O dólar abriu a semana e o mês em queda firme no mercado local, em sintonia com a onda de desvalorização da moeda americana no exterior após sinais de acirramento da guerra comercial. China e EUA trocaram acusações mútuas de descumprimento de trégua tarifária de 90 dias acordada no mês passado. Além disso, o presidente Donald Trump anunciou aumento de 25% para 50% a taxação sobre importações de aço e alumínio, que entram em vigor na quarta-feira, 4.
Operadores observam que o real apresentou desempenho inferior ao de seus principais pares, como os pesos chileno e mexicano – o que pode ser atribuído ao aumento da percepção de risco fiscal, seja pela incerteza envolvendo o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), seja pela mudança da perspectiva do rating brasileiro pela Moody’s de positiva para estável, afastando da obtenção do grau de investimento.
Após mínima a R$ 5,6671 pela manhã, o dólar reduziu parte das perdas na segunda etapa de negócios, com a virada do Ibovespa para o campo negativo. Com máxima a R$ 5,7102, a divisa terminou o primeiro pregão de junho em baixa de 0,77%, a R$ 5,6757, depois de ter recuado 0,76% em maio. No ano, a moeda americana acumula desvalorização de 8,16% em relação ao real, que tem o melhor desempenho entre as divisas latino-americanas no período.
O trader de câmbio Rodrigo Cabraitz, da Principal Asset Management no Brasil, observa que, após um período de acomodação, há uma volta do movimento do redirecionamento de investimentos de ativos americanos para outros mercados, o que beneficiou divisas emergentes como o real.
“Na metade da semana passada, vimos que essa saída de fluxos dos EUA tinha dado uma acomodada. Mas com o estresse na relação entre China e Estados Unidos, esse voltou a ser o grande tema”, afirma Cabraitz. “Temos juro alto e um bom carry para atrair o fluxo que sai dos EUA. O que pesa sobre o real é essa questão do IOF. O mercado está receoso com o que pode vir como alternativa”.
O Congresso já ameaçou derrubar o decreto do aumento do IOF, alvo de críticas do setor produtivo e da classe política. Pela manhã, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, disse que não precisa de dez dias para propor alternativas ao IOF, prazo dado ao ministro na semana passada pelo presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB).
Segundo o ministro, é preciso uma decisão política para calibrar o decreto do IOF e elaborar soluções estruturais para sanear as contas públicas no longo prazo – uma vez que “não dá para dissociar mais uma coisa da outra”.
“Nós precisamos tomar uma decisão política do que será feito. E diante do que eu ouvi, eu acredito que essa semana a gente possa resolver e melhorar tanto a regulação do IOF, combinado com as questões estruturais”, afirmou Haddad.
“A confusão sobre as medidas mal estudadas do IOF deixa o mercado em alerta. Sem o IOF, o governo não cumpre o arcabouço, mas o imposto é distorcivo e ineficiente. Além disso, claramente não houve um estudo prévio de impactos, o que fica evidente pela necessidade de vários ajustes (fundos de investimentos e empréstimos com risco sacado)”, afirma a corretora Monte Bravo, em relatório.
No exterior, o índice DXY – que mede o desempenho do dólar em relação a uma cesta de seis moedas fortes – recuava cerca de 0,60% no fim da tarde, com destaque para os ganhos do euro e iene. Entre divisas emergentes e de países exportadores de commodities, destaque para o dólar australiano e o neozelandês. Os preços do petróleo subiram mais de 3%.
Para Cabraitz, da Principal Asset Management, caso haja um pouso suave da economia americana, com arrefecimento gradual da atividade e cumprimento da meta de inflação em algum momento do ano que vem, o ambiente pode seguir favorável a divisas emergentes, com o real podendo se destacar.
“Já se chegar a um ponto em que uma recessão pareça inevitável, podemos ver migração para os chamados ‘safe havens’, como o iene e o franco suíço, e perdas de divisas emergentes. É um cenário ainda sem definição”, afirma.
Ibovespa
O Ibovespa se firmou no campo negativo a partir do início da tarde, cedendo a linha dos 137 mil pontos, e encerrando o dia no menor nível desde 12 de maio, então aos 136.563,18 pontos. Nesta segunda-feira, 2, oscilou entre 136.482,87 e 138.471,10 – quase 2 mil pontos entre a mínima e a máxima do dia -, terminando aos 136.786,65 pontos, em leve baixa de 0,18%, a quarta perda consecutiva para o índice. O giro foi de R$ 20,8 bilhões nesta primeira sessão de junho. No ano, o Ibovespa sobe 13,72%.
As perdas do índice na sessão foram mitigadas pelo desempenho favorável das duas principais empresas da carteira, Vale (ON +0,88%) e Petrobras (ON +0,30%, PN +0,58%), com o petróleo mostrando alta perto de 3% no fechamento da sessão em Londres e Nova York. Bradesco (ON +0,29%, PN +0,25%) conseguiu se descolar do dia majoritariamente negativo para os grandes bancos, com Santander (Unit -0,74%) e Itaú (PN -0,70%) à frente.
Na ponta ganhadora do Ibovespa, Metalúrgica Gerdau (+5,14%), Gerdau (+5,05%) e CVC (+4,22%). No lado oposto, São Martinho (-4,82%), Braskem (-4,36%) e RD Saúde (-3,23%).
“Sem muitas novidades, dia foi de leve ajuste negativo tanto para o Ibovespa como para o índice de small caps ações de menor capitalização de mercado, mais voláteis. Há expectativa para contato esta semana entre os presidentes Trump, dos Estados Unidos, e Xi Jinping, da China, em busca de solução para a questão comercial, após a acusação de Trump na semana passada de violação do acordo pela China. Na agenda doméstica, IOF ainda causa desconforto, e se espera solução estrutural para o impasse do governo com o Congresso sobre o aumento do imposto até a sexta-feira”, diz Rodrigo Alvarenga, sócio da One Investimentos, referindo-se à indicação da Fazenda de que enviará, nesse prazo, uma proposta estruturada.
“Bolsa em queda hoje após recordes de alta batidos no Ibovespa em maio. Há receios domésticos como o IOF, ainda no radar: o que vai acontecer, de que forma vai ser desenrolado – o quanto vai ser desidratado, ou não”, resume Alison Correia, analista e cofundador da Dom Investimentos, referindo-se ao prazo de 10 dias que o Congresso deu ao governo para retificar ou retirar as mudanças propostas. “Clima está tenso, não parece haver plano B”, acrescenta.
Ele aponta, também, que as preocupações quanto ao aumento do IOF e os ruídos domésticos em relação à condução fiscal colaboram para a alta dos juros futuros, com efeito direto em especial para as empresas do setor de consumo, além dos bancos. No front externo, destaque nesta abertura de semana para a indicação do presidente Donald Trump, dos Estados Unidos, de que pretende elevar logo, a 50%, a taxação de aço e alumínio importado pelo país – o que favoreceu as ações da Gerdau, por ter produção nos EUA.
Juros
Os juros futuros começaram o mês e a semana em alta, com exceção dos vértices curtos que chegaram ao fim da sessão perto da estabilidade, com viés de baixa. O ganho de inclinação da curva se explica pela percepção de um cenário inflacionário mais benigno, alimentada pelo reajuste em baixa nos preços da gasolina e melhora das expectativas de IPCA no Boletim Focus, somada à influência de alta dos rendimentos dos Treasuries. Já o efeito Moody’s sobre a curva foi menor do que se esperava.
A taxa do contrato de Depósito Interfinanceiro (DI) para janeiro de 2026 fechou em 14,770%, de 14,796% no ajuste de sexta-feira, e a do DI para janeiro de 2027 em 14,11%, de 14,13%. O DI para janeiro de 2029 encerrou com taxa de 13,63%, de 13,58% no ajuste anterior.
A ponta curta, que reflete a sensibilidade da curva a fatores relacionados à política monetária, oscilou com viés de baixa durante toda a sessão, sem se afastar dos ajustes.
O head de renda fixa da Faz Capital, Filipe Arend, lembra que, somado ao IPCA-15 de maio aquém das estimativas, na semana passada, hoje o Focus já trouxe projeção mais baixa da inflação, além do anúncio da Petrobras de redução de 5,6% no preço da gasolina para as distribuidoras a partir de amanhã. “Isso implica, potencialmente, menos pressão inflacionária daqui para frente”, diz.
Os preços às distribuidoras cairão R$ 0,17 por litro, o que, na estimativa da Warren Investimentos deve ter impacto de baixa entre 8 e 10 pontos-base no IPCA de junho, o que levou à revisão do IPCA de 2025 de 5,3% para 5,2%.
Na avaliação de Luis Felipe Vital, estrategista-chefe de Macro e Dívida Pública da Warren, os sinais, na margem, são mistos, uma vez que a redução nos preços dos combustíveis contribui para aliviar a inflação, mas os riscos altistas ainda são relevantes. “Os dados do mercado de trabalho divulgados na última semana mostram um nível de atividade ainda bastante aquecido”, pondera. Tais fatores, prossegue, geram certa inquietação no mercado quanto aos próximos passos do Copom, “o que é natural, considerando a ausência de qualquer tipo de forward guidance no momento”.
Por ora, a expectativa majoritária é de manutenção da Selic em 14,75% já a partir do Copom de junho, por um período prolongado. As medianas de IPCA no Focus vêm melhorando marginalmente, mas ainda estão distantes da meta de 3%. A de 12 meses à frente caiu de 4,86% para 4,81% e a de 2025, de 5,50% para 5,46%. A de 2026 se manteve em 4,50%.
As taxas longas foram penalizadas pelo exterior. Os retornos dos títulos do Tesouro americano subiram, refletindo o estresse com o anúncio do presidente dos EUA, Donald Trump, de dobrar de 25% para 50% a alíquota das tarifas sobre a importação de aço. Há temor de impacto inflacionário, e consequentemente, de piora fiscal adicional num cenário já de pressão sobre a dívida pública. Havia certa expectativa com o discurso do presidente do Federal Reserve, Jerome Powell, às 14h, mas ele não comentou sobre política monetária e perspectivas econômicas.
“O que tem dado o tom são as tarifas porque, na prática, ninguém sabe exatamente qual vai ser o desfecho, quais vão ser as tarifas terminais, qual vai ser o impacto disso para as empresas, como os consumidores vão responder. Então, com incerteza, o mercado exige prêmio”, explica Arend.
A alta na ponta longa se dá em cima de taxas que já haviam subido na sexta-feira. Alguns players desconfiam que parte do mercado já operava ao longo da sessão o anúncio da Moody’s de alterar a perspectiva da nota do Brasil de positiva para estável, anunciado após o fechamento do mercado. Isso explicaria a repercussão hoje mais contida. Já Filipe Arend entende que a decisão não fez tanto preço “porque os principais pontos relacionados à questão já vinham acontecendo no mercado como um todo”.