"Como em futebol, em música popular também somos primeiro mundo, nada devemos a outras culturas. E parece que[como em tudo o mais nessa Copa] a Fifa não levou em conta as características do país em que o certame vai ocorrer. Temos centenas de ritmos, gêneros e gingas internacionalizáveis e fomos contemplados com esse jingle de gringo [saudades do Miguel Gustavo], fraquinho, com um ôôô para levantar a galera, e apenas uma beirada para a Claudia Leitte cantar em português. Vamos ter que ganhar na bola, porque na música já fomos derrotados", diz o crítico Tárik de Souza, autor de diversos livros sobre o cancioneiro popular brasileiro.
O produtor musical Carlos Eduardo Miranda, ex-jurado do programa Ídolos, do SBT, vai pelo mesmo caminho. "Acho que fizeram isso de sacanagem, para desmoralizar nosso povo. Essa música é do inferno. A primeira coisa que podiam fazer era ter pego um artista e um produtor gringos legais e juntar com produtores e músicos daqui. A partir disso, achar um som novo, algo mais ousado. Podiam ter se baseado em sonoridades brasileiras, um pouco que fosse. Tem tanta coisa legal aqui, na Bahia, tem o funk, o samba, o tecnobrega", opina.
O crítico musical Marcus Preto, que possui um extenso trabalho com música nacional, acredita que a canção carece de identidade. De acordo com ele, a impressão é de que ela foi composta em cima de uma fórmula, sem levar em conta as variadas características da sonoridade brasileira.
"Sinto falta de uma identidade. A sensação que fica é a de 'onde vai ser essa copa?' Tenho a impressão que parece uma fórmula de jingle de campanha politica. Tem uma cara meio publicitária. Tem o rap, tem várias línguas misturadas. Meio que 'esse candidato serve para você, seja lá você quem for'", diz.
O crítico e produtor Régis Tadeu vai mais longe. Segundo ele, deveria haver um tipo de contrato prevendo que o tema tivesse caraterísticas regionais. "É aquele tipo de música que parece ter sido composta e produzida por uma equipe de publicitários que passa o tempo inteiro no banheiro cantando músicas do pavoroso Black Eyed Peas no chuveiro e na privada. Se é uma música-tema, ela teria por obrigação representar a sonoridade mais emblemática do país sede", critica.
Existe uma música tema do Mundial desde 1962. Nem sempre ela é representativa do país que sediará a competição. Um exemplo é o que ocorreu em 2010, na África do Sul. A música "Waka Waka", gravada por Shakira, é na realidade uma versão de "Tsamina (Zangalewa)", canção de Camarões e que foi um grande sucesso na segunda metade da década de 1980.
A escolha dos artistas seguiu um padrão comercial. Os cantores precisavam ser da Sony Music, patrocinadora oficial do torneio. A música "We Are One" abrirá o CD do Mundial do Brasil, feito pela gravadora. O álbum terá, entre outras canções, "Lepo Lepo", do Psirico, "Tatu Bom de Bola", do Arlindo Cruz, e "La l ala", de Shakira.
A canção "Vida", interpretada por Ricky Martin, foi criada por Elijhah King, um americano que venceu a eleição feita pela Fifa para escolher uma canção dos fãs para a Copa.
Sucesso?
Para os especialistas, a música não será um sucesso. Nem local, nem mundial. Para eles, mesmo com a massiva campanha publicitária, ele deve ser esquecida muito rapidamente. "Comercialmente podia ser um sucesso muito maior. Uma coisa com identidade teria mais apelo. Falta um refrão mais legal", defende Preto.
Miranda, por sua vez, é mais incisivo ao falar sobre o tema. "O que me surpreende é que as pessoas envolvidas são muito mais talentosas do que apresentaram. Fizeram só pelo dinheiro, nas coxas seria a palavra mais certa. Eu acho que não emplaca em lugar nenhum", declara.
Segundo Régis, a falta de cuidado na composição e o caráter genérico da música contribuem para que ela seja descartável. "Não faço previsões, mas tenho a certeza que esta canção não irá emplacar em lugar algum do planeta. Só que tal escolha é feita visando marketing e não alguma contribuição musical. Veja se alguém se lembra das canções das Copas passadas", afirma.
A música foi composta pelos três artistas que a interpretam e terá versões em inglês, português e espanhol. Em janeiro, quando houve o anúncio confirmando o nome da canção, a cantora Claudia Leitte afirmou que ela teria "muitos instrumentos brasileiros para deixar clara a brasilidade".
UOL