidores estrangeiros movimentaram R$ 1,4 trilhão em ações no mercado à vista da B3 no primeiro semestre, segundo levantamento da plataforma Datawise+, desenvolvida pela B3 em parceria com a Neoway. O volume representou 62% do total negociado no período, reporta a jornalista Isabela Mendes, do Broadcast, sistema de notícias em tempo real do Grupo Estado.
Segundo Tavares, na sessão, o mercado ainda digeriu a aplicação da Lei Magnitsky ao ministro Alexandre de Moraes e o efeito da desidratação das tarifas dos EUA ao Brasil. Além disso, saíram dados sobre a economia brasileira, como o resultado primário do setor público, com déficit pior do que o esperado pelo mercado, acrescenta. “O País tem quadro fiscal difícil há muitos anos. Estamos na expectativa do fiscal ser resolvido, e o fiscal é um dos principais, se não o principal fator de pressão nas expectativas de inflação.”
Outro ponto mencionado por Tavares é a taxa de desemprego – de 5,8% no trimestre finalizado em junho, no piso das projeções -, que reforça percepção de aquecimento do mercado de trabalho. A leitura sobre o emprego tem mostrado pouca sensibilidade ao cenário ainda restritivo da política monetária. “Este, inclusive, foi um dos pontos do comunicado de ontem do Copom, em que se fala da preocupação com o mercado de trabalho, que vem sendo um dos principais drivers de inflação sob a ótica da demanda”, explica o economista.
“Nas últimas semanas, houve escalada relevante na percepção de risco do Brasil, devido ao conflito diplomático com os Estados Unidos, o que contribui para toda essa volatilidade. Ainda há muita incerteza mesmo depois da lista de isenções. Não houve correção expressiva desde o topo do Ibovespa no começo do mês, mas o cenário permanece bem nebuloso à medida que se ingressa e se aprofunda na atual temporada de resultados trimestrais das empresas”, diz Felipe Moura, gestor de portfólio e sócio da Finacap Investimentos, que prevê postura ainda defensiva para a maior parte dos investidores, no horizonte de curto prazo.
Para Willian Queiroz, sócio e advisor na Blue3 Investimentos, o viés de baixa do Ibovespa nesta última sessão do mês esteve correlacionado, em boa parte, ao ajuste negativo do petróleo e do minério, apesar de alguns desdobramentos favoráveis ao Brasil, da quarta para esta quinta, em especial a relativa “desidratação” do tarifaço americano. “Mais de 700 produtos foram retirados da lista do tarifaço, com adiamento de alguns dias, também, para a imposição das sobretaxas. Há visão de que existe espaço para negociação adicional”, acrescenta.
Na B3, contudo, não apenas Vale (ON -0,71%) e Petrobras (ON -0,56%, PN -0,40%) encerraram o dia no campo negativo, como também a maioria dos bancos (Bradesco PN -0,83%, BB ON -1,01%, Santander Unit -0,64%), à exceção de Itaú (PN +0,26%) entre as maiores instituições financeiras. Alguns nomes do setor metálico, como CSN (ON +1,01%) e Usiminas (PNA +5,80%), conseguiram se descolar do sinal negativo no fechamento. Na ponta ganhadora do Ibovespa, além de Usiminas, destaque também para Embraer (+5,78%) e TIM (+3,50%). No lado oposto, Marfrig (-10,20%), BRF (-5,65%), Ambev (-5,25%) e Minerva (-4,45%).
“Mesmo com a isenção de mais de 700 produtos, a tarifa começa a vigorar dia 6 para demais produtos não isentos. Essas taxações e a tensão entre EUA e Brasil, em especial após a aplicação da Lei Magnitsky contra Moraes, trazem um cenário de insegurança jurídica para o Brasil, fazendo preço no índice hoje. E tivemos também uma pesquisa que mostra recuperação da popularidade do presidente Lula em pesquisa Atlas, o que não agrada o mercado”, diz Josias Bento, sócio da GT Capital.
Em dólar, o Ibovespa havia encerrado o mês de junho a 25.552,45 e, agora, no fechamento de julho, recua para 23.759,29, com a apreciação de 3% para o dólar frente ao real no mês e o recuo nominal de 4% para o índice da B3. Dessa forma, converge também para níveis de abril (23.793,63), em patamar um pouco abaixo do visto no fechamento de maio (23.957,79) quando o Ibovespa, pela primeira vez, sustentou a marca de 140 mil pontos, então na máxima histórica no dia 20.
Taxas de juros
Os dados de mercado de trabalho conhecidos nesta quinta-feira endossaram a avaliação de que o setor segue resistente ao enfraquecimento da atividade, conforme destacado na quarta-feira, 30, pelo Comitê de Política Monetária (Copom), no comunicado que acompanhou a decisão de manter a Selic em 15% ao ano. Com a percepção reforçada de que o juro básico vai ficar parado no nível atual por mais tempo, aliada a um impacto menos desinflacionário do que o previsto do tarifaço, a curva de juros futuros fechou em alta nesta quinta-feira.
Encerrados os negócios, a taxa do contrato de Depósito Interfinanceiro (DI) de janeiro de 2026 oscilou de 14,915% no ajuste de quarta para 14,920%. O DI de janeiro de 2027 passou de 14,225% no ajuste da véspera a 14,365%. O DI de janeiro de 2028 subiu de 13,519% no ajuste antecedente para 13,680%. O DI de janeiro de 2029 marcou 13,570%, de 13,418% no ajuste de quinta.
Na ponta mais longa da curva, o contrato de janeiro de 2031 ficou em 13,750%, vindo de 13,641% na quarta no ajuste. O DI do primeiro mês de 2033 avançou de 13,773% no último ajuste a 13,850%.
Embora o discurso duro do Copom não tenha mudado em relação a suas comunicações mais recentes nesta quarta, nenhuma decisão do colegiado é um “não evento”, afirma Gino Olivares, economista-chefe da Azimut Brasil Wealth Management. “A concretização de uma sinalização mais dura sobre a política monetária acaba tendo impacto sobre a curva”, avalia.
Nenhum agente do mercado esperava alteração no tom da autoridade monetária, pondera Olivares. Mas o fato de o comitê ter citado “uma continuação na interrupção no ciclo de alta de juros”, somado à sua visão cautelosa sobre o mercado de trabalho, foi uma sinalização clara de que cortes na Selic ainda estão longe de começar.
Segundo o BC, “o conjunto dos indicadores de atividade econômica tem apresentado, conforme esperado, certa moderação no crescimento, mas o mercado de trabalho ainda mostra dinamismo”. Essa barreira ao início do ciclo de flexibilização monetária foi corroborada pela Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua, publicada nesta quinta pelo IBGE. A taxa de desemprego caiu de 6,1% no trimestre móvel terminado em maio para 5,8% em junho – no piso das estimativas do Projeções Broadcast.
Em relação ao tarifaço – que tem sido o fator de maior influência sobre a curva de juros nas últimas sessões – no total, 694 produtos ficaram de fora da tarifa adicional de 40% dos EUA sobre o Brasil, que se soma aos 10% já existentes. Nos cálculos do banco Pine, a alíquota efetiva do governo Trump para as exportações nacionais deve ficar em cerca de 30%, o que ameniza o impacto da ofensiva comercial dos EUA.
O mercado tinha como premissa que a sobretaxa de Trump poderia acelerar o processo de desinflação no País, uma vez que as empresas que exportam aos EUA, em um primeiro momento, teriam que direcionar seus produtos ao mercado doméstico, o que reduziria os preços por aqui. “Com as exclusões de uma série de produtos da tarifa, o impacto líquido do tarifaço deve ser de menor magnitude, tanto em termos recessivos sobre a atividade quanto desinflacionários”, diz Olivares, da Azimut Brasil.
Por fim, pesquisa AtlasIntel/Bloomberg divulgada nesta quinta indicou que a aprovação do presidente Lula ficou em 50,2%, superando a desaprovação (49,7%) pela primeira vez em 2025. A enquete também ajudou a pressionar a curva de juros nesta quinta, devido à visão de que aumentam as chances de reeleição do governo atual e, consequentemente, da continuidade de uma política fiscal mais pró-gastos.