Após ter recuado 5,56% em janeiro, o dólar abriu fevereiro em baixa moderada e esboçou, ao longo da tarde, romper o piso de R$ 5,81 nas mínimas da sessão. Uma vez mais, as negociações no mercado de câmbio foram guiadas pelo vaivém do noticiário em torno das tarifas de importação da nova administração Donald Trump a parceiros comerciais dos EUA.
Pela manhã, o dólar ensaiou uma alta firme por aqui e correu até a máxima de R$ 5,9053, em sintonia com o avanço da moeda americana no exterior, em especial em relação a divisas latino-americanas, após o governo dos EUA confirmar no fim de semana imposição de tarifas ao México (25%), Canadá (25%) e China (10%), com vigor a partir desta terça-feira, 4.
No início da tarde, o real ganhou força e passou a se apreciar, alinhado ao comportamento do peso mexicano, diante da informação de que a imposição de tarifas ao México seria suspensa por um mês. O adiamento foi anunciado em um primeiro momento pela presidente mexicana, Claudia Sheinbaum, em mensagem pela rede social X (ex-Twitter), e confirmada logo em seguida pelo próprio Trump.
Com mínima a R$ 5,8125, o dólar à vista terminou a sessão em queda de 0,35%, a R$ 5,8160 – ainda nos menores valores desde fins de novembro. Foi a 11º primeiro pregão consecutivo de baixa da moeda americana, que passa a apresentar desvalorização de 5,89% em 2025.
“Vimos um comportamento bem volátil no mercado de câmbio hoje. No começo do dia teve um movimento de aversão ao risco por conta da imposição de tarifas pelos EUA. Mas o real continua se beneficiando de ingresso de fluxo por conta da nossa taxa de juros elevada e se destacou entre emergentes”, afirma a economista-chefe do Ouribank, Cristiane Quartaroli.
Termômetro do comportamento do dólar em relação a uma cesta de seis divisas fortes, o índice DXY chegou a se aproximar dos 110,000 pontos pela manhã, com máxima aos 109,881 pontos, mas desacelerou o ritmo de alta e rondava, no fim da tarde, no limiar dos 109,000 pontos.
O dólar subiu na comparação com a maioria das divisas de países emergentes e de exportadores de commodities, incluindo o dólar canadense, mas caiu em relação a moedas latino-americanas, com baixa superior a 1% frente o peso mexicano e o peso colombiano.
O head da Tesouraria do Travelex Bank, Marcos Weigt, destaca que, após ter se descolado de seus pares em dezembro, no auge da crise de confiança na política fiscal e das remessas de recursos ao exterior, o real voltou apresentar correção positiva com outras moedas emergentes.
“Em dezembro, essa correlação foi baixa. Essa volta agora significa que a moeda encontrou o seu equilíbrio nesses níveis de preço, no curto prazo, e agora anda junto com a oscilação da moeda americana frente a outras divisas emergentes”, afirma Weigt, ressaltando que a informação de Sheinbaum sobre adiamento das tarifas abriu espaço para apreciação das moedas latino-americanas à tarde.
A percepção entre analistas é que Trump utiliza a ameaça de imposição de tarifas como arma de negociação para conseguir condições comerciais mais vantajosas aos EUA. Após abrir conversa com o México, Trump ameaçou elevar tarifas “substancialmente” a produtos chineses se Pequim não fechar acordo com Washington ou interromper o fluxo de fentanil aos EUA. O republicano disse que espera ter uma conversa com os chineses nas próximas 24 horas.
Há temores de que a política econômica de Trump provoque soluços inflacionários e limite o espaço para mais alívio monetário nos EUA. Dirigentes do Federal Reserve ecoaram hoje a fala do presidente da instituição, Jerome Powell, em entrevista na quarta-feira passada, 29, após o BC americano interromper o processo de queda de juros, mantendo a taxa básica na faixa entre 4,25% e 4,50%.
Presidente do Fed de Boston, Susan Colins defendeu política monetária “paciente” e “cuidadosa” diante das incertezas em torno ao impacto da ofensiva comercial de Trump sobre atividade e inflação. O BC americano pode até voltar a cortar juros, “mas não há urgência para fazer ajustes”, argumentou.
Já o presidente do Fed de Atlanta, Raphael Bostic, repetiu análise de Powell ao dizer que a taxa neutra de juros é inferior ao nível atual, ou seja, há espaço para mais alívio monetário dependendo do comportamento da inflação. Ele alertou, porém, que é difícil incorporar as tarifas de importação de Trump aos cenários do Fed.
Ibovespa
O Ibovespa ensaiou leve alta, a 126.473,23 pontos na máxima do dia, mas não conseguiu se descolar, do meio para o fim da tarde, da percepção de risco global em torno da confirmação de que os Estados Unidos utilizarão da arma tarifária para pressionar parceiros como Canadá e México a se curvar a demandas americanas, como o controle da entrada de fentanil e de fluxos migratórios ao vizinho. A possibilidade de a estratégia se estender à União Europeia e o súbito fechamento proposto para a agência de auxílio internacional dos EUA com décadas de existência, a Usaid, em estratégia de cortes de gastos recomendada por Elon Musk, marcam aceleração da retórica e de opções unilaterais que reverberam pelo mundo.
Assim, o dia foi de aversão a risco, pressionando abaixo os índices de ações em Nova York e nas principais praças da Europa. No começo da tarde, uma melhora transitória chegou a ser notada na B3, no momento em que Estados Unidos e México confirmaram trégua de um mês na imposição de tarifas mútuas. Na semana passada, o governo Trump tinha anunciado a imposição de 25% em tarifas sobre as importações de México e Canadá, e de 10% sobre a China – os três principais parceiros comerciais dos Estados Unidos. Assim, o cenário prospectivo é de guerra comercial.
Em entrevista hoje a repórteres na Casa Branca, Trump disse que teve uma “boa” conversa com o premiê canadense, Justin Trudeau, mais cedo, e que os dois voltariam a se falar às 17h (horário de Brasília). O republicano não quis dizer, contudo, se pretende acertar uma pausa nos planos tarifários, como fez com o México nesta segunda-feira. Trump alega que o Canadá “tira vantagem” dos EUA e disse ser “muito difícil” fazer negócios no país vizinho. “Não precisamos que o Canadá faça nossos carros, não precisamos que nos deem a madeira deles, não precisamos deles para produtos agrícolas”, ressaltou. “Eles não compram nossos produtos agrícolas”, acrescentou.
Na B3, o Ibovespa tocou mínima do dia a 125.566,40 pontos, saindo de abertura aos 126.134,94 pontos. No fechamento, mostrava perda de 0,13%, aos 125.970,46 pontos, com giro a R$ 19,5 bilhões neste início de semana e de mês. “A sessão foi muito volátil também para ativos como o câmbio e a curva de juros”, diz Rodrigo Alvarenga, sócio da One Investimentos, destacando não apenas o efeito das incertezas sobre os negócios, mas também para os DI e, em especial, o dólar que oscilou em ampla faixa, de R$ 5,81 a R$ 5,90 durante a sessão, e fechou a R$ 5,8160, em baixa de 0,35% nesta segunda-feira.
O petróleo também oscilou em Londres e Nova York, mas fechou o dia em alta. Em Nova York, as perdas dos principais índices de ações no fechamento ficaram entre 0,28% (Dow Jones) e 1,20% (Nasdaq). “Trump começa a sinalizar aquilo que, até certo ponto, estava adiando”, diz Alison Correia, analista e sócio-fundador da Dom Investimentos. “Os mercados já abriram muito estressados por conta disso: asiáticos, europeus e americanos. Aqui no Brasil não foi diferente”, acrescenta. “É uma guerra comercial o que a gente vê nesse momento.”
“Trump vinha se mostrando mais aberto ao diálogo, e isso aparece também no desdobramento de hoje sobre o México, país que se comprometeu com o envio de mais tropas para a fronteira com os Estados Unidos. Mas a possibilidade de uma guerra comercial ferrenha ainda não foi descartada pelos mercados”, diz William Queiroz, analista da Blue3 Investimentos.
Ao comentar o cenário, a presidente do Fed de Boston, Susan Collins, disse hoje entender que não há urgência para fazer ajustes na política monetária dos EUA, diante das incertezas relativas ao impacto das tarifas na inflação.
Na B3, o dia foi de perdas para as ações de maior peso e liquidez, com Vale oscilando levemente para o positivo no fechamento (ON +0,07%). Petrobras (ON -1,22%, PN -0,50%) e as ações de grandes bancos, com destaque para a principal delas, Itaú (PN -0,92%), não acompanharam a relativa melhora de Vale. Na ponta vendedora do Ibovespa, Azul (-5,65%), Braskem (-5,07%) e Marfrig (-4,97%). No lado oposto, Automob (+3,23%), Carrefour (+2,75%) e Hypera (+2,57%).
Juros
Os juros futuros recuaram nesta segunda-feira, com destaque para o vértice longo cedendo 26 pontos-base. A queda do dólar, na esteira do anúncio de pausa de um mês na aplicação da tarifa dos Estados Unidos contra o México, foi o principal motivador. Ainda que tenha arrefecido, o fato de as taxas da T-note de 10 anos e do T-bond de 30 anos fecharem em baixa também colaborou. No cenário local, há expectativa para ata do Comitê de Política Monetária (Copom) e o Plano Anual de Financiamento (PAF) do Tesouro amanhã, além do retorno do Congresso após as eleições no fim de semana.
A taxa de depósito interfinanceiro (DI) para janeiro de 2026 caiu para 14,865%, de 14,916% no ajuste anterior. O DI para janeiro de 2027 recuou a 14,825%, de 14,970%, e o para 2029 cedeu para 14,445%, de 14,712% no ajuste.
“Estamos vendo uma dinâmica mais benigna, de alívio nos juros, desde janeiro e que se estende hoje, no início de fevereiro, apesar de o cenário global voltar a ficar tumultuado”, afirma o estrategista-chefe da BGC Liquidez, Daniel Cunha. Para ele, a apreciação cambial e o fechamento da taxa dos EUA no vértice mais longo, “que ajuda na reprecificação de taxas ao redor do mundo” justificam o fechamento da curva de juros doméstica.
O real voltou a ganhar terreno frente ao dólar após a presidente do México, Claudia Sheinbaum, dizer que chegou a uma série de acordos com o mandatário dos Estados Unidos, Donald Trump, incluindo a obtenção de uma pausa de um mês na imposição de tarifas, que antes entrariam em vigor nesta terça-feira, 4. A decisão foi confirmada pelo republicano.
“Com essa notícia, deu para ver que existe um ímpeto político e uma retória econômica de Trump, mas também existe um componente de negociação muito forte por trás de tarifa. Então ajudou um pouco pelo menos neste campo de juros e moedas”, afirma Cunha. O dólar à vista fechou em queda de 0,35%, a R$ 5,8160. O juro da T-note de 10 anos recuou a 4,529%, de 4,536%, e o do T-bond de 30 anos cedeu a 4,757%, de 4,788%.
No noticiário doméstico, destaque para a ata do Copom amanhã. “O mercado espera que a ata revele e esclareça alguns pontos importantes, ou do contrário a curva deve voltar a abrir. O comunicado na semana passada foi percebido como mais dovish, frouxo”, diz o estrategista da BGC Liquidez.
Na terça-feira, o Tesouro realizará leilão de NTN-B e LFT, como de praxe, mas também divulgará o seu Plano Anual de Financiamento (PAF), que deve ficar na atenção do mercado de juros.
Participantes do mercado também monitoram o retorno das atividades no Congresso, após Hugo Motta (Republicanos-PB) e Davi Alcolumbre (União-AP) serem eleitos presidente da Câmara dos Deputados e do Senado, respectivamente.