O dólar apresentou alta moderada nesta quinta-feira, 31, dia marcado por aversão ao risco no exterior em meio à expectativa pela eleição presidencial americana. Por aqui, o pano de fundo de cautela fiscal, dada a indefinição em torno da magnitude do pacote de corte de gastos prometido pelo governo Lula, manteve os investidores na defensiva.
Operadores ressaltam que a formação da taxa de câmbio esteve sob forte influência de fatores técnicos, como a formação da última Ptax de outubro, ao longo da primeira etapa de negócios, e a rolagem de posições no segmento futuro típicas de virada de mês.
Com máxima a R$ 5,7940 no início da tarde, o dólar à vista fechou a sessão com ganho de 0,31%, cotado a R$ 5,7811. A divisa acumulou alta de 6,13% em outubro, a maior valorização mensal desde julho (6,43%). Além da força da moeda americana no exterior, o real sofreu com o aumento da percepção de risco fiscal ao longo de outubro. Apenas o peso chileno teve perdas maiores que a moeda brasileira no período, considerando as divisas latino-americanas.
Termômetro do comportamento do dólar em relação a uma cesta de seis divisas fortes, o DXY rondou a estabilidade ao longo do dia, terminando outubro com ganhos de cerca de 2,70%. A libra caiu mais de 0,60% hoje e atingiu o menor nível em relação ao dólar desde agosto, em meio a preocupações fiscais no Reino Unido. Já o iene subiu quase 1% após fala do presidente do Banco do Japão (BoJ), Kazuo Ueda, deixando em aberto a possibilidade de alta de juros.
Entre os indicadores do dia, a leitura do índice de preços de gastos com consumo (PCE na sigla em inglês) de setembro veio em linha com as expectativas. As atenções se voltam amanhã para a divulgação do relatório de emprego (payroll) de outubro. Como o Federal Reserve tem dado peso cada vez maior ao mercado de trabalho para a gestão da política monetária, os números do payroll podem mexer com as apostas para o ritmo de corte de juros nos EUA.
A economista-chefe do Ouribank, Cristiane Quartaroli, afirma que as moedas emergentes tendem a ficar pressionadas diante da expectativa pelas eleições americanas na próxima semana. “Hoje, tivemos mais aversão ao risco, com queda dos índices de ações nos EUA, o que se refletiu nos ativos domésticos”, afirma Quartaroli, acrescentando que a expectativa por medidas fiscais por aqui contribuem para manter o mercado cauteloso.
Segundo a mediana das projeções de casas ouvidas pelo Projeções Broadcast, o governo deve anunciar corte de despesas em R$ 25,5 bilhões, abaixo dos R$ 49,5 bilhões estimados para cumprimento das metas fiscais neste ano. Medidas discutidas incluem o combate a supersalários, mudanças nos repasses para Saúde e Educação e moderação nas emendas parlamentares. Estaria em estudo limitar o crescimento anual do piso de saúde e educação a 2,5%. Reportagem do Estadão mostra que o governo encaminhou ao Congresso duas propostas que aumentam a liberdade do Executivo de mexer no Orçamento sem consultar o Parlamento.
Para o analista de câmbio Bruno Nascimento, da B&T Câmbio, o desempenho ruim do real em outubro reflete tanto a perspectiva de cortes menos agressivos de juros nos EUA, cuja atividade segue “demonstrando resiliência”, quanto incertezas fiscais domésticas. “A eleição presidencial americana adiciona volatilidade. A desaceleração econômica da China e os conflitos no Oriente Médio também contribuíram para a alta do dólar”, afirma Nascimento.
Ibovespa
O Ibovespa colheu nesta quinta-feira a terceira perda consecutiva, abaixo dos 130 mil pontos, tendo permanecido no negativo em nove das últimas 11 sessões, desde o último dia 17. A cautela para o anúncio de cortes de gastos prometidos pela equipe econômica e a proximidade da eleição presidencial americana, no dia 5, na mesma semana em que o Federal Reserve e o Copom voltam a deliberar sobre juros, tem mantido os investidores na defensiva – comportamento que se reflete também no câmbio e na curva de juros doméstica, que seguem em alta.
Dessa forma, com dólar mais uma vez perto de R$ 5,80 na máxima do dia e a R$ 5,7811 (+0,31%) no fechamento, o Ibovespa cedeu hoje 0,71%, aos 129.713,33 pontos, bem mais próximo à mínima (129.641,78) do que da máxima (130.797,86) da sessão, em que saiu de abertura aos 130.638,94 pontos. O giro financeiro subiu nesta quinta-feira, a R$ 20,9 bilhões. Na semana, o Ibovespa passou hoje ao negativo (-0,14%), encerrando o mês de outubro acumulando perda de 1,60% no intervalo, após retração de 3,08% ao longo de setembro. No ano, cede agora 3,33%.
Assim, o Ibovespa se mantém em devolução parcial da alta de 6,54% em agosto, quando renovou máxima histórica no dia 28, no fechamento e no intradia, então na casa de 137 mil pontos. O desempenho negativo do bimestre setembro-outubro se contrapõe à série de avanços entre junho e agosto. Na máxima vista em 28 de agosto, o Ibovespa acumulava ganho de apenas 2,35% no ano, tendo em vista o patamar elevado de comparação, após ter fechado 2023 aos 134 mil pontos, com renovação de máxima histórica na penúltima sessão daquele ano.
Em dólar, o Ibovespa chegou ao fim de outubro a 22.437,48 pontos, mês em que a moeda americana acumulou alta de 6,13%. Em 30 de setembro, o dólar à vista havia fechado em alta de 0,21%, a R$ 5,4474, mas teve retração de 3,33% ao longo do mês. Combinando a variação nominal da moeda e da Bolsa em setembro, o Ibovespa em dólar chegou ao fim daquele mês a 24.198,04 pontos, um pouco acima do nível em que estava no fim de agosto, movido para cima pelo ajuste cambial no intervalo.
No fechamento de agosto, com o dólar de volta à casa de R$ 5,63, o Ibovespa, na moeda americana, marcava 24.135,58, refletindo a queda de 0,36% acumulada pela referência monetária no mês e avanço de mais de 6% para o índice da Bolsa brasileira. No encerramento de julho, o índice da B3, em dólar, estava em 22.572,06, um pouco acima do nível do mês anterior, e ainda muito descontado.
“Na sessão de hoje, o Ibovespa foi perdendo força ao longo do dia, com o dólar dando continuidade ao movimento de alta, em patamar já bastante elevado, o que coloca pressão adicional nas expectativas de inflação”, diz Thiago Lourenço, operador de renda variável da Manchester Investimentos, destacando também que o setor financeiro se mostrou mais “pesado” na sessão, após a divulgação do balanço do Bradesco referente ao terceiro trimestre.
“Os resultados que as empresas têm entregue são majoritariamente positivos, em linha ou em alguns casos um pouco acima do esperado. Mas, de maneira geral, o mercado tem mostrado pouco apetite para tomar ativo que não esteja surpreendendo bastante”, diz o operador. Ele menciona, em especial, os casos de Bradesco – com resultado que “não veio tão ruim” – e WEG – com “resultados satisfatórios”, mostrando “crescimento praticamente em todas as linhas” -, empresas que divulgaram balanços trimestrais nos últimos dias.
Além da expectativa para a próxima semana e da temporada de resultados corporativos no Brasil, os investidores seguem monitorando os dados econômicos dos Estados Unidos, às vésperas de nova reunião do Federal Reserve, nos dias 6 e 7.
“Com os atuais dados sobre despesas de consumo pessoal (PCE) amplamente alinhados com as expectativas, e o importantíssimo índice trimestral de custo de emprego (ECI) continuando a cair para níveis pré-pandemia, o argumento para um corte de 25 pontos-base na taxa de juros do Fed em novembro foi ainda mais fortalecido”, aponta em nota Greg Wilensky, chefe de renda fixa dos EUA e gerente de portfólio na Janus Henderson. “Embora os dados de inflação do último mês tenham sido um pouco maiores do que o Federal Reserve gostaria, essa diferença não é grande o suficiente para que o Fed precise recalibrar significativamente as expectativas.”
Na B3, as principais ações do Ibovespa operaram em baixa durante a maior parte da sessão, com destaque para perdas em Bradesco ON (-3,41%) e PN (-4,39%), após os resultados trimestrais. O discurso do Bradesco não mudou, mas o humor do mercado sim, o que explica a reação negativa ao balanço do banco no terceiro trimestre deste ano, reporta o jornalista Matheus Piovesana, do Broadcast. Os números confirmaram a recuperação da rentabilidade, mas de modo gradual. Em um cenário de juros mais altos e incertezas quanto aos rumos da economia, a mensagem foi menos aceita que nos balanços anteriores.
O Bradesco teve lucro líquido recorrente de R$ 5,225 bilhões, alta de 13,1% em um ano e de 10,8% em um trimestre. O resultado veio em linha com as expectativas do mercado, mas com composição diferente, em especial na combinação entre receitas com crédito e despesas com inadimplência.
A sessão também foi negativa para Santander, em baixa de 2,68%, na mínima do dia no fechamento, e para Itaú (-0,65%, também no piso no encerramento) e BB (-0,15%). Vale também encerrou o dia em baixa, de 0,66%, mas Petrobras reagiu perto do fim, com a ON em alta de 0,46% e a PN, de 0,17%, no encerramento. Na ponta perdedora do Ibovespa nesta quinta-feira, Hypera (-8,30%), CVC (-5,09%), Pão de Açúcar (-3,85%), MRV (-3,49%) e Cogna (-3,42%), além das duas ações de Bradesco. No lado oposto, BRF (+2,86%), CSN Mineração (+2,31%), Marfrig (+1,82%) e Azzas (+1,33%).
“Apesar de toda a expectativa para o rali de Natal na Bolsa, não consigo enxergar dessa forma, dado que temos praticamente contratados mais dois aumentos da Selic até o final do ano”, diz Anderson Silva, head da mesa de renda variável e sócio da GT Capital, referindo-se às reuniões do Copom programadas para a semana que vem e dezembro. Ele menciona também a falta de “discernimento” entre “gasto e investimento” que tem sido reiterada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva nos momentos em que a equipe econômica mostra a necessidade de reavaliar despesas para que se cumpra a meta fiscal.
Olhando para fora, “a agenda da semana termina, amanhã, com o importante relatório oficial sobre o mercado de trabalho nos Estados Unidos, de outubro. E há expectativa crescente de que Donald Trump venha a vencer a eleição da próxima terça, o que traz um elemento a mais de volatilidade para os preços dos ativos”, diz Ramon Coser, especialista em renda variável da Valor Investimentos.
Juros
Os juros futuros percorreram a sessão desta quinta-feira em alta, que também foi o modus operandi que prevaleceu no mês de outubro. A recomposição de prêmios hoje se deu na esteira da esticada do dólar até perto dos R$ 5,80, do ambiente externo mais volátil e do leilão de títulos prefixados com risco maior para o mercado. O mercado operou mais um vez sem respaldo de liquidez, refletindo a cautela antes dos eventos-chave da semana que vem – eleição nos EUA e reunião do Federal Reserve, no exterior, e, aqui, o pacote fiscal e a decisão do Copom.
A taxa do contrato de Depósito Interfinanceiro (DI) para janeiro de 2026 terminou em 12,82% (de 12,76% ontem no ajuste) e a do DI para janeiro de 2027 encerrou em 12,99%, de 12,90% ontem no ajuste. O DI para janeiro de 2029 tinha taxa de 13,00%, de 12,91%. O nível de inclinação mudou pouco em relação ao fim de setembro, mas porque a curva teve uma elevação quase em bloco, com taxas longas e curtas avançando em torno de 50 pontos base.
“O mercado está sem profundidade nas últimas semanas, e nesta em especial por causa da eleição nos EUA na semana que vem, das reuniões do Fomc e do Copom, e ainda os rumores de que a agenda de revisão de gastos só sairá no fim da próxima semana”, resumiu Daniel Leal, estrategista de renda fixa da BGC Liquidez.
Nesse contexto, acrescenta, “qualquer espirro tem jogado a curva de um lado para outro”. “O dólar perto de R$ 5,80 também levou o DI junto”, completa. O dólar encerrou a sessão em R$ 5,7811, chegando na máxima a R$ 5,7940, com valorização de 6,13% em outubro.
Assim, o avanço das taxas resistiu à melhora na curva americana ao longo do dia. Os yields zeraram a alta vista pela manhã, mas no geral o ambiente externo hoje esteve mais hostil, com dados divergentes nos EUA, cautela com eleições americanas e decepção com balanços de empresas de tecnologia.
No Brasil, a demora na divulgação do pacote fiscal tem dado espaço a elucubrações em torno do que será anunciado, mas o mercado evita colocar suas fichas enquanto não sair nada oficialmente.
A “falta de visibilidade” na política fiscal é um dos motivos citados pela Terra Investimentos para justificar sua revisão para Selic terminal de 12,5% para 13%. O cenário da casa contempla agora quatro altas consecutivas de 0,50 ponto no juro básico, entre novembro e março de 2025, e uma elevação derradeira de 0,25 ponto em abril. Outros argumentos para a mudança no call são hiato do produto em campo positivo e o “persistente” descolamento das expectativas de inflação.
Pesquisa realizada pelo Projeções Broadcast mostra que, para o Copom da próxima semana, 71 entre 73 casas consultadas esperam uma dose maior de aperto na Selic, de 0,50 ponto porcentual, o que levaria a taxa para 11,25%.
A agenda do dia teve pouca influência sobre o desempenho da curva. A taxa de desemprego no País no trimestre até setembro caiu a 6,4%, no piso das estimativas coletadas pelo Projeções Broadcast, que tinha teto de 6,6% e mediana de 6,5%. É a menor para trimestres até setembro da série histórica. Cálculos sazonalmente ajustados por algumas casas apontam taxa em até 6,2%. No entanto, olhando dados da renda, o mercado começa a ver sinais de perda de impulso.
Profissionais da renda fixa também observaram alguma pressão do leilão sobre as taxas. Segundo Leal, o leilão não foi dos maiores, mas trouxe máximas para a curva logo após a divulgação do edital. O Tesouro ofertou 7 milhões, mas vendeu apenas 5,6 milhões. A oferta de 600 mil NTN-F também não teve demanda integral, com colocação de 400 mil títulos.